São Paulo, quarta-feira, 28 de maio de 1997
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Polícia boliviana protege alunos brasileiros

MAURO TAGLIAFERRI
ENVIADO ESPECIAL A SANTA CRUZ DE LA SIERRA

Os estudantes de medicina brasileiros que vivem em Santa Cruz de la Sierra (Bolívia) estão sob proteção policial.
Tanto em frente à Universidade Católica Boliviana (UCB), quanto perante os prédios onde eles moram, há policiais de plantão.
Os brasileiros passaram a ser hostilizados desde que o universitário Mauro Salas de Moraes, 21, agrediu o adolescente Ramiro Alcocer Vidal, 17, no último dia 18.
As imagens de Moraes socando e chutando Vidal foram transmitidas pela televisão boliviana e revoltaram a população. Até uma passeata de crianças em frente à universidade foi promovida.
"Alguns gritavam 'fora brasileiros' e nos chamavam de assassinos", disse Justo Nelson Silvestre, 20, estudante de medicina na UCB.
Dez universitários que moravam num prédio em frente à praça onde ocorreu a agressão, no centro da cidade, tiveram de fugir para casas de colegas por causa das ameaças.
"Usaram até um carro de som para falar mal dos brasileiros. Como a briga foi aqui na frente, pensaram que ele (Moraes) morava aqui. Tivermos de sair escondidos, às 4h", contou o carioca Alexandre S., 25. Ele afirmou, ainda, que chegou a ser agredido por "três senhores", que teriam tentado colocá-lo, à força, num carro.
Os brasileiros vão estudar medicina na Bolívia porque não há vestibular e os cursos são mais baratos (cerca de US$ 1.000 por semestre). Estima-se que haja entre 3.000 e 5.000 brasileiros matriculados.
Eles iniciam a faculdade na Bolívia e tentam, depois, se transferir para cursos no Brasil.
"Os brasileiros vêm para cá e fazem barulho, com festas e som alto. Ficam com as mulheres dos bolivianos, não têm controle de pai nem mãe, acabam malvistos pelo pessoal daqui", contou Alexandre.
"Acho que os brasileiros, porque normalmente têm mais dinheiro, vêem os bolivianos como inferiores. Eles foram aguentando isso, mas o episódio da agressão serviu como estopim para a discriminação", disse Justo Silvestre.
'Há motorista de ônibus que não pára quando vê um brasileiro no ponto", disse Justo Nelson Silvestre, natural de Cacoal, Rondônia.
O estudante aposta no carisma da seleção brasileira de futebol para quebrar o gelo dos bolivianos, já que o município se prepara para receber, no mês que vem, a Copa América. "O Ronaldinho vem aí. Os bolivianos adoram futebol."
Pena
A Justiça boliviana define hoje qual a acusação que pesará sobre o brasileiro Mauro Salas de Moraes.
É certo que ele será julgado por causar lesões corporais ao adolescente. O Ministério Público pede que as lesões sejam consideradas gravíssimas, com pena de dois a oito anos de prisão.
Já o advogado de Moraes, Paúl Méndes Hurtado, sustenta que o médico forense detectou apenas uma lesão leve -uma fissura no nariz (pena de seis meses a dois anos de prisão).
Segundo ele, Moraes pode sair da prisão até sábado, mediante fiança calculada de acordo com gastos médicos de Vidal.
O adolescente tem versão diferente para a agressão. No boletim de ocorrência, consta que Moraes e o amigo Oscar Alberto Bustamante Mercado pediram para jogar futebol com o grupo em que Vidal estava.
Alguém do grupo teria negado, dizendo: "Vocês são brasileiros. Sigam seu caminho". Moraes, então, teria dito: "Brasileiros, o caralho" (a mãe dele é boliviana), e partido para cima de Vidal. No boletim consta que Moraes bateu em Vidal até que ele desmaiasse.

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