São Paulo, quinta-feira, 10 de julho de 1997
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Músico dos Balcãs agrada em Montreux

PAULO VIEIRA
ENVIADO ESPECIAL A MONTREUX

O croata Goran Bregovich fez anteontem o que talvez tenha sido o show mais aclamado da 31ª edição do Festival de Montreux até agora.
Tocando no Miles Davis Hall -destinado aos espetáculos "alternativos"-, ele colocou toda a platéia de pé e fez com que os técnicos que entraram ao término do espetáculo para desmontar o palco ganhassem uma vaia tremenda do público.
Rockstar no começo de sua carreira, Bregovich veio mostrar em Montreux a música popular dos Bálcãs -gravada na trilha sonora "Time of the Gypsies" (Polygram).
Para isso, trouxe sua banda cigana: quatro cantoras vestidas a caráter e mais sete músicos -cinco de sopros, entre eles um tubista- e um percussionista que toca bumbo com um prato de ximbau em cima.
Morando entre Paris e Nova York e trabalhando em Belgrado, onde escreve para a orquestra filarmônica local, e ao longo dos Bálcãs, onde passa o tempo pesquisando e gravando a música dos ciganos -em cozinhas ou em salas apertadas de vilas, como disse-, Bregovich ficou mais conhecido no Ocidente por suas trilhas de cinema.
"Embora seja feita na Europa, a música balcânica é menos conhecida no continente que a africana, a asiática ou a caribenha", disse o músico.
"A maior parte dos filmes para os quais produzi é ruim. Estou diminuindo agora minha produção de trilhas. Não estou mais em pânico pelo dinheiro", disse em entrevista exclusiva à Folha, nos camarins, após seu show.
Bregovich já tem nova encomenda para dezembro. Irá compor a trilha para o filme oficial da Tessalônica como capital cultural da Europa. Sua idéia é fazer com que músicos de várias partes dos Bálcãs toquem simultaneamente por meio de links, sem precisarem se deslocar até a cidade.
'Proteção de realidades'
Seu interesse pela música tradicional balcânica vem do que chama de "abordagem eclética" dos ciganos.
"Eles vão recolhendo o que interessa a eles. Se uma melodia espanhola ou um ritmo turco lhes interessam, eles incorporam à sua música. Hoje, vive-se uma época de 'proteção de realidades'.
"Se você rouba uma melodia, você está encrencado. Mas eles vêm fazendo isso há milhares de anos. Música é como a natureza, você pode explorá-la."
Bregovich também elogia a disciplina militar dos ciganos. "Os músicos da minha banda tocam muito, pelo menos três dias por semana, em casamentos ou funerais.
"Também vêm de uma tradição de bandas militares, que se apresentavam durante as guerras balcânicas, geralmente fazendo música para dançar.
"Talvez por trabalharem demais, eles tocam o estritamente necessário, nem mais nem menos. É um tipo de minimalismo que me interessa muito."
Guerra
Filho de pai croata e mãe sérvia e casado com uma muçulmana, Bregovich teve problemas logísticos para manter seus parentes a salvo durante a guerra civil iugoslava. Nem por isso decidiu expressar seu descontentamento na sua obra.
"É uma sina dos Bálcãs. Para um estrangeiro, é fácil ir até lá, tirar fotografias, explorar as imagens da guerra. Para mim, que nasci naquele lugar, trabalho lá, é diferente, sinto-me um tanto desconfortável. A Iugoslávia é um país pobre e pequeno, se os grandes e ricos falam para você fazer guerra, você faz, se falam para parar, você pára. Mas essa não foi a primeira guerra de meu país."

O jornalista Paulo Vieira viajou a convite da Polygram, EMI, Wea e Tag Heuer

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