São Paulo, sexta-feira, 23 de maio de 1997
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CORRUPÇÃO DA LIBERDADE

O presidente da República decidiu em boa hora dar um sinal claro de que não pretende consentir com as manifestações de desordem que vêm afetando diversos setores da vida do país. No discurso com que recebeu seus dois novos ministros, Fernando Henrique Cardoso advertiu aqueles que explicitamente resolveram violar a lei, propugnando uma ampliação da onda de invasões de propriedades públicas e privadas.
Foi também digno de aprovação o realce dado por FHC à sua disposição de punir subordinados eventualmente envolvidos na corrupção de deputados e ao seu apoio à idéia de investigar com mais profundidade o caso. O presidente quis mostrar à opinião pública, de viva voz, que não compactua com negociatas.
Mas nesse ponto é preciso mencionar que essa atitude eticamente enérgica do presidente, que sempre mereceu crédito devido ao seu inatacável currículo pessoal, está em evidente contradição com a política real de seu governo nos bastidores, toda voltada a minimizar o escândalo e circunscrever as apurações. Ademais, a defesa do rigor do inquérito foi marcada por um traço que já se tornou hábito: a desqualificação dos oposicionistas.
A própria posse dos ministros peemedebistas reforça o empenho de angariar apoios para barrar o inquérito que poderia dissipar as nuvens de desconfiança que pairam sobre o processo da reeleição -a CPI. O discurso oficial imputa à pirraça dos que não aceitam "a vontade majoritária do país", como disse ontem FHC, a vontade de superar o escândalo pela única via apropriada.
O governo tem importantes créditos, hoje até menosprezados, como o de domar uma superinflação sem estancar a economia, ainda que seja exagerado dizer que "há décadas" não se via tamanho crescimento -as taxas do PIB aumentaram entre, no mínimo, 4,6% e 11,3% nos anos 70, e houve picos de 8% nos 80.
Faz muito bem o presidente em reafirmar o império da lei, ao lembrar que a democracia exige ordem e estabilidade política. Mas exige também que as práticas correspondam aos discursos e que as tentativas de corromper as instituições sejam investigadas de forma cabal e completa.

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