São Paulo, quinta-feira, 10 de julho de 1997
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Kasinski sai da Cofap sob protesto

Desgosto com ex-sócios

FREDERICO VASCONCELOS
DA REPORTAGEM LOCAL

Abraham Kasinski, fundador da Cofap, a maior fabricante de autopeças do país, faz 80 anos amanhã pagando uma promessa que não pretendia cumprir: muito a contragosto, está deixando definitivamente a empresa.
Na verdade, são os novos controladores que estão deixando Kasinski. Ele vendeu sua participação acionária (11% das ações com direito a voto) ao grupo alemão Mahle, por US$ 25 milhões, mas imaginava continuar, de alguma forma, na companhia.
Kasinski se afasta da Cofap sem saber qual será o futuro da empresa, agora controlada pela italiana Magneti Marelli, do grupo Fiat, que adquiriu 40% das ações de Leon e Nelson, sobrinhos de Abraham, e 30% das ações do Bradesco (que ainda detém 10% do capital).
"Queria sair como Pelé"
Kasinski imaginava continuar participando dos projetos de expansão da Cofap nos Estados Unidos e na Argentina, o que vinha tocando pessoalmente. Ele guarda ressentimentos em relação a seus ex-sócios mais recentes, o Bradesco e a Mahle.
"Eu queria sair como o Pelé", confessa. "Não queria uma estátua, mas pelo menos sair com respeito. E é o que está faltando", diz.
Ele diz que o Bradesco tinha a opção de compra da Metal Leve e o convidou, em 1996, para comprarem juntos a empresa de José Mindlin. Kasinski diz que tinha que procurar a Mahle, na Alemanha, com a qual já vinha conversando para fazer uma holding.
Ele diz que, depois, não foi cumprido o acordo que lhe garantia dirigir a Metal Leve e presidir o Conselho de Administração da Cofap durante cinco anos.
O rompimento deixou no espaço a idéia acalentada por Kasinski de formar uma megaholding internacional, reunindo as fábricas de pistões da Cofap e da Mahle.
Novos tempos
A Cofap passará por um processo de auditoria, de 45 a 60 dias, para conferência dos números pelos compradores. Para dirigir interinamente a empresa nesse período, o nome mais cotado é o de Nelson Higino, diretor do Bradesco.
A saída de Kasinski, num certo sentido, reproduz o que aconteceu há um ano na Metal Leve, de José Mindlin. No novo cenário da indústria automobilística, marcado pela agressiva internacionalização do setor, não há mais espaço para a figura forte do dono da empresa à frente do negócio.
A diferença é que Mindlin, uma personalidade mais afável, já havia se afastado da direção executiva da companhia, e sua maior paixão sempre foram os livros e sua biblioteca. Kasinski, de temperamento difícil e acostumado ao comando, é um apaixonado pelo que faz -fabricar e vender peças-, e agora não sabe o que vai fazer.
"Honestamente, eu confesso que não sei o que vai acontecer comigo. Eu tenho a impressão que vai ser muito triste. Não estou habituado a ficar parado", diz.
Kasinski voltou a frequentar a Fiesp e vai ocupar um escritório, num imóvel da Cofap, no Pacaembu. Ele continuará dirigindo a fundação que mantém, entre outros projetos, uma escola, um hospital e um centro tecnológico.
"Com minha idade, não tenho medo: 80 anos não é brincadeira, mas com todo trabalho que fiz na minha vida, eu deveria ter a aparência de 120", comenta sorrindo.
"Modéstia à parte, não preciso trabalhar para garantir o futuro. Eu vou receber um patrimônio que dá pra viver o resto da vida sem baixar o padrão."
Kasinski recebeu a Folha na última segunda-feira à tarde, na sala do Conselho de Administração, na sede da empresa, em Santo André.
Durante 4 horas, ele temperou desabafos com a narração de episódios que confirmam sua imagem de empresário muito vivo, com incrível capacidade de descobrir novas estratégias de vendas e formas de ganhar dinheiro.
Divergências insuperáveis
Kasinski já havia criado antes a mesma expectativa de afastamento da Cofap, quando fixara 11 de julho de 1992 como o dia propício para pendurar as chuteiras, ao completar 75 anos de idade. O que não aconteceu.
Naquela ocasião, eram os filhos que queriam Abraham fora da empresa, em meio a uma disputa que dificultava os negócios da Cofap.
As brigas familiares envolvendo sucessão nas empresas costumam ser resolvidas na Justiça. No caso dos Kasinski, as pendências com os filhos foram encerradas na alta cúpula de um banco privado.
Foi quando o Bradesco concordou em participar de uma "operação de salvamento" da Cofap, há um ano, com a recompra das ações de Roberto e Renato, filhos de Abraham (aos quais ele havia doado 51% das ações da empresa, mas não o usufruto). O banco, contudo, exigiu que todas as ações estivessem livres de embaraços judiciais.
Com a nova composição, os sobrinhos Leon e Nelson haviam ficado com participação igual à do Bradesco. A idéia acertada foi que as decisões seriam sempre tomadas por maioria simples.
Mas novas divergências entre os Kasinski -agora, envolvendo o fundador e os dois sobrinhos- voltaram a entravar a vida da empresa.
Sem dívida
O Bradesco, segundo Kasinski, passou a exigir que todas as decisões fossem tomadas por unanimidade. "Meus sobrinhos, que vendiam uma paixão desenfreada por mim, sempre votavam contra", reclama Kasinski.
Apesar da discórdia, Kasinski diz que está deixando para os novos donos uma empresa US$ 700 milhões em caixa, "sem dever um centavo a ninguém".

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