São Paulo, sexta-feira, 13 de junho de 1997
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Jurisprudência não avalisa a pena

HÉLIO SCHWARTSMAN
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

A condenação do líder sem-terra José Rainha Júnior a 26 anos e seis meses de prisão sob a acusação de homicídio parece antes uma piada, e de mau gosto. Diversos juristas (e dos mais diversos espectros ideológicos) ouvidos pela Folha consideraram a pena absurda.
Ainda que o Código Penal permita ao juiz estipular a sanção que estipulou, o fato é que a jurisprudência não o faz. Mesmo réus confessos de homicídios cometidos com requintes de crueldade dificilmente são condenados a mais de 18 anos.
Rainha tem uma longa lista de bobagens proferidas publicamente, algumas delas podendo até ser tipificadas como crimes, mas sempre com uma pena proporcional ao ilícito supostamente cometido.
Advogados independentes que tiveram acesso aos autos do processo afirmam com veemência que as provas lá contidas são absolutamente insuficientes (em conceito de justiça, é claro) até mesmo para a condenação de Rainha por homicídio doloso simples, cuja pena mínima seria de seis anos. Os outros 20 anos e seis meses correm por conta de sabe-se lá o quê.
O exagero da sentença acaba mesmo por criar a paradoxal situação de manter o líder sem-terra em liberdade e constituir novo tribunal de júri. Se a idéia era encarcerá-lo, a sanha com que tentaram fazê-lo acabou produzindo o efeito justamente contrário. Há até quem afirme -talvez fantasiosamente, talvez não- que a extravagância da sentença fez parte da estratégia final de defesa para garantir novo julgamento.
Fica claro que processos com tamanha força política como o de Rainha devem ser julgados longe do local do crime, pelo menos para tentar diminuir a força das animosidades.
O fato incontestável é que o julgamento, pela magnitude da pena atribuída e pela inconsistência das provas, apenas contribui para a desmoralização do Judiciário, o que já é algo enormemente grave.

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