São Paulo, quarta-feira, 18 de junho de 1997
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ESTABILIDADE DESAJUSTADA

A estabilidade econômica brasileira repousa sobre um inquietante desajuste nas contas externas. O que é mais grave, a estabilidade é em boa parte explicada pelo próprio desajuste. Afinal, isso que se convencionou chamar de "âncora cambial" nada mais é que a abertura comercial e financeira, acelerada pela política de valorização da taxa de câmbio.
O déficit externo em conta corrente superior a 4% do PIB projeta, porém, uma sombra de dúvida sobre a perspectiva de manutenção da "âncora" no futuro. Há três hipóteses: a desvalorização cambial, o ajuste recessivo e o "feijão com arroz". Este, a rigor, é uma combinação desengonçada e contida das duas primeiras.
As chances do "feijão com arroz" dependem da confiança dos investidores externos. São eles que, direcionando recursos para as Bolsas brasileiras, emprestando dinheiro a empresas e bancos daqui, comprando ativos do Brasil ou mesmo construindo fábricas, definem o grau de segurança para a manutenção do atual estado de coisas.
Teoricamente, ao menos, à medida que houver confiança externa, os desequilíbrios em conta corrente serão financiáveis. Afinal, nada mais natural que uma economia importar mais quando a taxa de câmbio ajuda e há financiamentos externos. A fronteira entre o risco suportável e uma crise, porém, está num desajuste totalmente doméstico: o desequilíbrio nas contas públicas, fruto da incapacidade de reformar o Estado.
Ocorre que, para evitar uma deterioração maior das contas externas, o governo opta por conter o crescimento econômico. Essa opção acarreta inevitável queda na arrecadação, numa velocidade superior à capacidade do governo de cortar gastos. Ou seja, para evitar um rombo externo maior, mantendo o câmbio estável, o governo fragiliza as contas públicas, o que torna o investidor mais arisco.
Numa palavra, trata-se de inconsistência. No coração do plano de estabilização estão alojados desajustes que podem ser fatais.

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