São Paulo, quinta-feira, 5 de junho de 1997
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O sucesso dos "global bonds"

CELSO PINTO

A emissão de US$ 3 bilhões em bônus globais de 30 anos pelo Brasil, ontem, pode ser considerada um sucesso, por várias razões. A economia em si, proporcionada pela emissão, não é a principal.
O Brasil trocou US$ 2,8 bilhões em títulos originados da negociação da dívida externa (os "bradies"), por US$ 2,250 bilhões de novos papéis. Além disso, vendeu mais US$ 750 milhões dos novos bônus em dinheiro.
Os donos dos "bradies" aceitaram um deságio superior a 20% no valor dos papéis porque os novos bônus rendem mais.
Já considerado o deságio, o Brasil recomprou US$ 1,6 bilhão em "discount bonds", com 27 anos de vida e que pagam juros variáveis, hoje equivalentes a 6,8% ao ano. Recomprou US$ 540 milhões em "par bonds", com 27 anos de vida e que pagam 5,25% de juros ao ano e US$ 86 milhões de "C-Bond", com 17 anos de vida e juros crescentes, hoje de 4,5% ao ano.
O novo papel terá uma vida um pouco maior, 30 anos, e pagará juros de 10,125% ao ano. Como foi colocado com deságio, seu rendimento custou, de fato, 10,896% ao ano para o Brasil. O juro é bem maior, portanto, mas se aplica a uma base menor, porque o Brasil recomprou os "bradies" com deságio.
Tanto o "par bond" quanto o "discount" tinham garantias sob a forma de títulos do Tesouro americano, num valor de US$ 606 milhões.
Ou seja, foram títulos comprados pelo Brasil, mas que ficaram congelados, até agora, como garantias para os compradores dos "bradies". Agora, o governo brasileiro poderá incorporá-los às suas reservas.
Tudo considerado, houve uma economia para o Brasil com a nova emissão. Gustavo Franco, do Banco Central, calcula o ganho entre US$ 150 milhões e US$ 200 milhões.
No mercado, alguns calculam um pouco menos. Ninguém nega, contudo, que houve algum ganho. Além disso, as reservas foram engordadas pelos US$ 606 milhões das garantias, mais US$ 750 milhões pela emissão em dinheiro.
Mais importante, contudo, foi a ampliação do mercado gerada pela nova emissão e o fato dela servir como referência, em termos de custos.
O rendimento pago pelo Brasil, equivalente a 395 pontos básicos de porcentagem acima dos juros pagos por papéis equivalentes do Tesouro americano, ficou algo acima do que esperava o mercado. Tanto assim que, tão logo o papel foi livremente negociado, valorizou-se e o "spread" caiu para 377 pontos.
Franco explica o critério. O mercado imaginava que o Brasil pagaria de 20 a 30 pontos acima dos títulos equivalentes do México (cujo "spread" está em 340 pontos).
Além disso, com a valorização dos "bradies" nas últimas semanas, o preço de oferta do Brasil acabou ficando abaixo do mercado. Por esta razão, o mercado esperava do Brasil um prêmio adicional de 15 a 20 pontos para cobrir essa diferença.
Exatamente por esperar esse prêmio, muita gente no mercado quis comprar os bônus vendidos em dinheiro, e que, pelas regras, não podiam exceder 25% do total da troca. Como se esperava uma valorização no mercado, que de fato ocorreu, seria um bom negócio comprar no leilão e vender em seguida.
Além disso, havia uma forte demanda pelos novos papéis por parte de fundos institucionais. Muitos fundos emergentes são proibidos de comprar "bradies" e não se interessam pelas garantias em títulos do Tesouro. Outros fundos preferem investir numa "cesta" de papéis emergentes montada por terceiros (como a do JP Morgan). Como os novos papéis do Brasil vão para a cesta, estes fundos teriam que comprá-lo.
Estas duas razões explicam porque houve demanda de US$ 16 bilhões para comprar US$ 750 milhões em papéis brasileiros vendidos a dinheiro.
De todo modo, o fato é que a nova emissão incorporou muitos novos investidores mais estáveis e de longo prazo. Ainda sobram quase US$ 40 bilhões em "bradies", mas eles perderam importância relativa.
A remuneração do papel brasileiro de 30 anos será uma referência importante. Tanto Franco quanto o mercado esperam que ele ajude tanto a baixar o custo como a ampliar o prazo de emissões privadas de bônus brasileiros.
Com o sucesso dessa primeira troca, já começaram as especulações sobre quando ocorrerá a próxima.

E-mail: CelPinto@uol.com.br

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