São Paulo, segunda-feira, 2 de junho de 1997
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Seligman pensa em "parceria" com MST

ABNOR GONDIM
LUCAS FIGUEIREDO

ABNOR GONDIM; LUCAS FIGUEIREDO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Presidente do Incra assume com apelo para que MST integre comissão que elabora reforma agrária

Milton Seligman, 45, assume hoje o comando do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) com a tarefa de abrir um canal de negociação entre governo e MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra). Após trombadas entre líderes dos sem-terra e o governo, Seligman chega falando em "parceria" e fazendo um apelo para que o MST aceite participar da comissão que elabora a política de reforma agrária.
Para isso, não coloca como condição o fim das invasões de terra. "Nem todo mundo descumpre a lei durante 24 horas por dia", disse Seligman em entrevista à Folha.
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Folha - Como o sr. irá se relacionar com dirigentes do MST e da Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura) que descumprem a lei?
Milton Seligman - Nem todo mundo descumpre a lei durante 24 horas por dia em tudo o que faz. No ponto que descumpre a lei, você tem que enfrentar com os mecanismos usados para quem descumpre a lei. Mas essas mesmas pessoas, em alguns outros setores, propõem questões que não são descumprimento da lei. Então aí tem de conversar.
Folha - Por exemplo, a Contag invade uma área e em seguida quer conversar com o sr. para ver se consegue a desapropriação. Nessa situação, o sr. irá recebê-los?
Seligman - É preciso diferenciar. O movimento social tem exaltado, em alguns aspectos, o descumprimento da lei. Não obstante disso, o presidente Fernando Henrique fez uma proposta de criação de um grupo para, em conjunto, trabalhar a questão da reforma agrária no sentido de agilizá-la.
No descumprimento da lei, nós não temos o que negociar. Na questão da reforma agrária, não se trata de problema criminal. É um problema de política pública. Que nós, governo, não podemos fazer sem o movimento social, e que o movimento não pode fazer sem o governo. É desse conjunto de criação de parcerias que o processo anda, por mais difícil que seja.
Folha - O orçamento do Incra será elaborado com a participação do movimento social, conforme está sendo cogitado?
Seligman - Bela idéia.
Folha - Esse seria um ganho para o governo tentar se reaproximar do movimento social?
Seligman - Ouvir os movimentos sociais, os Estados, encontrar uma fórmula de envolvê-los na gestão desses recursos é altamente elogiável. O presidente fez o gesto. Quero aproveitar para fazer um apelo ao MST que revise a posição de não ter aceito participar da comissão proposta pelo presidente Fernando Henrique para discutir a política de reforma agrária.
Folha - O sr. apela também para que o MST pare as invasões?
Seligman - Não, apelo para que aceitem a proposta do presidente.
Folha - Alguns líderes dos sem-terra saudaram a sua indicação para o Incra. É um bom sinal?
Seligman - Sim. O mais importante é entender que o governo não está buscando cooptar o movimento social. Não é interesse do governo ter o movimento social a reboque. Nem é interesse ficar a reboque do movimento social. O movimento social atingiu no Brasil a dimensão de ator político. Isso é um fato positivo. O governo erra, todo mundo erra.
Acho que a decisão do MST é errada. Não para nós, mas para o movimento social. É um momento importante de vir, com independência, com grandeza, sentar à mesa e dizer: "Nós divergimos de 1 milhão de coisas, mas há algumas que estamos de acordo, então vamos nos aprofundar nelas".
Quer ver um exemplo: a indústria da reforma agrária. O movimento é contra, denuncia. O governo também é contra porque está sendo roubado. Essa seria a oportunidade de uma parceria brilhante. O movimento não vai se diminuir. É o momento de maturidade, de sentar à mesa.

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