São Paulo, domingo, 6 de julho de 1997
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Profissionais da ética decidem sobre eutanásia

DA "NEW REPUBLIC"

Jonathan Moreno gostava de seu trabalho de monitor de conferências sobre filosofia na Universidade George Washington.
Mas, depois de passar dez anos explicando aos alunos as sutilezas das obrigações morais, o jovem universitário se cansou. "Havia um abismo entre a filosofia, como é ensinada na escola, e os assuntos reais da vida."
Moreno encontrou a salvação no hospital Suny, no bairro do Brooklyn, onde se tornou conhecido como o "sr. Ética". Hoje passa a maior parte do dia na UTI do hospital, aconselhando médicos e conselheiros de genética e ajudando os pacientes mais graves com apoio moral.
Praticante de uma nova disciplina médica conhecida como "ética clínica", Moreno juntou-se ao grupo cada vez maior de universitários que optam por trabalhar ao lado de doentes. Para os defensores dessa especialidade, as decisões morais relativas aos cuidados médicos são complexas e delicadas demais para serem tomadas pelos próprios médicos.
Armados com técnicas de "prevenção de problemas de ordem ética, antes que se manifestem" (palavras usadas num folheto publicitário), os filósofos especializados em ética querem desempenhar um papel comparável àquele exercido pela religião em épocas anteriores.
Mas existe uma diferença fundamental entre as duas disciplinas. Os ministros da fé consideravam que sua missão se limitava às questões não-médicas: salvar almas, reconfortar os moribundos. Já os especialistas em ética clínica se consideram habilitados a decidir questões tanto médicas quanto morais. Segundo eles, sua opinião sobre uma questão de ordem moral tem tanto peso quanto a de um cirurgião especializado. "Se você é cirurgião e seu paciente de repente tiver um problema no pé, você terá que pedir conselhos a um podólogo", explica Thomas May, o "sr. Ética" do Centro Médico Memorial de Springfield, Illinois.
Mais do que simples conselheiros, esses filósofos se consideram especialistas capazes de avaliar e decidir o que convém fazer ou não em matéria de vida ou morte. Eles estudam os dados empíricos, analisam os relatórios de riscos e benefícios e produzem "grades de análise de casos".
"Para a maior parte dos pacientes e de suas famílias, é simplesmente impossível compreender a natureza complexa dos julgamentos morais com os quais se vêem confrontados", comenta Nancy Dubler, especializada em ética e autora de um livro sobre essa nova profissão, "Ethics on Call".
Mas há uma confusão que afeta o trabalho dos especialistas em ética. Por exemplo, frequentemente pede-se sua opinião quando é preciso decidir se se deixa um paciente morrer ou não. É o tipo de decisão que esses profissionais se consideram habilitados a tomar, em virtude da extensão de seus conhecimentos.
Quando sua opinião vai contra os desejos do paciente e de sua família, eles tendem, naturalmente, a confiar em sua própria avaliação do caso. Afinal, os especialistas são eles.
Um outro problema gerado pelo acréscimo de uma profissão no universo dos hospitais é que isso muitas vezes, em lugar de simplificar as decisões, as complica. A profissionalização dessa disciplina tende a aumentar a burocracia, introduzindo um novo intermediário entre o paciente e o médico.
Este último, que se esforça para resolver um problema concreto e avaliar o tratamento apropriado, se vê arrastado por análises wittgensteinianas e impasses kafkianos.
Resta o problema de saber para que serve realmente o trabalho dos especialistas e ética. Alguns diretores de hospitais foram acusados de recorrer aos serviços de filósofos para ocultar medidas de economia por trás de rótulos sábios ou princípios elevados.

Tradução de Clara Allain

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