São Paulo, sexta-feira, 4 de julho de 1997
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País deve investir em educação, diz Thurow

SILVANA QUAGLIO
DA REPORTAGEM LOCAL

Economista norte-americano não vê esforço do Brasil em ampliar acesso ao ensino do segundo grau

A globalização está minando o poder regulamentador dos países. As fronteiras econômicas são elásticas e, se um empresário não concorda com alguma coisa em um país, simplesmente vai para outro.
Esses são pontos básicos que marcam a transformação da economia no final deste século, segundo o economista norte-americano Lester Thurow, professor do MIT (Massachusetts Institute of Technology).
Segundo Thurow, a principal tarefa dos governos, agora, é investir na educação e treinamento da população, e na infra-estrutura de seus países. "Governos não poderão proteger seus países e populações da competição do mercado global", afirma. Thurow disse que não vê nenhum esforço do Brasil no campo educacional, por exemplo.
O economista esteve anteontem em São Paulo para falar sobre o futuro do capitalismo -tema de seu livro mais recente- na conferência internacional organizada pela CNT (Confederação Nacional do Transporte), cujo objetivo é discutir "O Brasil que Queremos".
Veja a seguir os principais trechos da entrevista de Thurow à Folha:
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Folha - O sr. acha que os desafios, neste final de século, são os mesmos para países desenvolvidos e subdesenvolvidos?
Lester Thurow - As forças fundamentais que agem sobre a economia global afetam a todos. É só olhar para a indústria calçadista do Sul do Brasil e do Norte da Argentina para ver que muitos fabricantes estão mudando para a China. Lá é possível contratar trabalhadores bem formados, pagando salários menores. O efeito disso não será tão dramático sobre o Brasil como em países desenvolvidos, mas a China certamente pressionará os salários para baixo. Na China é possível contratar alguém com segundo grau completo por US$ 35 por mês, para trabalhar 11 horas por dia, 29 dias por mês.
Folha - O sr. diz que essa nova fase do capitalismo pode provocar a estagnação da economia...
Thurow - A economia mundial está crescendo mais devagar nos anos 90 do que nos anos 80, assim como cresceu mais devagar nos anos 70 dos que nos 60. Isso torna mais difícil o progresso dos países em desenvolvimento e que eles alcancem o estágio de desenvolvimento do mundo desenvolvido.
Folha - O que o Brasil deveria fazer?
Thurow - Deveria, por exemplo, melhorar muito o sistema educacional. Não tanto a universidade, mas o segundo grau, que deveria atender a uma parcela muito maior da população. Caso contrário, os trabalhadores receberão salários equivalentes aos da Índia, não importa se vivem no Brasil ou nos Estados Unidos. Essa é a realidade do mundo globalizado.
Folha - E com relação a investimentos?
Thurow - Em comparação com os "tigres asiáticos", nenhum país da América Latina investe o suficiente. Enquanto na América Latina os países investem algo entre 20% e 25% do PIB (Produto Interno Bruto), no Leste asiático eles investem entre 35% e 50% do PIB. Eles também preferiram escolher uma ou duas áreas nas quais podem competir com o mundo desenvolvido.
Folha - O sr. acha que o Brasil atrairá mais investimentos estrangeiros em função da globalização?
Thurow - Se o país for bem administrado, dinheiro de fora não é tão necessário. É possível financiar investimentos com poupança interna. Estrangeiros são necessários para transferir tecnologia. O único jeito da tecnologia vir para o país é se os investidores puderem produzir no país e vender seus produtos. É isso que o país deve buscar.
Folha - Como a globalização econômica afeta o capitalismo?
Thurow - De várias formas. Se olharmos para os EUA, por exemplo, um terço dos trabalhadores estão se adaptando e enriquecendo. Mas os outros dois terços não estão acompanhando o processo e a globalização os está empobrecendo. Da mesma forma, alguns países na África estão sucumbindo rapidamente, sem perspectiva de melhorar. Mas há um grupo de países na ásia correndo para alcançar o mundo desenvolvido.
Folha - Na América Latina não?
Thurow - Há países como o Brasil, que cresceu muito por dez anos (de 1968 a 1978) e, aí, tudo desaba e os ganhos se perdem. Muitos apontam o Chile como exemplo, porque teve ótimo desempenho nos últimos 15 anos. Mas nos 15 anos anteriores foi um desastre. Assim, o resultado dos últimos 30 anos não é tão bom. Os EUA levaram 120 anos para alcançar o Reino Unido. O Japão vem correndo atrás dos EUA há 130 anos e ainda não alcançou. Um bom desempenho econômico não pode ser medido em dez anos. São necessários cem anos de consistência.
Folha - O sr. diria que o Brasil está no caminho certo?
Thurow - Ainda há muito a fazer. É preciso ter um bom grau de macroestabilidade, na qual o Brasil fez um bom progresso. Mas é preciso ter um mercado competitivo estabelecido. Nisso, o Brasil tem falado muito e feito pouco. E, por fim, é preciso investir na bases do sistema, principalmente educação. E eu não acho que o Brasil tenha feito qualquer esforço nesse sentido.

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