São Paulo, quarta-feira, 9 de julho de 1997
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Cinema argentino cai na pancadaria

FERNANDO GODINHO
DE BUENOS AIRES

O cinema argentino partiu para a violência. Para atrair um público cada vez mais ávido por pancadarias, explosões e tiroteios, os atuais realizadores do país abandonaram a tradição intimista dos últimos anos e optaram por roteiros ideais para atores como Mel Gibson, Steven Seagal, Bruce Willis ou Sylvester Stallone.
A fórmula está dando certo. Lançados no mês passado, "Comodines" (Curingas) e "A Fúria" já atraíram juntos quase 1,4 milhão de espectadores (687 mil e 700 mil, respectivamente) -de acordo com números referentes ao último domingo.
"Comodines" é a história de dois tiras de Buenos Aires envolvidos na luta contra o narcotráfico.
Entre explosões e corpos baleados em câmera lenta, eles também enfrentam policiais corruptos envolvidos com os traficantes.
No longa "A Fúria", o filho de um juiz vai parar em uma prisão barra-pesada sob a falsa acusação de tráfico de drogas.
Seu pai descobre a armação e faz de tudo para salvar o rapaz, que chega a ser violentado pelos seus colegas de cárcere.
Mesmo com o pouco tempo de exibição, os dois filmes deixaram para trás sucessos de bilheteria como "O Paciente Inglês", de Anthony Minghella, "O Quinto Elemento", de Luc Besson, e "O Mundo Perdido", continuação de "Parque dos Dinossauros" dirigida por Steven Spielberg.
No primeiro semestre de 1997, os dois conseguiram a façanha inédita de colocar títulos nacionais entre os cinco mais vistos pelo público argentino -segundo números levantados pelo jornal "Clarín", de Buenos Aires.
Os longas "Comodines" e "A Fúria" têm outras coisas em comum: ambos foram co-produzidos por estúdios de televisão e utilizaram atores já famosos na telinha argentina.
Renascimento
Alguns produtores chegam a falar em renascimento do cinema argentino a partir desses dois filmes.
Os diretores preferem dizer que os estúdios estão oferecendo ao público o modelo policial hollywoodiano falado em espanhol.
"É um roteiro tipicamente americano, mas os personagens são argentinos. Eles caminham por Buenos Aires, e não por uma rua de Nova York", disse à Folha o diretor de "Comodines", Jorge Nisco.
"Podemos falar em renascimento do cinema argentino, pois são filmes que estão atraindo as pessoas. O cinema de autor, mais intimista, sempre esteve muito longe do público", afirmou Luís Alberto Scalella, produtor de "A Fúria".
"Justiça e policiais envolvidos em corrupção fazem parte da realidade argentina. São filmes de ação que ajudam a superar uma certa antipatia do público em relação ao cinema argentino", declarou o diretor de "A Fúria", Juan Buatista Stagnaro.
Nisco e Stagnaro acreditam que seus filmes não representam um renascimento do cinema argentino, pois o sucesso experimentado por eles precisa ser repetido nos próximos dois ou três anos por outros filmes, que tratem de outros temas.
"Temos que seguir fazendo filmes, e o público tem que continuar nos apoiando. Só assim poderemos falar de um renascimento do cinema em nosso país", resume o diretor de "Comodines".
"A idéia foi romper um pouco com o tradicional modelo dos filmes argentinos", continua Jorge Nisco, que não acredita na expressão "cinema de autor".
"Filmes precisam ser bem-feitos, pois não se pode enganar o espectador. O público está cansado de não se divertir", afirma.
"Na década de 60, procuramos imitar o cinema francês, o que acabou afastando as pessoas das salas. O diretor procurava fazer um filme para ele. Eu faço um filme para que o público se divirta."

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