São Paulo, quinta-feira, 5 de junho de 1997
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Heranças

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - Houve tempo em que, por falta do que fazer e com alguma curiosidade por coisas extravagantes, lia com atenção os conselhos para tirar manchas de estofados, a cotação da juta no mercado de Hong Kong, o estado de saúde do vocalista de um conjunto musical da Noruega, a ordem do dia na Câmara dos Deputados, coisas assim.
Nada disso me interessava. Mesmo assim lia, em parte por obrigação profissional, em parte para purgar meus pecados -muitos e imperdoáveis.
Certa vez, a propósito de um desses escândalos que andam por aí, fiquei sabendo que com o dinheiro roubado dos cofres públicos era possível comprar 5.000 toneladas de feijão e outras tantas de arroz, sobrando apreciável quantia para a respectiva farinha, em proporção adequada a tanto feijão e a tanto arroz.
Pior foi quando morreu um desses milionários do Golfo Pérsico. Uma revista americana, para dar a seus leitores a idéia da fortuna que ele deixara para 35 mulheres, 157 filhos e 941 netos, informou que cada um de seus herdeiros poderia comprar 1 trilhão de hambúrgueres.
Apesar da imensa fortuna e da imensa prole, esse dinheiro não daria para que a descendência comesse tantos hambúrgueres com mostarda e ketchup. Se fizesse questão de tais condimentos, o trilhão sofreria a redução de exatamente 0,15%. Mesmo assim, com ou sem mostarda ou ketchup, era hambúrguer pra burro.
Folguei no dia em que tomei conhecimento de informação tão transcendental. Concluí que o destino foi sábio ao não me fazer herdeiro desse potentado do Golfo Pérsico.
Detesto hambúrguer, não sei o que fazer com um, o que faria com 1 trilhão deles, descontado o 0,15% da mostarda e do ketchup -que também não aprecio?
Se algum milionário desocupado não tiver o que fazer com o seu dinheiro, pode deixar a fortuna para mim, desde que seja, como dizem os economistas, em alguma coisa em torno de 1 trilhão de mariolas. Adoro.

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