São Paulo, quarta-feira, 2 de julho de 1997
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Alban Berg exibe sua quase perfeição

MARCELO MUSA CAVALLARI
DA REDAÇÃO

Os quatro músicos do Quarteto Alban Berg fazem de hoje a sexta três das mais importantes apresentações de música erudita do ano na cidade. O conjunto interpreta quatro peças de Franz Schubert e duas de Alban Berg.
É óbvio que um quarteto tem quatro músicos. Mas, no caso do Alban Berg, ressaltar isso expressa algo da essência do grupo. Algo que o torna um dos melhores conjuntos de câmara do mundo.
Formado por Günter Pichler (primeiro violino), Gerhard Schulz (segundo violino), Thomas Kakuska (viola) e Valentim Erben (violoncelo), o Alban Berg tem quatro músicos completos, de personalidades musicais diferentes, tocando juntos.
Mas não são quatro solistas tentando conter suas individualidades, ou esmagar as demais.
Cada um dos instrumentistas do Alban Berg se aproxima das peças com sua própria compreensão de sua parte e da composição.
Isso os torna intérpretes próximos da perfeição.
Sem ser, estritamente falando, uma forma de composição, o quarteto de cordas é, no entanto, muito mais que uma formação instrumental.
Unindo instrumentos da família musical com maior homogeneidade de timbre, o quarteto de cordas não se presta à exploração de coloridos instrumentais.
As possibilidades de quatro partes independentes com grande extensão combinada à homogeneidade faz do quarteto de cordas um veículo excelente para elucubração musical.
Não é à toa que os quartetos de Mozart, por exemplo, são as peças mais cerebrais do compositor.
Também não é à toa que um compositor intelectualista como Beethoven ergueu o monumento que são seus quartetos de cordas.
Sem falar de Haydn, o iluminista, que é o inventor do quarteto.
O Alban Berg tem todos esses compositores em seu repertório e é uma pena que não mostre algo deles no Brasil. Ou de outros contemporâneos, além de Alban Berg.
O repertório que o grupo apresenta em São Paulo fez parte da longa excursão realizada no ano passado para festejar os 25 anos da fundação do Alban Berg. A efeméride coincidiu com a bicentenário do nascimento de Schubert.
A capacidade de inventar melodias do romântico Schubert quase ofusca suas composições. Os quartetos são excelentes para ouvir mais de Schubert nele mesmo.
Ao piano, executado por um único instrumentista, Schubert pode facilmente sucumbir ao sentimentalismo do intérprete. No quarteto isso é mais difícil.
Com o Alban Berg, é impossível. Pichler, o responsável pelo primeiro violino -mais suscetível à tentação de exagerar na "expressividade"-, é o mais frio e intelectual dos membros do Alban Berg.
Mas frieza e rigor intelectual não significam monotonia. O conjunto obtém intensidades e uma certa ferocidade, até, raras em Schubert, mais comumente interpretado melancolicamente.
O quarteto D. 810, "A Morte e a Donzela", que será tocado amanhã e sexta, é um exemplo ótimo disso. Na peça, o próprio Schubert revê, no segundo movimento, um de seus "lieder" (canções) mais obviamente melancólicos.
O tratamento, em forma de variações, dado à melodia do "lied", é uma forma quase irônica de Schubert falar dele mesmo.
Compor variações em torno da "pura expressão do sentimento de dor" -como já se disse sobre esse "lied"- é quase perverso.
A "Suíte Lírica" de Alban Berg é um ponto de honra do quarteto. O compositor -aluno e amigo de Arnold Schoenberg e companheiro de Anton Webern, formando com eles trinca da Segunda Escola de Viena- tomou para si tarefa de emprestar lirismo à experiência dodecafônica.
Lirismo em sentido quase técnico: o de figurar uma interioridade, como quem cantasse. Suas peças se afastam do rigor interno das composições de Webern assim como do expressionismo do mestre Schoenberg.

Concerto: Quarteto Alban Berg
Onde: teatro Cultura Artística (r. Nestor Pestana, 196, tel. 258-3616)
Quando: de hoje a sexta, às 21h
Quanto: de R$ 30 a R$ 60

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