São Paulo, quinta-feira, 29 de maio de 1997
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A "desestatização" da sociedade

LUÍS NASSIF

Um dos grandes nós da vida nacional é a ausência de iniciativas sociais visando criar territórios na sociedade imunes à ação do Estado. Recentemente o advogado Joaquim Falcão escreveu artigo muito interessante, propondo a "desestatização" da sociedade.
Historicamente, o jogo político no país sempre foi feito em torno de grandes bandeiras sociais que funcionavam exclusivamente como aríetes para a conquista do poder por parte dos grupos mais organizados.
Em países mais civilizados, comunidades se juntam para resolver seus problemas locais, definir suas prioridades e conquistar o direito à autodeterminação -respeitadas obviamente as leis locais.
Seu objetivo é a conquista do seu espaço social. No Brasil, toda ação organizada acabava sendo instrumento para a conquista de espaço político federal. Todo movimento presumivelmente de libertação do Estado visa, em última instância, a conquista do Estado.
É sina que, no final do século passado, vitimou os ideais republicanos; nos anos 20, os ideais tenentistas; nos anos 30, os comunistas e integralistas; nos anos 40, a esquerda democrática; nos anos 70, o MDB; nos anos 80, o PT; e nos anos 90, o MST, todos contaminados por essa visão político-militar da conquista do poder. Em todo esse período, embotou a capacidade da sociedade brasileira de buscar seus próprios caminhos e soluções. Numa ponta, era oprimida pelo Estado. Na outra, sua resistência era manipulada pela oposição.
A novela MST
O caso MST é típico, e a última versão dessa novela interminável. O movimento encontrou um ótimo produto -a capacidade de mobilizar desempregados com promessas de distribuição de terra, e de conquistar espaço político junto à opinião pública brandindo uma bandeira legítima.
Poderia se converter no movimento preferencial de reforma agrária no país. Poderia gerar núcleos autônomos de pequenos agricultores, se organizando economicamente, conseguindo a auto-suficiência, crescendo, incorporando mais sem terra.
Mas não lhe interessa. Tem um discurso para dentro (prometendo terra), e manipula os incautos para bandeiras que nada têm a ver com reforma agrária.
Todos os movimentos políticos -de oposição e de situação- visam sempre impedir a organização autônoma da sociedade, a busca de soluções próprias, sem iluminados, sem comandantes, sem caciques políticos. Para tudo precisa haver mediação política.
E, como a conquista do poder político pressupõe a existência de recursos eleitorais, tem-se essa tragédia brasileira: em menos de dois meses, os três candidatos presidenciais às eleições de 98 -Fernando Henrique Cardoso, Paulo Maluf e Lula- envolvidos em acusações de compras de votos ou e de formação de caixinha política.

E-mail: lnassif@uol.com.br

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