São Paulo, domingo, 29 de junho de 1997
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Se o Brasil perder, perde então para a altitude

ALBERTO HELENA JR.
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Se o Brasil perder, perde para a altitude, e só quem não subiu o morro desconhece os efeitos devastadores desse inimigo.
Para enfrentá-lo, é preciso tempo de adaptação que varia de 14 a 20 dias, tempo que não dispusemos por obra de outro inimigo mortal do futebol brasileiro: a proverbial desorganização administrativa.
Sei que circula a tese de que os males da altitude podem ser driblados caso os atletas cheguem a La Paz exatamente no dia da competição. Alguns, sim; outros, não.
Sem contar o aspecto psicológico -muitos se rendem antes ao medo da altitude.
Lembro das eliminatórias da Copa-78, quando na volta de Cali ao Rio teríamos de fazer uma longa parada em Bogotá, onde, para pousar, o avião tem de subir em vez de descer.
O saudoso técnico Cláudio Coutinho, que juntamente com o professor Lamartine havia elaborado o plano de adaptação à Cidade do México, na conquista de 70, vivia me advertindo dos perigos que enfrentaria em Bogotá.
Atleta desde menino, jogador de vôlei de praia, mergulhador afamado, professor de educação física, dono de róseos e poderosos pulmões, preocupava-se com este amigo asmático, fumante compulsivo e uiscoólatra inveterado, que, ao cair na piscina, dedica-se ao exercício de boiar.
Pois bem, mal tocamos o solo de Bogotá, Coutinho desabou. Os médicos acudiram e logo chegou um balão de oxigênio.
E eis aquele homenzarrão lá, estirado na maca. Cena assustadora. Eu? Bem, pra me recuperar do susto, imediatamente, corri em direção ao bar do aeroporto, pedi um uísque e acendi um cigarro, que ninguém é de ferro.
*
Pelo menos Zagallo caiu na real, largou mão daquela falácia do número 1, e cuidou de dar um mínimo de estrutura ao nosso sistema defensivo.
E ainda por cima metemos 7 a 0 no Peru, que alguns incautos julgavam até ser a sensação do torneio.
Que sensação, se diante dos reservas da Argentina, ganhando de 2 a 1, com 11 contra 8, quase permitiu o empate?
O fato, porém, é que já vi muita seleção brasileira jogando contra o vento complicar-se. Esta, não. Manteve o equilíbrio em todos os setores, ao longo de toda a partida, e revelou, até o final, mesmo com 10 contra 11, a volúpia do gol. Fez sete e poderia ter feito dez, marca registrada dos nossos meninos na Malásia.
Por falar nisso, nosso futebol parece mesmo destinado a viver sob o império dos canhotos. Não bastassem Djalminha, Denílson, Leonardo, Roberto Carlos e Zé Roberto, na seleção principal, surgem agora o artilheiro Adaílton e o meia Alex, este um craque.
Pelo visto, o verso do poeta mudou de sinal.
Agora, quando o moleque sai de casa, o pai faz a sábia recomendação: "Vá ser gauche na vida, meu filho".

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