São Paulo, sexta-feira, 27 de junho de 1997
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Cade: órgão fadado à extinção

CELSO RIBEIRO BASTOS

Nunca tivemos e não deveremos ter, no futuro, órgãos para controle do mercado.
Durante o período militar, tivemos uma política de nítida tendência concentradora de capitais, bem como empresas amparadas por fortes alíquotas de importação de mercadorias.
Recentemente, com as leis nº 8.884/94 e nº 9.021/95, que se inserem na linha da repressão ao abuso do poder econômico, pensar-se-ia que o país finalmente teria ingressado numa fase de feliz coincidência entre os textos normativos e a realidade econômica. Mas, a esta altura, esta última, na verdade, acabou por tirar o sentido de regras jurídicas controladoras do mercado.
A lei, portanto, só tem sido razão de frustração. E isso porque tem ela servido para permitir a intervenção do Estado na fixação de preços, o que não é matéria de uma legislação antitruste, que, tecnicamente, visa à preservação do mercado, sendo que este imporia os preços.
Poder-se-ia dizer, então, que a lei visa a regular o mercado, com o que teria andado bem o Cade ao fulminar a união de cervejarias nacionais e estrangeiras.
Nessa decisão, contudo, ficou claro que a visão dos conselheiros é totalmente vesga, para o seu próprio papel e para o das instituições, posto que vedaram essa fusão sob o pretexto de concentração ou de que não traria maiores investimentos ao Brasil, ou ainda sob o fundamento de que a empresa estrangeira teria capital suficiente para entrar no mercado nacional sozinha.
Em síntese, barrou-se a fusão porque se lhes afigurou inconveniente de um ângulo de fundo, de mérito. É óbvio que intervenções como essa não encontram amparo no texto constitucional, que alude a uma verdadeira legislação antitruste, qual seja, aquela que combata os procedimentos distorcivos das regras de mercado.
Mas o que cumpre ainda salientar é que não se trata apenas de uma decisão infeliz do órgão controlador, mas diz respeito à própria necessidade ou não de um controle de mercado num momento de globalização. O mínimo que se poderia dizer é que seria aceitável um controle de mercado, tomando este como resultante de um processo de integração dos países que compõem um mercado comum e único, que estão isentos de tarifas alfandegárias.
Não tem sentido impedir uma fusão, mesmo que ela venha a permitir a formação de uma determinada concentração empresarial interna, se esta encontrar concorrência em duas ou três outras nos países vizinhos.
Neste momento de tamanho caos normativo, é importante que órgãos como o Cade reflitam sobre o seu papel de maneira realista e com humildade diante dos fatos.
O que não podemos é continuar a ter uma mobilização de parte do governo para despertar simpatias no exterior favoráveis à remessa de capitais para o Brasil e, de outro lado, sustentar um órgão como o Cade, cumprindo uma função diametralmente oposta. A não acontecer assim, bem andaria o governo se extinguisse de uma feita o Cade e a SDE, como fez com a Sunab.
Hoje, as nossas empresas estão submetidas a uma tensão competitiva como nunca estiveram no passado por força de lei, qualquer que fosse. A redução e eliminação de tarifas alfandegárias é um fato econômico muito mais forte do que a lei.
Portanto, não nos parece que haja mais um espaço jurídico viável para a atuação de órgãos como a SDE e o Cade, sendo de inteira conveniência para o interesse nacional sua eliminação, o que teria profundas repercussões no campo da diminuição das despesas públicas, tudo com vista ao tão procurado equilíbrio financeiro.

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