São Paulo, quarta-feira, 18 de junho de 1997
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A reestruturação da indústria de serviços

ANITA KON

Têm sido amplamente discutidas na literatura econômica algumas mudanças significativas pelas quais passaram as economias mundiais nos anos recentes, para responder mais rapidamente às mudanças do mercado e à competição internacional.
Referem-se particularmente aos aspectos da internacionalização das atividades econômicas, reorganização das firmas dominantes, crescente integração da produção manufatureira com a de serviços, uso crescente da tecnologia microeletrônica, com a eliminação de muitos trabalhos rotineiros, demanda industrial ascendente por uma força de trabalho mais qualificada e flexível, crescente complexidade e volatilidade do consumo e mudança no papel da intervenção do governo, que, gradativamente, se retira de funções empresariais e restringe suas funções produtivas.
As atividades de serviços estão no centro dessa revolução econômica mais ampla, que está ocorrendo no mundo na atualidade. Para alguns analistas, essa nova revolução é equivalente em importância à Revolução Industrial do século 18, ao surgimento das corporações na Idade Média e à mudança de uma economia de caça/coleta para uma economia agrícola/pastoral no princípio da época da história registrada, quando a agricultura organizada levou ao desenvolvimento inicial de cidades e à intervenção da escrita.
A crescente proeminência dos serviços, com contribuições relevantes e multifacetadas para a mudança estrutural, tem se caracterizado pelo aumento da interdependência entre a produção de bens e serviços, desde que qualquer produto (em forma de bens ou serviços) é criado por uma sequência complexa de trocas materiais e imateriais, que envolve fornecedores e consumidores, incluindo subcontratados e consultores.
Em segundo lugar, pelo crescente valor da especialização em serviços observado no capitalismo do final do século 20, que vem contribuindo para a manipulação de matérias-primas, informação, capital e trabalho, em qualquer atividade de produção ou consumo.
Interpretar o mundo tornou-se uma tarefa mais complexa, a produção de bens e serviços tornou-se mais capital-intensiva e o papel desses serviços especializados então se intensificou.
Além do mais, é significativa a maneira pela qual as qualificações e especializações para as atividades de serviços influenciam os padrões locacionais encorajando a aglomeração, particularmente das funções de alto nível.
Essas tendências têm dominado a evolução das regiões urbanas nos anos mais recentes e também influenciado os padrões da localização manufatureira, desde que a especialização em serviços oferece não apenas um conhecimento técnico e material para os processos produtivos em constante transformação, mas também para qualificações organizacionais ou gerenciais.
Finalmente, é relevante ainda a forma pela qual as mudanças técnicas criam novas oportunidades para a exploração da especialização em serviços.
As tecnologias da informação e das comunicações têm conduzido à industrialização dos serviços, à inovação organizacional e a novas formas de comercialização dos serviços, no que se refere aos relacionamentos entre produtor e consumidor. São observadas na atualidade transformações consideráveis na produção, no produto, no consumo e nos mercados dos serviços.
No que diz respeito à produção, distinguem-se aspectos relacionados à tecnologia e à planta (aumento de teleserviços), qualificação do trabalho, organização do processo de trabalho (intensificação da informatização), características da produção (padronização) e organização da indústria de serviços (terceirização, privatização e parcerias).
Com relação ao produto dos serviços, as mudanças observadas se referem à própria natureza do produto, com a utilização frequente de cartões magnéticos ou da telemática como intermediação, e às características do produto, adaptado às requisições do consumidor.
Por sua vez, o consumo dos serviços apresentou transformações consideráveis na forma de entrega do produto, no papel do consumidor no processo (consumo interativo) e na organização do consumo, com aumento do autoconsumo.
Também os mercados de serviços sofreram alterações radicais com a inovação tecnológica, que se refletiram na sua organização por novas formas de pagamento, de reservas ou de pontos-de-venda, bem como na regulação, com sistemas de análise e controle terceirizados, e ainda no marketing (períodos de experimentação do produto, softwares de demonstração).
No Brasil, essa reestruturação, iniciada nos anos 80, impulsionada pela necessidade premente de ampliação da competitividade interna e internacional, vem aumentando de intensidade na década de 90, embora em ritmo ainda lento, para adequar-se às diretrizes da política de estabilização.
Nesse contexto, o esforço dos agentes econômicos de acompanhar no país os caminhos mundiais da reestruturação da indústria de serviços não tem como objetivo simplesmente um "efeito demonstração", mas é uma questão fundamental para o estabelecimento de fatores locacionais que sinalizem a possibilidade de atração de investimentos externos produtivos, em ritmo e condições favoráveis à retomada do processo de desenvolvimento socioeconômico.

E-mail: anitakon@exatas.pucsp.br

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