São Paulo, segunda-feira, 26 de maio de 1997
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Resposta ao deputado Pedro Dallari

ISAIAS RAW

Não questiono o direito do deputado Pedro Dallari de pedir informações sobre o Instituto Butantan -que já foram enviadas ao secretário da Saúde-, mas a forma como isso foi feito. Poderia aguardar alguns dias, até minha volta do exterior, e me convocar para prestar informações. O seu questionamento na Folha (23/5) não tem mais a conotação de uma acusação baseada num grupo corporativo, acobertado pelo anonimato e interessado no poder. Eis as respostas.
1) Os lagos aterrados na área do instituto, citados pelo deputado, foram artificialmente criados pelo dr. B. Sorensen, com desmate, e eram uma coleção de água poluída, um criadouro de mosquitos, que reunia marginais consumindo narcóticos, de onde partiam para atacar visitantes e funcionários. Era um problema de segurança e saúde pública, e a área está em reconstrução e reflorestamento.
2) A biblioteca, como todas as bibliotecas, acumulava publicações que perderam atualidade e a abarrotavam, ameaçando até o prédio. O material considerado não-útil foi oferecido a 70 bibliotecas, que pediram parte dele, recusando a grande maioria.
3) O hospital Vital Brazil tornou-se menos necessário com a existência de cerca de 300 postos em todo o Estado nos quais o soro é administrado e por estar situado no centro de uma metrópole onde não existem acidentes ofídicos. Dez médicos atendem apenas 5% dos casos de picadas de cobras e escorpiões.
Para chegar ao Butantan, o paciente leva muito tempo e, quando tratado, já teve lesões graves. Não há laboratórios nem equipamentos de emergência ou plasma. Nos casos de emergência, ou quando se necessita de tratamento cirúrgico simples, é feita transferência para o hospital da USP.
O grupo do hospital começou a fazer experiências que colocam em perigo os pacientes (tentando dar meia dose de soro) e se revolta com o estabelecimento de uma comissão de ética médica, exigida pela lei. Não aceita a função de visitar outros centros para dar orientação aos médicos de plantão. No entanto, não foi desativado.
4) O estatuto não foi alterado. Um novo estatuto, discutido pela comunidade científica e aprovado pelo conselho diretor, foi enviado à consideração da secretaria. As alterações propostas são para adaptar o estatuto à realidade atual, dando mais poder aos conselhos de pesquisa e de produção e consolidando o centro de desenvolvimento biotecnológico.
5) O projeto de obtenção de albumina a partir de placenta está sendo implementado em escala-piloto. Com o fechamento da fabricação da albumina de placenta na França, que era absolutamente segura, a aceitação diminui.
Paralelamente, o Hemocentro de São Paulo pretende produzir do plasma a albumina necessária. A planta-piloto será usada para desenvolver outros produtos de plasma (como enzimas para tratamento de infartos), além de albumina.
6) A vacina contra influenza não é parte do programa de vacinação pública que o instituto deve cumprir. A vacina era produzida em condições inaceitáveis, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), e não tinha eficácia. A produção foi interrompida há cerca de um ano, e a pessoa encarregada nada fez durante esse período.
7) O botulismo havia desaparecido do Brasil. Temos estoque estratégico do soro contra o tipo mais comum e dos três tipos que afetam o homem. Neste ano, atendemos aos pedidos do Brasil e da Argentina.
Estamos há seis meses construindo um novo laboratório para produzir toxina botulínica, dentro das condições rigorosas da OMS e dos organismos de controle de guerra bacteriológica, que deverá produzir os seis tipos de toxina (para uso clínico na doença de Chagas e em contraturas musculares) e os soros, atendendo à demanda de estoque estratégico não apenas para o Brasil, mas para casos de botulismo provocados por terroristas. O laboratório será inaugurado no próximo mês.
8) O Butantan é o único órgão da América Latina que teve o laboratório que produz a vacina tríplice inspecionado pela OMS e aprovado como tendo atendido às exigências do EUA e do Canadá.
Estamos entregando 1 milhão de doses por mês. Estamos nos preparando para, em 1998, iniciar a produção da nova vacina tríplice, até agora só produzida nos EUA e na Europa.
9) O Butantan chegou a ter 2.000 cavalos sem conseguir produzir o soro. Hoje, com 300 cavalos, produzimos soros contra venenos de cobras, aranhas, escorpiões e até rejeição de transplantes. É impossível controlar os cavalos a 60 km de distância, trazendo o plasma no gelo. Só em ração, com o controle do seu uso, o instituto economizará 10% da sua verba de insumos.
10) O diretor do instituto não é funcionário público, é pesquisador autônomo, não recebendo nenhuma gratificação pelo cargo. Um não-funcionário em cargo de confiança não poderia ser aposentado. A sua substituição, que deve ser feita, exige a identificação de alguém competente, que aceite um cargo cujo mandato expira com o mandato do secretário da Saúde.
É interessante que os desenvolvimentos positivos recentes, como a produção de eritropoetina para doentes renais, a nova vacina segura contra raiva, a hepatite B, as meningites, nem sequer tenham sido levantados.
Não posso deixar de transcrever um fax da OMS que muito honra o instituto e os servidores que são fiéis a ele: "Por favor, aceitem nossas felicitações pelas mudanças feitas no Instituto Butantan, levando-o a uma posição que o credencia para ser líder no século 21".

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