São Paulo, domingo, 15 de junho de 1997
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ORDEM E PROGRESSO

MARIA SYLVIA CARVALHO FRANCO

Convivemos com a tragédia, mas não tivemos o grande Napoleão, quanto mais César

Continuação da pág. 5-9
Em Marx, porém, muito ao contrário de Hegel, a supressão do particular não se dá pelas determinações harmoniosas e verdadeiras da razão em sua liberdade, e sim pela violência, mais equacionada com a "Lições sobre a Filosofia da História", onde foi colhido o conceito de repetição política reelaborado no "Dezoito Brumário". Os personagens trágicos -os colossos da Roma clássica- aparecem na exposição hegeliana, literária e histórica, e ressurgem na síntese estético-política de Marx. Teatro e cena civil estão no centro desses três textos, com marcadas diferenças.
Nas passagens da "Estética", o elemento político subjaz, silente, como pano de fundo nas lutas entre particulares e nos choques entre eles e o todo. Nas "Lições sobre a Filosofia da História", a violência da cultura passa a primeiro plano, as beligerâncias concretizam-se. Pompeu e César, "dois pontos luminosos", defrontam-se com idêntica legitimidade: um apoiando-se no Senado, o outro no Exército, um com a superioridade institucional, o outro com a excelência do gênio. Nesse confronto, a força física acabou por suplantar a ética e "a dominação universal de Roma coube, pois, a um só". Carente de centro intelectual e de riqueza próprios, com a esfera pública degradando-se sem trégua nas prerrogativas privadas, a "Respublica" apenas poderia descansar "na vontade de um único indivíduo", capaz de revigorar o todo.
César, "modelo de finalidade romana" -apto a decidir com exata "ratio", interferindo de modo ativo e prático, sem outra paixão- modelou o corpo político, o todo articulado e coerente, que urgia instaurar. O ditador "fez duas coisas: atenuou o conflito interno e, no mesmo golpe, criou outro no exterior (...) César abriu um novo teatro: criou a cena que deveria tornar-se o centro da história universal". Esta passagem hegeliana resume, ponto por ponto, o tratamento posteriormente dado por Marx a Napoleão 1º, encarnação transitória da "Respublica", trágica figura autodestruída em sua própria desmesura.
César senhor do mundo, senhor da "civitas" estiolada, funesta, simulacro de si mesma. Reduzida à triste soberania do particular e dos medíocres, o imperador usou de violência para impedir o seu desmantelamento: máscara e ação necessárias, equivocadamente vistas como contingentes. Nesse engano, em vez de restaurar-se a República, firmou-se o apego ao Um. Daí o motivo hegeliano cuja variação encontramos em Marx: "É assim que Napoleão sucumbiu duas vezes e que duas vezes foram expulsos os Bourbon. A repetição realiza e confirma aquilo que de início parecia apenas contingente e possível" (5).
Nesses escritos de Hegel e de Marx, onde tantos legados e alusões se entretecem, a crítica ao poder tirânico remonta bem longe. A montagem do imperador romano, feita por Hegel, rebate-se circunstanciadamente na encenação do monarca francês, empreendida por Marx: desde a grande envergadura do personagem que "se inclinou demasiado, até o abismo, no trágico da ação" até o filistinismo, a miudeza, o engano, que o aniquilaram. O conceito retórico de imitação não poderia encontrar exemplo mais feliz, com o veio criador deslizando através do paradigma e do novo trabalho reflexivo. De fato, Hegel "apenas" esqueceu de mencionar, explicitamente, a comicidade degradante, muito embora esta baixeza esteja compreendida na própria repetição sancionadora do tirano, nos anões que o acolhem. Mas é todo o sentido do tempo que está posto em jogo, por Marx, no leve reparo que fez pairar sobre a assertiva de Hegel: mantendo e transtornando a leitura hegeliana do episódio revolucionário, Marx inverte as linhas do processo: o golpe de Bonaparte, "le petit", consolida o domínio despótico sobre a "Respublica", mas a reiteração do passado, o retorno, é letal.
O "Dezoito Brumário" elabora essa recusa do passado funesto a partir da própria idealização retroativa. "Por menos heróica que seja a sociedade burguesa, o heroísmo, a abnegação, o terror, a guerra civil e as guerras externas não foram menos necessárias para colocá-la no mundo. E seus gladiadores encontraram nas tradições rigorosamente clássicas da República romana os ideais e as formas de arte, as auto-ilusões de que necessitavam para dissimular, face a si próprios, o estrito conteúdo burguês de suas lutas e manter sua paixão nos píncaros da grande tragédia histórica" (6).
À luz dos textos hegelianos pode-se vislumbrar o agenciamento do passado preparatório do episódio revolucionário. Ao longe, a silenciosa metáfora das artes plásticas mais incipientes, com seus blocos espessos já prenunciando e ainda retendo o movimento, configura a cena cuja dinâmica está prestes a romper esses limites para, na dialética entre espaço inerte e tempo ativo, reanimar as representações passadas com o ímpeto do presente.
Tal como Marx o apresenta, o peso grave das gerações mortas surge como estrutura material entranhada na humanidade viva, uma e outra sustentando-se no mesmo espaço estável. Apoio mútuo que se reanima quando as categorias do tempo rompem esse equilíbrio. Os vivos, que "parecem ocupados em se transformar, a si e às coisas, precisamente nessas épocas de crise revolucionária, evocam, medrosos, os espíritos do passado". Neste ponto, o pretérito e o atual, os pesos inertes e as energias viventes interpenetram-se de modo vário e sutil: "as conjurações dos mortos da história" diferenciam-se no mundo efetivo, assumindo sentido ou perdendo-se na vacuidade, justamente por seu poder de inovar ou por sua estereotipia.
Nas grandes revoluções, francesa ou inglesa, os heróis, partidos e populares conjuraram os vultos redivivos capazes de atravessar os fluidos limites temporais, insuflando-lhes movimentos com o poder de elevá-los ao trágico. Reflexos do passado, rebatidos no presente: "A ressurreição dos mortos, nessas revoluções, serviu para magnificar as novas lutas, não para parodiar as antigas: para exagerar na fantasia a tarefa a cumprir, não para escapar, refugiando-se na efetividade; para encontrar o espírito da revolução, não para evocar seu espectro".
Um passado, um futuro, deixam-se pressentir, conduzindo-nos bem próximos da "Estética": a pintura logra entrar no "vivo movimento de condições, dores, conflitos e ações humanas (...) não imediatamente na sua figura externa, mas desenvolvendo, mediante ações, aquilo que é". Praticado sobre a extensão finita, o encanto da pintura colhe apenas o instante, escapando-lhe propriamente o tempo, mas, ainda assim, permite adivinhar, no todo apresentado, seus móveis e efeitos: "O pintor é capaz de recolher um resto do passado que ainda vale no presente em sua gradual evanescência e simultaneamente indicar o futuro a nascer como resultado de uma ação determinada: no quadro que descortina uma batalha, o pintor surpreende o momento da vitória, onde o combate ainda é visível ao mesmo tempo que o êxito já era certo". Tal como as artes singulares são contíguas, as figuras pictóricas conduzem às imagens poéticas, liberando uma saída no tempo (7).
Em Marx, o presente, também ele efêmero, reflete-se no futuro: o império napoleônico, tendo ainda visível a luta contra o Antigo Regime, criou dentro e fora da França as condições que asseguraram o desenvolvimento burguês. Aí, então, o ritmo se aplaca: "Uma vez estabelecida a nova sociedade, desapareceram os colossos antidiluvianos e, com eles, Roma ressuscitada (...)".
Com efeito, o caráter dessas situações as remete, nos assegura Marx, às artes plásticas, termo que, nesse contexto, só pode referir-se às produções ainda presas, em graus diversos, à exterioridade material. Segundo Marx, as revoluções burguesas tendem, por si mesmas, ao repouso; "elas precipitam-se rapidamente de sucesso em sucesso, seus feitos dramáticos se ultrapassam, homens e coisas parecem tomados pelo fogo do diamante, o êxtase é o espírito de cada dia: mas elas têm vida curta, logo atingem o apogeu e um longo mal-estar se apodera da sociedade até que ela aprenda a apropriar-se, de modo calmo, dos resultados de seu período de tensão e tormenta".
"Drang und Stürmperiode": jogo de palavras que suscita uma pletora de imagens e idéias ligadas, por muitos prismas, às representações da burguesia e do primeiro romantismo, com seus conteúdos opostos e inconciliáveis: anseio revolucionário, amortecido no dia-a-dia conservador (8). Com efeito, se mantido o movimento que tende a se aquietar, as ilusões burguesas transformar-se-iam em delírio. O passado deixa de ser regenerador, sua evocação é o retorno de uma época abolida, estranhamento de loucos, com suas obsessões: ingleses, maníacos pelo ouro, figuram-se como escravos nas minas do faraó; franceses, tomados pelas miragens napoleônicas, convertem-se em farsa. Rumo ao infinito, o movimento da finita revolução burguesa se auto-anula.
Na tradição hegeliana, nas artes que visam realizar a síntese entre razão e sentimento, o equilíbrio e o limite são indispensáveis: sem estes não há produção artística nem prazer estético. Com maior clareza, isto se capta na pintura, que já comporta movimentos com intensidade e que traz, potencialmente, em si mesma, o comedimento: levada ao extremo, a agitação da alma, na imagem pictural, seria destrutiva. Como o pintor, Marx encontra a ação dramática num só ponto, no presente, momento totalizante das condições já herdadas e dos eventos ainda por vir. Esta sorte de "escrita pictórica" só é possível, porém, porque a própria situação nela exposta o permite, encontrando uma temporalidade estabilizada: a sociedade capitalista "completamente absorvida pela produção de riqueza e pela luta pacífica da concorrência, havia esquecido que os espectros da época romana tinham velado o seu berço".
Se o ponto de repouso favorece a pintura da revolução, é com muita propriedade que, nessa escrita de Marx, são chaves os termos conotativos de tênues formações de luzes, reflexos, ilusões, cujos sentidos acumulam referências ao passado, não como peso morto, como tradição rotinizada, mas no seu movimento, por assim dizer, vaporoso: aparições, espectros, fantasmas. Com os combates proletários, Marx redefine os parâmetros estéticos que tomou por referência nas revoluções burguesas, passando às imagens literárias, gênero capaz de apanhar a dramaticidade continuamente desenvolvida. "A revolução social do século l9 não pode tirar sua poesia do pretérito, mas somente do porvir." Demitificada, sem reminiscências, ela deve "deixar os mortos enterrarem seus mortos".
Seu movimento acelerado não apenas cancela a memória, mas impede qualquer outra instância conservadora: "Elas criticam a si mesmas constantemente, interrompem a cada instante seu próprio curso, retornam àquilo que parece estar completo para recomeçar de novo, ridicularizam, impiedosas, as hesitações, fraquezas e misérias de suas primeiras tentativas, parecem abater seu adversário apenas para lhe permitir retirar novas forças da terra e se levantar, novamente, formidável, face a elas; recuam assustadas, continuamente, diante da imensidão indeterminada de seus próprios fins, até que seja produzida a situação que torna impossível toda volta atrás". A pintura, embora carregue em si o instante que recolhe a escanção potencial do tempo, não dá conta, como o movimento infinito da poesia, do correlato desenvolvimento da revolução proletária.
Marx insiste no drama como símile dos grandes atos da história universal. Já notamos que ele os centraliza no atual, aspectos que nos reconduzem à "Estética", onde o drama é definido como "ação circunscrita a seu desenvolvimento presente" (9). Não nos esqueçamos que o núcleo do debate, no "Dezoito Brumário", é a constituição do Estado e que, nesse contexto, se inscreve o adágio "hic Rhodus, hic salta", explorado por Marx em pista deixada por Hegel. Em torno desse lugar comum, em ambos os discursos, deslinda-se a questão do presente como chave da temporalidade.
Três prismas decompõem, segundo Hegel, as relações entre subjetividade e mundo efetivo. Em um deles, só a primeira vale, o segundo é tolice. Entretanto, "se a consciência subjetiva considera o presente como vazio, situa-se para além dele e acredita saber mais que ele, então ela mesma encontra-se no vazio e, tendo efetividade apenas no presente, ela própria é só vacuidade". Na perspectiva inversa, o mundo é tudo, a subjetividade, mera representação. Contra tais extremos, a filosofia diz que "nada é efetivo senão a idéia. Trata-se então de conhecer, na aparência do temporal e do transitório, a substância, o imanente, o eterno que é o presente" (10).
O programa hegeliano, é sabido, expulsa o dever ser; a filosofia apreende "o que é". "É tão louco presumir que uma filosofia (...) possa ultrapassar seu mundo presente, sair dele, quanto supor que um indivíduo consiga saltar sobre seu tempo, saltar sobre Rodes"(11). Se a teoria ousa esse pulo, construindo um mundo "como deve ser", ele existirá apenas no reino da opinião. Hegel critica, aí, o escape pelo pensamento, a "projectio per hiatum irrationalem". Desligada do presente, a subjetividade cai na loucura e no domínio da imaginação (12).
No "Dezoito Brumário", a mesma tese vale para os democratas franceses. A revolução desmantelava-se. O dia da eleição presidencial "tornou-se, na sua cabeça, uma idéia fixa, um dogma tal como para os quiliastas, o dia em que Cristo deveria reaparecer, instaurando na Terra o reino milenar". Com esta promessa, com a esperança na repetição miraculosa graças a um homem providencial, o grupo democrata "perdeu toda a dimensão do presente para a inativa glorificação do futuro". Loucura em Hegel, idéia fixa em Marx: em ambos trata-se de uma superação imaginária do presente.
Mas diferenças marcadas afastam os dois pensadores. Essa reflexão, em Hegel, apanha todo pensamento. Ao expô-la, ele retoma as imagens das artes plásticas: quando a filosofia pinta os seus tons grisalhos, "uma figura da vida envelheceu e com cinza sobre cinza, ela não rejuvenesce (...)" (13). Cinzas crepusculares das quais nenhuma Fênix revive.
Posto esse marco, simultaneamente plástico e temporal, podemos compreender que, para Hegel, só caiba mover-se no presente. O saber filosófico e histórico não atinge o plano da poesia, não podemos tomar tal liberdade com a política e a história. Marx projetou esse contexto nas atividades burguesas, rompeu os limites da pintura e fez da poesia, com seu movimento infinito, metáfora da revolução proletária voltada para o futuro. A própria disposição dos argumentos, em Hegel e Marx, nos tropos que freiam o presente ou impelem o futuro, é muito elucidativa.
Hegel, depois de fechar o horizonte "naquilo que é", na razão, cita, nas formas grega e latina, o adágio "Idou Rhodos, idou kai to pêdêma" e "Hic Rhodus, hic saltus", emblemático do salto absurdo. Segue-se a reiteração do efetivo, repelindo a impraticável saída para fora do contemporâneo. Só depois, com este peso conotando os sentidos seguintes, Hegel traduz o provérbio, valendo-se de polissemias do grego, no primeiro termo, e do latim, no segundo: "Aqui está a rosa, aqui é preciso dançar", versão que circunscreve o campo semântico no presente (14).
Nessa leitura, é tão insensato pretender que uma filosofia possa ultrapassar o mundo contemporâneo como supor que um indivíduo possa saltar por cima de seu tempo, sobre o rochedo de Rodes.
O texto de Marx muda o registro do mesmo adágio: sua forma latina segue, imediatamente, a passagem sobre o movimento das revoluções proletárias, redefinindo o contexto e deslizando o sentido da máxima antiga: ela não mais se retrai num imaginário vazio, mas abre-se para uma dinâmica de situações irreversíveis. O provérbio latino, transformado em signo do futuro, justapõe-se à tradução alemã, contaminando-a e fazendo com que a dança presente constitua o salto para o futuro.
Hegel proíbe a pirueta exorbitante, fecha o passo no giro comedido e tranquilizador do presente; Marx rompe o cerco, com a dança desmesurada e dionisíaca da revolução proletária -uma criação poética e trágica do futuro. Nada mais lembra, aqui, as concepções cíclicas de Hegel: o tempo marxista abre-se, sem hesitar, ao porvir. As artes não aquietam: nelas, o tempo guarda o mesmo poder negativo, as mesmas contradições da história e da política. Marx depositou suas esperanças no progresso ininterrupto da práxis operária, vendo no tempo -nos homens em ato- a condição para as conquistas sociais; reconheceu, também, na calma do espaço ordenado e estável, o meio propício à dominação burguesa. Todo um "pathos" do pensamento marxista -uma obsessão pelo futuro- transfere-se para a poesia, a qual recebe idêntico impulso.
Talvez seja este um grande e funesto destino, em nossa época. As palavras de Klebnikov, "...compreendi que a pátria da criação era o futuro, é dele que sopram os ventos dos deuses da palavra", nutrem a desalentada meditação de Jakobson: "O laço dos tempos rompeu-se... perdemos o sentimento do presente... os encantadores cantos que nos falavam do futuro transformaram-se em fatos...".
Escatologia melancólica -perda, não esperança- que destruiu Maiakóvski: apostando na ruptura dos tempos, "o realismo do poeta não consistia em recolher as migalhas do passado, nem tampouco em se fazer reflexo do presente, mas em antecipar, enquanto criador, o futuro".
Seu tino profético, fatal, terminou por voltar-se contra ele próprio. "No fim dos poemas, Maiakóvski havia esboçado o mito monolítico do poeta, a combater a revolução pelo espírito, condenado à incompreensão e à recusa, cruelmente hostis." Ele captou em sua poesia, com a iminência da pintura, a trágica síntese dos tempos: "O massacre terminara... Sós, acima do Kremlin, farrapos do poeta flamejavam ao vento, como uma bandeira vermelha" (15).
Frustrando todas as promessas, o stalinismo trouxe a anulação do porvir e da própria arte. Na cena da política e da cultura -no lado do capital ou do socialismo realista-, a força bruta suplantou o combate espiritual. Nos parâmetros nacionais, nossos, não podemos discernir nem passado ou futuro idealizados, nem presente engendrador: apenas reiteração do mesmo reduzido às mesquinharias do interesse individual e do particular, numa volta ao velho "ethos" da dominação pessoal. Mas, agora, como arremedo do coronel, por sua vez já fantasma do Senhor, simulacro de El-Rei.
Só assim, como cópia da cópia, repetindo uma prosaica história já originalmente miserável, povoada de anões e não de colossos, pode-se visualizar o quadro rotinizado onde se instala o nosso candidato a Príncipe, pelejando pela reiteração de si mesmo, com todas as armas -do favor ao balcão- que o passado lhe deixou cair, transitoriamente, no colo. Ou, enquanto imitação do democrata de ordem, cabe-lhe o papel de Napoleão "le petit", também abarrotado de votos e votado à farsa? Convivemos com a tragédia, mas não tivemos o grande Napoleão... Quanto mais César.
A difícil crítica marxista -repelida de modo fácil e banal, de encambulhada com o comunismo- nos ensina que a repetição do passado (travestido, embora, de moderno) não é tão segura quanto os seus imitadores presumem, que estacionar nele pode ter o mais funesto dos desenlaces e que o presente não é a razão intransponível. Embora ex-leitor de Marx, Fernando Henrique não poderia ignorar a perigosa fantasmagoria em que está se enleando. "Fugit irreparabile tempus", diz outro velho adágio.

Notas:
1. Hegel, "Lições Sobre a Estética" (abreviada "L.E."), in "Werke in Zwanzig Bãnden", F.A.M. Suhrkamp, 1976, tomo 13, volume 1, pág. 6. Demais citações de Hegel são da mesma edição.
2. Hegel, "L.E.", tomo 13, volume 1, págs. 62-63. Para a matéria da poesia, cf. tomo 15, volume 3, pág. 229.
3. Hegel, "L.E.", tomo 15, volume 3, pág. 228.
4. Hegel, "L.E.", tomo 15, volume 3, pág. 522.
5. Hegel, "Lições Sobre a Filosofia da História" (abreviadas "L.F.H."), tomo 12, págs. 378-380.
6. Marx, K. "O Dezoito Brumário de Luís Bonaparte" in "Werke", Berlim, Dietz Verlag, 1960. Demais referências a Marx são da mesma edição.
7. Hegel, "L.E.", tomo 15, volume 3, pág. 89.
8. Cf. E. Auerbach, "O Músico Miller", in "Mimesis", Nova York, Doubleday, 1957.
9. Hegel, "L.E.", tomo 15, volume 3, pág. 519.
10. Hegel, "Fundamentos da Filosofia do Direito" (abreviados "F.F.D."), tomo 7, pág. 25.
11. Hegel, "F.F.D.", tomo 7, pág. 26.
12. Para uma leitura inversa, cf. P.E. Arantes, "Hegel - a Ordem do Tempo", SP, Polis, 1981, págs. 241 e seguintes.
13. Hegel, "F.F.D.", tomo 7, pág. 28.
14. "Rhodos", ilha de Rodes, e "rhodon", rosa; "salta", imperativo de "saltare", dançar. Cf. a edição de R. Derathé dos "Principes de la Philosophie du Droit", Paris, Vrin, 1975, pág. 57, nota 18, apud T. Knox, "Hegel's Philosophy of Right".
15. Cf. R. Jakobson e K. Pomorska, "Diálogos", tradução de E.A. Kossovitch, B. Schnaiderman, L. Kossovitch e H. de Campos, SP, Cultrix, 1980, págs. 132-134.

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