São Paulo, segunda-feira, 30 de junho de 1997 |
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A síndrome de Liz Taylor
JOSÉ SERRA Quando o Plano Real foi lançado, já haviam sido feitas pelo menos nove tentativas sérias de deter a superinflação no Brasil, entre 1979 e 1991.Foram planos de estabilização para todos os gostos: ortodoxos, heterodoxos, ortoheterodoxos e heterortodoxos, todos naufragados em meio a combinações diferentes de falhas de concepção, erros na implementação, condições externas adversas e resistências políticas. Tal acervo de experiências frustradas teve um efeito positivo: ensinou o que deveria ser evitado e o que não poderia ser excluído de um novo plano. Mas, por outro lado, criou a síndrome Elisabeth Taylor, cuja descoberta, para mim, resultara de uma das muitas reflexões com o embaixador Rubens Ricupero quando estava ainda em Genebra, em 1991. Acreditar que um décimo plano de estabilização iria dar certo era equivalente a confiar que o enésimo casamento de Liz Taylor iria perdurar. Todos gostam dela, querem que ela seja feliz, mas são céticos sobre a durabilidade de sua próxima união conjugal. Vencer essa síndrome foi talvez o maior mérito do ministro da Fazenda do governo Itamar Franco, Fernando Henrique, submetido a uma tripla pressão: da sociedade que, síndrome à parte, estava sequiosa de uma saída para o desespero da superinflação; das forças próximas ao governo e do seu partido, cujo destino eleitoral parecia depender do desempenho da economia; e, finalmente, do seu próprio futuro político, irremediavelmente atado ao resultado de sua gestão na economia. As lições das experiências do passado foram bem aproveitadas, especialmente porque colaboravam com Fernando Henrique dois economistas -Pérsio Arida e André Lara Resende - que dez anos antes haviam esboçado uma estratégia antiinflacionária original, baseada na coexistência temporária de duas moedas e que, além disso, viveram por dentro a tentativa do Plano Cruzado. Quatro outras condições foram essenciais para o sucesso do Plano a curto prazo. Duas, "endógenas": a fundação, logo no início da gestão de Fernando Henrique na Fazenda, de um padrão de disciplina fiscal (Plano de Ação Imediata) que iria desenvolver-se e permanecer até hoje e a nomeação de Rubens Ricupero para o Ministério da Fazenda, quando o titular se desincompatibilizou. Ele manteve o apoio de Itamar ao Plano e contribuiu para ganhar o apoio da opinião pública. Duas outras condições foram "exógenas": a abertura comercial e financeira promovida ao longo do governo Collor e a extraordinária bonança financeira internacional. O Plano Real removeu, na prática, uma nuvem de poeira quente que sufocava o Brasil e o impedia de enxergar seus problemas. Recuperou o amor próprio, a auto-estima do país. A saúde econômico-social melhorou a curto prazo: forte aumento do consumo básico, redistribuição de renda, maior previsibilidade para a vida das pessoas. Os problemas, por certo, existem, tanto na estrutura e no funcionamento da economia quanto nas amarras constitucionais, na condução da política econômica ou na política social. Mas não são "problemas do real". Este já fez a sua parte. Resta agora que façamos a nossa, no Brasil real. Texto Anterior: O risinho do dr. Silvana Próximo Texto: 1º de julho: a nação tem pressa Índice |
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