São Paulo, sábado, 28 de junho de 1997
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Regras iguais para o Mercosul crescer

VALDIR COLATTO

Nas negociações que faz com os países que integram o Mercosul, o Brasil, no lugar de competir em pé de igualdade, dá privilégios a estes em detrimento de interesses nacionais. Em contrapartida, os parceiros habituaram-se a fazer queixas contra o Brasil.
A imprensa está sempre noticiando a insatisfação de tais países com as atitudes adotadas pelo governo brasileiro, sobretudo no que diz respeito a um pretenso protecionismo a alguns produtos nacionais.
A propósito e por força de uma medida provisória, as importações brasileiras financiadas por prazo inferior a 360 dias passaram a ser pagas à vista no momento em que os produtos são retirados pelo importador. A decisão causou impacto entre os parceiros brasileiros no Mercosul (Argentina, Uruguai e Paraguai), que vêem a medida como danosa para o consenso do bloco econômico.
Diante de informações duvidosas noticiadas pela mídia e o fato real, é bom esclarecermos que o Tratado de Assunção, que criou em 95 o Mercosul, estabeleceu que não haveria mais barreiras tarifárias no comércio entre os países do bloco.
Na ocasião, Argentina, Uruguai e Paraguai exigiram a exclusão de setores importantes da economia nacional, como as indústrias automotriz e sucroalcooleira. No entanto, incluíram vários produtos nas chamadas listas de adequação -uma espécie de reserva provisória para produtos que precisam alcançar condições de competitividade.
Verificou-se, então, absoluta disparidade entre as listas elaboradas, e o Brasil demonstrou ter maior disponibilidade para negociações. Ora, foram 29 produtos brasileiros de pequena expressão econômica, contra 221 arrolados pela Argentina, 427 pelo Paraguai e 950 pelo Uruguai.
Passado o primeiro ano, evidenciou-se o caráter nitidamente protecionista quanto a tais produtos, uma vez que estavam sendo exportados para o Brasil sem taxação, e os produtos nacionais, sendo taxados, para supostamente impedir a concorrência em condições desiguais.
Outros absurdos caracterizam a situação: o café solúvel argentino foi incluído na lista. O café que exportamos para aquele país é taxado em 18%, enquanto que o mesmo produto, argentino, entra no Brasil com tarifa zero. Solicitada a retirar o café solúvel do regime de adequação, a Argentina recusou-se, a pretexto de necessária modificação em seu código alimentício.
O mesmo ocorreu com o comércio calçadista, que é taxado em 27%, contra tarifa zero dos produtos argentinos. Só em 95, a Argentina exportou para o Brasil US$ 33 milhões em calçados, em detrimento da produção nacional.
Os produtos importados pela Zona Franca da Patagônia entram no Brasil como se fossem fabricados na Argentina -portanto, não sofrem nenhuma taxação-, mas não há reciprocidade quando se trata da Zona Franca de Manaus. Existem inúmeros problemas originados pelo descumprimento de dispositivos do tratado e pelo desrespeito a itens importantes dos acordos assinados, que vêm resultando em grandes prejuízos para o Brasil. Muitos nem sequer são comentados pela imprensa comum e/ou especializada.
Ao contrário do que a mídia noticia, o Brasil tem sido generoso com seus parceiros do Mercosul. Os números não mentem: em 95, a balança comercial do Brasil em relação à Argentina apresentou déficit da ordem de US$ 1,5 bilhão, o que representa 50% de todo o déficit comercial do Brasil no mesmo período.
Seguindo as regras do jogo internacional, todos os países pretendem ter livre acesso aos grandes mercados. No contexto do Mercosul, o Brasil é responsável por 75% das operações comerciais realizadas, ou seja, é um grande mercado. Cerca de 60% das exportações desses países são direcionadas para o Brasil. No caso específico do Paraguai, esse fluxo comercial supera 90% das suas exportações. Não é de admirar que nossos parceiros encontrem no mercado brasileiro excelente oportunidade para se desenvolver.

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