São Paulo, quinta-feira, 10 de julho de 1997
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Mais vagas e melhores universidades

JOSÉ MARTINS FILHO

Parece indiscutível que, apesar das críticas de que frequentemente é alvo, muitas delas injustas, a malha de universidades que hoje cobre o país é de longe a maior e mais produtiva da América Latina, do ponto de vista científico e acadêmico.
No entanto, é também verdade que nosso contingente de estudantes universitários corresponde apenas à metade do que deveria ser, quando comparado aos de Argentina, Chile ou México, proporcionalmente à população.
A rigor, apenas 1% da população brasileira vem tendo acesso aos bancos universitários, o que é pouco para o esforço de alavancagem que o país imagina para os próximos anos, num cenário de sociedade globalizante cujos salvos-condutos de entrada são sobretudo a qualificação pessoal e a plena posse dos atributos da cidadania.
Diante dessa realidade, duas soluções se apresentam: ou se cede à tentação de aumentar o número de escolas de ensino superior ou se aumenta a cota de vagas nas já existentes.
Independentemente do fato de que possam e devam surgir novas escolas em regiões onde elas se façam necessárias, parece haver boa margem para que as instituições universitárias já existentes -especialmente as públicas- ampliem seu corpo discente sem prejuízo de suas atividades de pesquisa e prestação de serviços.
Seria indesejável e certamente improdutivo que as universidades públicas -responsáveis por 35% do contingente de universitários do país e por 95% da pesquisa e da prestação de serviços- chegassem à proporção professor/aluno das escolas particulares (média de 20 por 1) ou à das comunitárias (15 por 1), mas é bastante razoável que venham a ultrapassar moderadamente o patamar médio atual, de 10 por 1, o que de fato acontece nas melhores universidades internacionais.
É verdade que há questões orçamentárias na raiz das resistências a um programa dessa natureza, já que dificilmente qualquer expansão de vagas teria a contrapartida equivalente dos governos (seja o federal, sejam os estaduais ou municipais) em termos de investimento. Mas também é um fato que muitas universidades públicas -em particular as paulistas- souberam redimensionar sua economia interna e ajustar-se a demandas mais próximas do interesse social.
Nos últimos sete anos, por exemplo, foi possível à Unicamp expandir em 20% o número de vagas em seu vestibular anual, a maior parte das quais no período noturno, em paralelo a um crescimento equivalente dos indicadores de produção científica e de prestação de serviços, acentuadamente na área da saúde.
No calor da discussão, é frequente ouvir ou ler por aí que a universidade pública deve permanecer como está, fazendo ouvidos moucos inclusive à exigência constitucional que manda concentrar um terço das vagas de graduação no período noturno -coisa que raras universidades brasileiras lograram até agora alcançar, mesmo as estaduais paulistas, embora estas estejam próximas disso.
Há mesmo quem ache que, sendo inevitável essa obrigatoriedade, se devam privilegiar pelo menos os cursos de maior demanda, "mandando para o espaço" as licenciaturas, como se fosse possível construir uma sociedade sem professores, ainda que mal pagos.
Claro que opiniões dessa natureza -expressas muitas vezes por pessoas de longa vivência universitária- estão tão longe do interesse público quanto próximas do empedernimento. Servem talvez para enriquecer o debate e jogar luz indireta sobre a verdadeira questão -o compromisso da universidade pública com sua época e com as novas demandas sociais-, mas não é possível que prevaleçam diante do senso de responsabilidade ética e até cívica da universidade.
Permito-me concluir com a informação, porventura pertinente, de que o Conselho da Unicamp votará dentro de alguns dias a inclusão de cinco novos cursos em seu programa de graduação -ciências da terra, arquitetura e urbanismo, mecatrônica e as modalidades noturnas de ciências econômicas e química-, o que elevará a 2.270 o número de vagas para o vestibular de 1998, contra as 1.990 de três anos atrás. Há boas perspectivas de que, até 1999, outras 200 vagas sejam acrescidas, com a introdução de novos cursos e a expansão de outros, já existentes.
Com isso, a Unicamp não só atenderá plenamente a exigência constitucional, mas até a superará. Mais que isso, estará demonstrando que, para além de seu prestígio acadêmico e da expansão de sua folha de serviços, estará também ampliando as possibilidades daqueles que nela querem ingressar. Aliás, com toda justiça.

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