São Paulo, sexta-feira, 23 de maio de 1997
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Leia o discurso do presidente na posse dos dois novos ministros

Leia a seguir a íntegra do discurso do presidente Fernando Henrique Cardoso na cerimônia de posse dos novos ministros da Justiça e dos Transportes.
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Senhor vice-presidente da República, dr. Marco Maciel, senhor presidente do Senado Federal, senador Antonio Carlos Magalhães, senhor presidente da Câmara dos Deputados, Michel Temer, senhor ministro de Estado da Justiça, Iris Rezende e dona Iris, senhor ministro de Estado dos Transportes, Eliseu Padilha e dona Eliane, senhores Milton Seligman e Alcides Saldanha, que respondiam pelos ministérios, eram ministros, senhores ministros de Estado, senhores ministros do Supremo Tribunal Federal, que nos dão a honra da presença, srs. presidentes dos Tribunais Superiores, sr. presidente da OAB, srs. governadores, srs. líderes, srs. parlamentares, sras. e srs.:
O meu governo ganha hoje dois novos e valiosos colaboradores: o senador Iris Rezende, como ministro da Justiça, e o deputado Eliseu Padilha, como ministro dos Transportes. Suas excelências pertencem a um partido que faz parte da luta da história da democratização do país. Ambos têm experiência administrativa e política. O dr. Padilha, além de deputado federal, foi secretário de Estado no Rio Grande do Sul e prefeito municipal. O dr. Iris Rezende é liderança nacional. Duas vezes governador de Goiás, senador da República e ministro pela segunda vez. Ambos pertencem a um partido do qual eu fui fundador. Ambos pertencem a um partido do qual eu fui líder enquanto fui senador e enquanto estive no partido. Por esta mesma razão, de serem lideranças tão expressivas e de pertencerem a um partido que está inserido na história de nossas lutas democráticas e a um partido que ocupa um pedaço do meu coração, eu me sinto imensamente feliz de tê-los aqui e são bem-vindos srs. ministros à nossa equipe. Eu confio nos serviços que prestarão ao governo e ao Brasil.
Ministro Eliseu Padilha, V. Exa., na pasta dos Transportes, como acabou de pronunciar no seu discurso, levará adiante uma parte substanciosa do ambicioso programa "Brasil em Ação", que cada vez com mais clareza mostrará a feição nova do nosso país. Não será esse o único objetivo do seu ministério. V. Exa. mesmo descreveu sinteticamente, mas de uma maneira muito direta, as tarefas que terá pela frente. Mas eu gostaria que os brasileiros soubessem que, através das ações desse ministério, como do Ministério de Minas e Energia, como do Ministério das Comunicações, nós estamos retomando um ritmo de crescimento que há muitas décadas o Brasil não assistia, estamos outra vez com aquela convicção serena, com aquela humildade necessária, mas também com aquela vontade maior do que tudo de mostrar que esse Brasil se modifica e se modifica para melhor. Parte substancial disso estará nas mãos de V. Exa. Tenho certeza que são mãos competentes e honradas, e que levará adiante a tarefa que lhe é atribuída com muita galhardia.
V. Exa., ministro Iris Rezende, à frente da pasta da Justiça, terá um papel fundamental, tanto na articulação com os poderes Legislativo e Judiciário quanto na execução de medidas que, nos limites da lei e sempre respeitando os direitos humanos, coibam abusos e mantenham a ordem democrática, essencial ao bem estar do nosso povo. E V. Exa. acabou -da mesma maneira que o ministro Padilha- de resumir o conjunto de tarefas que correspondem ao Ministério da Justiça. E com muita propriedade mostrou que hoje esse Ministério é o ministério da cidadania. Mas, ao ser o ministério da cidadania, é também o ministério da segurança do cidadão. É o ministério que cuida para que a sociedade possa ter a tranquilidade necessária. E cuida não apenas na repressão, que quando necessária é feita, mas cuida de um ambicioso programa de reorganização das penitenciárias, talvez ainda não bem conhecido, mas como disse V. Exa., são 44 novas penitenciárias que estão se construindo nesse Brasil, para dar mais garantia à sociedade e vida mais condigna ao preso no Brasil. O Ministério de V. Exa., e V. Exa. frisou muito bem, estará em franca articulação com o coordenador de assuntos políticos do governo da República, o ministro Luis Carlos Santos, que tem a incumbência da parte do presidente da República de ajudar a consolidação do prestígio do governo e da possibilidade de o governo levar adiante as suas tarefas.
Srs. ministros, nossos compromissos com a democracia e o bem-estar do povo brasileiro não são de ontem. São de toda uma vida. Hoje temos uma oportunidade única de colocar a força desses compromissos a serviço do Brasil. Desde que o presidente Itamar Franco me nomeou ministro da Fazenda venho empenhando todas as minhas forças para recuperar a estabilidade no país. Estabilidade econômica e estabilidade política. No plano econômico, os resultados estão à vista de todos. Inflação de menos de 10% ao ano. Crescimento continuado pelo quinto ano consecutivo, desde 1993. Investimentos nacionais e estrangeiros em expansão. Nível de emprego estável. Setor agrícola saneado e em franca recuperação. E, sobretudo, aumento dos salários reais, com significativa expansão do consumo popular e uma sensível distribuição de renda.
Desde o início do Plano Real, 13 milhões de brasileiros, 13 milhões de brasileiros ultrapassaram os níveis de pobreza. Isso é sensibilidade social de um governo que olha para o conjunto do país e toma as medidas necessárias com coragem, com persistência, para que os efeitos se façam sentir sobre aquelas vozes que em algum momento chamei de "roucas", mas que sabem que hoje têm um destino melhor, que hoje têm condição de vida melhor para si e para seus filhos e, por isso, confiam crescentemente no nosso país.
A recuperação da estabilidade econômica se fez sem recessão e com muita liberdade, respeitando os direitos de todos e sem jamais, jamais mesmo, arranhar a democracia.
De uns tempos para cá, no entanto, tenho visto com indignação -e eu repito, com indignação- o comportamento cada mais ofensivo de setores inconformados, no fundo, com a sua própria falta de alternativas às nossas políticas. Parece que o meu apego ao diálogo e meu amor à liberdade têm sido confundidos por esses setores com sinais para que as virtudes republicanas sejam atacadas. Tenho sido tolerante e paciente porque é do meu feitio e porque é dever de quem tem mandato do povo para governar o país. Mas o limite da paciência e da tolerância é a democracia. A democracia exige respeito e ordem. Sem ordem legítima não há democracia.
As invasões repetidas de prédios públicos e de propriedades particulares são ações coordenadas com objetivos políticos que constituem abusos antidemocráticos.
Vem-se amiudando incitamentos à desordem, inclusive por parte de lideranças nacionais de alguns movimentos que suscitariam simpatia da sociedade não fosse sua agora óbvia vinculação político-sectária. Isso é grave. E tanto mais grave quanto o governo tem estendido as mãos e proposto negociações democráticas. A onda premeditada de violência e anarquia não é apenas um atentado contra a democracia. É um atentado contra a esperança do povo brasileiro, que está fundada na estabilidade econômica, mas também na estabilidade política.
A sociedade brasileira exige um basta a esse clima de baderna. A sociedade não quer a desordem. Pedras, paus e coquetéis molotov são argumentos tão poucos válidos quanto as baionetas. Só que menos poderosos.
O país cansou desses abusos. Os responsáveis pela ordem pública devem ser sensíveis a esse cansaço. De minha parte, como democrata, tenho o dever de impedir que a desordem corrompa a liberdade. Não faltarei ao meu dever, como sei que o ministro Iris Rezende não faltará ao dele, como acabou de pronunciar aqui em seu discurso. Dentro da lei, mas sem hesitação.
Em outro plano, mas no fundo respondendo ao mesmo espírito de não-aceitação da vontade majoritária do país, as vozes mais estridentes das oposições se aproveitam da falta de decoro de uns poucos parlamentares para tentar paralisar o Congresso e o governo com suspeitas e insinuações.
Qualquer suspeita de corrupção deve ser investigada a fundo, como bem disse o ministro Eliseu Padilha. Se comprovada, tanto os corruptos como os corruptores devem ser exemplarmente punidos.
Ao encontrar verossimilhança nas acusações, a Câmara constituiu uma comissão investigadora que em poucos dias trabalhou corretamente para livrar o conjunto da Casa da pecha de conivência com práticas inaceitáveis. Que a polícia, o Ministério Público e a Justiça atuem com a mesma determinação e presteza para a completa apuração dos fatos e a punição dos culpados -corruptos e corruptores.
Se houver algum membro do governo envolvido nesse episódio, será demitido. Não creio nisso. Não creio nisso. Para mim seria uma grande decepção, mas ela não inibiria a minha decisão, assim como seria covardia imperdoável em minha consciência punir inocentes apenas porque a sanha dos adversários insinua ou supõe, sem nem ao menos ter tido a coragem de dizer: eu acuso!
O descrédito recairá sobre os verdadeiros culpados de tanto dano à moral republicana, e não sobre o governo. O Congresso agiu bem, sr. presidente da Câmara, Michel Temer, ao não paralisar a ação legislativa ao mesmo tempo em que cumpre o dever de apurar as denúncias. Para segurar a estabilidade, o crescimento e a melhora das condições de vida dos brasileiros, precisamos manter a confiança em nós mesmos e no país. É preciso, mais do que nunca, que a maioria que nos apóia, no Congresso e na sociedade, reaja com convicções e com argumentos. Convicções e argumentos não têm faltado ao governo. Apoio do Congresso tem havido. Ainda ontem o Senado aprovou em primeiro turno a emenda da reeleição. Agradeço e agradeço ao presidente Antonio Carlos Magalhães e, em nome dele, a todos os senadores esse gesto de tranquila decisão, pensando só numa coisa: na importância da continuidade da estabilidade política e econômica do Brasil. Conto com o mesmo apoio para levar adiante as reformas necessárias para a continuidade do Plano Real.
Não temo pelo meu governo. Dispomos de instrumentos suficientes para, responsavelmente, manter nossa economia no rumo certo. Como eu sempre disse, os efeitos das reformas da administração e da Previdência Social serão lentos, não visam beneficiar este governo, mas garantir o futuro do país. Sem as reformas, não haverá horizonte estável para o crescimento econômico e o bem-estar da sociedade porque o desequilíbrio fiscal, no decorrer do tempo, limitará nossas possibilidades de expansão. A história cobrará daqueles que, por sectarismo político ou por açodamento em desistir da luta, vierem a impedir que as reformas prossigam. O futuro do país, nesse aspecto, está nas mãos do Congresso e dos partidos que compõem a maioria no Congresso. Cabe aos partidos a responsabilidade -e tenho a expectativa de que não faltarão a ela- de votar as emendas constitucionais propostas e as leis necessárias para que o Real continue como âncora do bem-estar do povo.
V. Exas., srs. ministros Iris Rezende e Eliseu Padilha, são homens de partido que se juntam ao governo para ajudar o país.
Nosso país tem rumo. Tem um governo que diz o que pensa, que nasceu das urnas, com programa aprovado pelo eleitorado. Por isso mesmo, o presidente lhes fala hoje de coração aberto. Os legítimos acordos políticos com os partidos atuantes no Congresso foram feitos pensando sempre na viabilização das reformas, no progresso do Brasil e no bem-estar dos brasileiros, não em interesses menores ou pessoais. A presença de V. Exas., juntamente com outros deputados do PMDB, neste governo, assim como aqueles que representam outros partidos, o PFL, o PSDB, o PTB, o PPB, não têm outra intenção. É a intenção de dar ao Brasil condições de prosseguir na rota das transformações. É a intenção de dar ao Brasil a continuidade num processo de mudanças com estabilidade. É a intenção de fazer com que esse povo brasileiro, que mal sabe, muitas vezes, o que está sendo decidido -mas decisões que acabam pesando sobre o cotidiano da população-, possa ter mais certeza, mais tranquilidade de que nós, juntos, independentemente dos partidos -e disse bem o ministro Padilha-, formamos uma aliança. E aliança se faz entre desiguais com vistas a um propósito comum. E nós temos o mesmo propósito, que é o propósito de fazer com que esse Brasil realmente assuma aquilo que está ao nosso alcance: a sua posição na esfera internacional, a sua posição como um país que foi capaz de se industrializar e que mantém uma agricultura próspera. A sua posição como um país que nesse momento toma decisões difíceis, mas com confiança para participar altiva e ativamente da nova fase da economia internacional. Um país que tem tudo para dar condição melhor de vida ao seu povo. Um país que, portanto, requer de nós, líderes políticos, humildade. Requer de nós serenidade. Requer de nós também abnegação. Requer de nós a capacidade da desistência de propósitos pessoais. Mas requer de nós sobretudo a consciência de que nós temos que estar unidos por esses grandes interesses do Brasil.
De agora em diante, não apenas eu, meus ministros, os líderes, aos quais eu renovo os meus agradecimentos -líderes dos governos e líderes dos partidos que sustentam a maioria-, a partir de agora nós não precisamos mais insistir. Cada setor político brasileiro há de responsabilizar-se perante o povo e a história sobre os votos proferidos nas reformas que, sim, vamos fazer aprovar, porque o Brasil precisa delas. Porque o Brasil precisa delas.
E, de novo, neste momento não serão questões menores de interesse pessoal, grupal e nem mesmo regional que irão paralisar a consciência cívica dos parlamentares que apóiam o governo para dar um voto consciente, um voto convicto, um voto argumentado, um voto que faça com que a sociedade veja que ao, ao invés de nós estarmos perseguindo quem quer que seja, cortando direitos, estamos, sim, cortando abusos e privilégios que minaram o bem-estar desse país e que, de agora por diante, está nas mãos do Congresso Nacional tomar as decisões pertinentes para que isso sofra modificação profunda.
Eu quero agradecer mais uma vez a presença de todos. Mas seria injusto que o fizesse sem agradecer muito especialmente ao ministro Alcides Saldanha, que se desempenhou com grande correção à frente da pasta dos Transportes. E seria injusto também que eu não ressaltasse a capacidade de articulação e devotamento do ministro Milton Seligman nesses momentos em que substituiu o digno ministro Nelson Jobim.
Agradeço a presença de todos que aqui estão, e digo aos brasileiros que continuaremos firmes, serenos, confiantes na força das nossas propostas. E sem jamais perder de vista que o horizonte deste país é um horizonte de grandeza.
Muito obrigado aos senhores e senhoras.

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