São Paulo, domingo, 6 de julho de 1997
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Festejos de São João

OSIRIS LOPES FILHO

São João, nestes idos de junho de 1997, é uma santidade em alta na aldeia política federal. Em sua homenagem acendem-se, por todo o país, fogueiras, soltam-se balões coloridos, crianças se divertem, jovens iniciam namoros, há doces e batatas cozidas, quermesses, quadrilhas.
Desta vez, São João foi usado na vida política de Brasília. Principalmente na parlamentar. Uso positivo, pois os parlamentares alegaram a necessidade de dar as caras nas suas bases eleitorais, para ouvir o povo, nos grotões do país.
Consideram os parlamentares que o tempo de visita à sua gente é o ideal. Clima festivo, o povo não vai falar nos seus problemas: salário mínimo, desemprego, falências e concordatas, juros elevados, arrocho salarial do governo, endemias retornando por falta de vacinação, filas e péssimo atendimento nos hospitais, enfim, as misérias que têm se agravado nos últimos tempos.
Deu-se um recesso parlamentar em junho, não oficial, para os congressistas voltarem às bases. Em compensação, fez-se uma convocação extraordinária do Congresso para julho, o que vai melhorar as finanças dos parlamentares, com gorda ajuda de custo. Benesses de São João.
Há ainda balões juninos no ar. O mais soberbo, gigantesco, inflado por seu próprio ego, é o do presidente FHC. É um balão original, colorido com estatísticas otimistas, produzindo o milagre de mostrar que tudo vai bem, na realidade virtual manipulada.
Ao iniciar a subida de seu balão, o presidente FHC viu, iluminados pelas fogueiras, os caipiras dançando quadrilhas, alegres. Ficou feliz, diante da confirmação de sua observação feita nas terras lusitanas, ao dizer que o brasileiro era caipira. Achou delicioso vê-los dançando a caráter.
Mais subia o balão, maiores eram a felicidade e o contentamento presidenciais. Lá de cima, não via os dramas, os assaltos, as greves, os desastres, as aflições que compõem o dia-a-dia do povo brasileiro. Tudo era azul.
A miséria perde dimensão vista das alturas, migalha imperceptível, a quem ganhou, no preço estabelecido pelo mercado, a oportunidade, que busca transformar em certeza, de perpetuação no poder.
Tamanho é o ego que vai inflando o balão que pode acontecer, ganhar a estratosfera, entrando em órbita, perpetuando-se nas alturas siderais. Sobe, sobe balão, leva seu passageiro, para o encontro com seu destino de grandeza, nos espaços celestiais.

Osiris de Azevedo Lopes Filho, 57, advogado, é professor de Direito Tributário da Universidade de Brasília e ex-secretário da Receita Federal.

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