São Paulo, domingo, 22 de junho de 1997
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Cigarro perdeu charme e virou chaga

CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
DE WASHINGTON

Qual será o destino do cigarro nos EUA: parecido com o do ópio, que era permitido no início do século, foi proibido e nunca mais liberado, ou com o do álcool, proibido na década de 20, mas, após alguns anos, de novo legalizado?
A indústria do tabaco é muito maior do que a do ópio e se compara à do álcool. Ela fatura US$ 50 bilhões anuais. Embora o hábito de fumar tenha se reduzido em 40% nos últimos 32 anos entre adultos no país, ainda há 47 milhões de pessoas que fumam e não querem perder esse direito.
A campanha contra o fumo é um fenômeno de rápida popularidade. Em duas gerações, o cigarro passou de símbolo de prestígio social à condição de chaga pública. Só em 1972 se criaram alas de não-fumantes em aviões, e em 1987 ainda era possível fumar em vôos domésticos. Há apenas quatro anos, nenhum Estado proibia o fumo em ambientes fechados, como acontece agora em quase todo o país.
Apesar disso, o conceito de que a liberdade individual deve ser respeitada desde que seu exercício não interfira no direito alheio ainda é muito forte no país. A obsessão pela vida saudável aumenta a cada ano, e a tendência a se tentar impor hábitos medicamente recomendáveis a todos, também.
Mas qualquer pessoa razoável sabe que à proibição do cigarro pode se seguir nova tentativa contra o álcool. E depois podem vir investidas contra a manteiga, o açúcar, o sal, os corantes artificiais. Até o dia em que todos serão obrigados a 50 flexões abdominais pela manhã e corridas de 5 km à tarde.
Todas as sociedades humanas, como muitos antrópologos já notaram, permitiram o consumo de algum tipo de droga por seus integrantes, inclusive como fórmula de escape das tensões coletivas.
A não ser que a escalada da perda do bom senso nacional continue a crescer geometricamente (o que não é impossível, como mostram os recentes incidentes sobre adultério nas Forças Armadas), a maioria vai se convencer -cedo ou tarde- de que um limite deve ser imposto à mania de se regular a vida individual por padrões morais, estéticos, políticos ou médicos, ainda que elogiáveis.
(CELS)

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