São Paulo, quinta-feira, 10 de julho de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Empresário começou vendendo gasolina

FREDERICO VASCONCELOS
DA REPORTAGEM LOCAL

Abraham Kasinski não seguiu o exemplo do pai, Leon, que, para evitar brigas na família, montou uma loja para cada filho. Mas aprendeu com o pai as artes e as manhas do mundo dos negócios.
Leon, um imigrante russo, vendia enxovais de casamento, em lombo de burro, para fazendeiros no interior de São Paulo.
Em 1924, Leon instalou um misto de revendedora de peças de automóvel e posto de gasolina, na avenida Celso Garcia, no Brás. Era a Auto Três Leões (cada um dos dois filhos que trabalhavam com ele, Bernardo e Simão, era chamado de "leãozinho").
Abraham morava nos fundos da loja, estudava à noite e queria ser médico. Ele reforçava os ganhos projetando filmes em casa, cobrando a entrada, ou fabricando patinetes com rolamentos usados.
Aos 10 anos de idade, aprendeu a "restaurar" pneus usados, à noite: com um soldador e uma gilete, aprofundava os sulcos do pneu, para dar a impressão de um produto menos gasto.
Preços elásticos
Muito antes de os postos de gasolina aceitarem cheques pré-datados, a Três Leões já oferecia desconto para atrair os ricos clientes do bairro de Higienópolis que passavam pelo Brás em direção ao Rio de Janeiro, onde o posto mais próximo ficava em Barra Mansa.
Abraham tinha a função de comprar latas de azeite vazias, de 20 litros, as quais enchia de gasolina e vendia aos clientes. "Todo mundo pagava como se fossem 20 litros, mas a lata, de 5 galões, tinha, na verdade, 18,9 litros", diz, rindo.
A bomba de gasolina, movida a manivela, ficava dentro da loja, com uma mangueira de quase cinco metros para chegar até o carro, na rua. Leon ensinou a Abraham como abastecer o carro de forma que sempre ficasse gasolina na mangueira. A sobra era colocada depois numa lata, para venda. Sem saber, o freguês deixava dinheiro a mais, na lata ou na mangueira.
Como havia poucos importadores de peças para automóveis, os preços variavam, literalmente, de acordo com a cara do freguês. "Se ele chegava pálido, é porque não encontrara a peça em outra loja, então cobrávamos mais. Se ele entrava sorridente, baixávamos o preço".
Mas a loja não era o destino de Abraham, que nunca gostou de "esfregar barriga no balcão", como diz. "Eu tinha mania de grandeza, mania besta. Sonhava ter um automóvel de corrida", diz.
Tino comercial
O pai de Abraham morreu em 1941. De 1945 a 1950, Abraham viveu mais tempo nos Estados Unidos que no Brasil. Em 1950, pressentiu que o negócio da importação iria sofrer a concorrência dos produtos nacionais. "Nós vamos morrer como grande importadores. Só tem uma solução, vamos fabricar", disse ao irmão, Bernardo. E anunciou: "Vou fazer uma fábrica".
Abraham mandou aos Estados Unidos o engenheiro Maurício Grinberg. O diretor de uma grande fábrica ofereceu a licença para produzir a peça que mais se vendia no país, anel de segmento. "O americano tinha me dito que iria custar 100 mil dólares. Grinberg, depois de seis meses, voltou dizendo que custaria 1 milhão."
"Deixa comigo, peito e caneta Parker eu tenho. A gente assina os papagaios e empurra com a barriga", disse Bernardo. Anos depois, Kasinski faria uma fábrica em Portugal, de US$ 100 milhões, só com fundos da União Européia. "Não entramos com nada, só com o peito e a caneta Parker", repetiu.
As máquinas foram importadas e dadas como garantia ao Banco Nacional da Cidade de São Paulo. A Cofap começou a operar em setembro de 1953, em Santo André, num terreno da fábrica de corantes Guarany. As despesas de viagens e instalações foram pagas com três meses de produção.
"Ninguém queria comprar produto nacional. Então, eu comecei a correr o Brasil, cidade por cidade", diz Kasinski. A solução foi catequizar o mecânico, para que ele dissesse aos clientes que o produto da Cofap era bom. Os distribuidores começaram a receber pedidos dos produtos Cofap.
Criada na época, funciona ainda hoje a mesma campanha em 60 mil pontos de consumo. É a coleta de caixas de peças da Cofap, guardadas pelos distribuidores e trocadas por bonés, sacolas, jaquetas e macacões com a marca Cofap.
As caixas, marcadas por dentro, permitem mapear o mercado e identificar peças que são exportadas e reintroduzidas no Brasil via contrabando.
(FV)

Texto Anterior: Kasinski sai da Cofap sob protesto
Próximo Texto: Construção de loja é um erro admitido
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.