São Paulo, domingo, 29 de junho de 1997
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Os consórcios de saúde e o SUS

LUÍS NASSIF

Desde a criação do SUS (Sistema Único de Saúde), o maior avanço experimentado na área de saúde pública são os consórcios municipais de saúde de Minas Gerais.
Trata-se de associações de municípios consorciados, incumbidas de planejar e coordenar todas as atividades de saúde da região, permitindo ações conjuntas e racionalização dos investimentos.
É a melhor resposta ao velho modelo centralizado, unindo o controle municipal sobre as verbas com a racionalização dos investimentos regionais.
Hoje em dia, apenas em Minas Gerais já são 57 consórcios, abarcando 616 municípios.
A experiência já se estendeu para Rio Grande do Norte, Paraíba, Sergipe, Mato Grosso, Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná e Rio Grande do Sul e se tornou programa oficial do Ministério da Saúde.
Obviamente, não é para qualquer um. O modelo só funciona nas regiões politicamente mais evoluídas, onde se consegue colocar o bem-estar da população acima das idiossincrasias políticas. Dos consórcios mineiros, apenas oito já conseguem funcionar adequadamente, 25 ainda estão na fase intermediária e o restante, em fase incipiente.
Os consórcios surgiram a partir de uma experiência empreendida em 1987 pela Faculdade Nacional de Medicina de Minas Gerais, coordenada pelo professor José Rafael Guerra, atual secretário da Saúde do Estado.
Guerra mudou o currículo da faculdade, introduzindo o "internato rural", pelo qual os alunos são obrigados a passar três meses no interior, em duplo rodízio -dois por vezes em rodízio, em cada cidade.
A primeira experiência foi no Alto do São Francisco.
Com 7.000 habitantes, Moema tinha um hospital fechado, com 33 leitos, e nenhum médico para atendimento. A faculdade resolveu assumir o hospital. Rapidamente, começaram a convergir para lá todos os doentes da região, criando um problema burocrático.
Pelas normas do SUS, a cota de cada cidade corresponde a 9% de sua população. O hospital chegou a atender a 250 internações por dia, o equivalente a uma população inteira de Moema por ano.
Para resolver a situação com o SUS, em 1993 Guerra convidou os prefeitos da região para um encontro. A legislação do SUS já previa a figura do consórcio. Reuniram-se 16 municípios, perfazendo uma população de 250 mil habitantes, e passaram a trabalhar em conjunto, inclusive para efeito das estatísticas do SUS.
A partir do momento em que o foco da análise virou a região, municípios pequenos puderam desenvolver especialidades e atender a toda ela.
Por exemplo, um tomógrafo só se torna economicamente viável para uma população de 250 mil habitantes. Com o consórcio, Santo Antônio do Monte, de menos de 10 mil habitantes, pôde montar um Hospital de Saúde da Mulher, com tomógrafo, mamógrafo e ultra-som, em parceria com o Hospital Albert Einstein.
A região não possuía nenhum psiquiatra. Com o consórcio, Lagoa da Prata pode montar seu Núcleo Psiquiátrico, com dois psiquiatras, dois psicólogos, um assistente social e um terapeuta ocupacional trabalhando para toda a região.
Iguatama, com 7.000 habitantes, criou um centro de oftalmologia, que em 1996 efetuou 3.249 operações de catarata -mais que todo o Estado de Minas. Agora, prepara-se para iniciar transplantes de córnea.
Estrela do Indaiá, com 3.500 habitantes, montou um serviço de urologia. Igaratinga, com 5.000 habitantes, tornou-se centro de referência em dermatologia, servindo a mais de um consórcio.
O caminho de constituição do consórcio é simples:
1) A decisão política de juntar prefeitos de diferentes partidos.
2) Autorização da Câmara, que deverá destinar 0,5% da cota de parte do Fundo de Participação do Município para financiar o consórcio.
3) Estatuto, registrado em cartório e escritório central.
A estrutura dos consórcios é constituída pelas seguintes entidades:
*Conselho de prefeitos, com todos os prefeitos de cidades consorciadas, um voto por cidade. É a instância máxima do consórcio.
*Conselho curador, o órgão técnico de controle de gestão, constituído pelos representantes das secretarias municipais da Saúde.
*Conselho fiscal, constituído por um vereador por cidade, indicado pelo presidente da Câmara.
*Secretaria executiva, o órgão de administração financeira e de coordenação e execução das atividades do consórcio. O coordenador é escolhido pelo conselho de prefeitos.
De sua parte, a Secretaria Estadual da Saúde induz à formação de consórcios, evitando passar recursos isoladamente para municípios. Só concede verbas para a construção de hospitais se previamente aprovadas pelo Consórcio.

E-mail: lnassif@uol.com.br

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