São Paulo, terça-feira, 15 de julho de 1997
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Uma lei que produz riqueza

HENRIQUE WAKSMAN

"Boas são as leis -melhor ainda é o bom uso delas."
Antonio Ferreira (1528-1569), poeta e dramaturgo português.

A maioria dos jornais exibiu-o -alguns no pódio da primeira página- como o maior cheque já emitido no país. De fato, era dinheiro graúdo: R$ 3.199.974.496,00.
Mas não é o porte da cifra o mais importante na história recente da privatização da Companhia Vale do Rio Doce: a força do megacheque que sacramentou a compra da grande estatal brasileira está, principalmente, no que ele simboliza.
Uma das maiores empresas do mundo foi comprada com uma parcela considerável da poupança dos trabalhadores. O dinheiro de quatro fundos de pensões, entre os quais a Fundação Cesp, que tenho a honra de presidir.
Esse é o grande milagre produzido pelos fundos: a criação de uma nova categoria de cidadão -o trabalhador-empresário, acionista de centenas de negócios lucrativos, que geram recursos para o futuro. Criados nos países desenvolvidos, os fundos estão contribuindo para modernizar o capitalismo, socializando-o.
A privatização da Vale veio-me à lembrança por causa de uma outra data: o aniversário de uma lei, a 6.435, que regulamentou a previdência complementar no Brasil, os chamados fundos de pensão.
Hoje, a 6.435 completa 20 anos. Duas décadas em que produziu muita riqueza, não só para a economia do país, mas também, e principalmente, no campo social.
Existem hoje no Brasil mais de 350 fundos, patrocinados por quase 1.700 empresas privadas e estatais, e deles participam cerca de 2 milhões de trabalhadores. Aproximadamente 280 mil já recebem benefícios, aposentadorias dignas. O patrimônio é hoje superior a R$ 70 bilhões, um dinheiro comprometido com o futuro desses milhões de associados.
Em relação ao PIB nacional, a sua participação é de aproximadamente 11%. O seu poder de fogo pode até ser considerado pequeno, se comparado ao de países com maior tradição na área, como os EUA (US$ 4,5 trilhões) e o Reino Unido (US$ 800 bilhões), mas está em alta.
A Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência (Abrapp), entidade que os reúne, calcula que no ano 2020 os fundos brasileiros reunirão US$ 400 bilhões. O desempenho impressiona, principalmente quando se lembra que, em 1977 -o ano em que a lei foi aprovada-, existiam no Brasil apenas quatro fundos, entre eles a Fundação Cesp, que comemorou seu 28º aniversário este ano, e é hoje a 6ª do ranking nacional e a 1ª de São Paulo.
Os anos depois da aprovação da lei foram de bonança, como se vê, mas nem sempre de calmaria. A caminhada dos fundos enfrentou, e enfrenta ainda, uma barreira de preconceitos -e também de insídias. Não era para menos: dinheiro polpudo, olho gordo.
Estigmatizados como "coisa de marajás", "caixa-preta", "ralo de dinheiro público", os fundos foram exaustivamente investigados, inclusive por duas comissões parlamentares de inquérito. Uma do Senado, em 1992, e, no ano passado, outra da Câmara.
Nos dois casos, os relatórios finais não apontaram deslizes e foram aprovados pelo Tribunal de Contas da União. Os plantadores de intrigas tiveram de recolher seus "argumentos".
Mas onde está aplicado hoje o dinheiro dos fundos e por que se tornaram tão importantes para a economia do país?
Uma pesquisa realizada pela Abrapp nos 50 maiores fundos, no final do ano passado, demonstra que apenas uma parte do patrimônio, R$ 7,3 bilhões, aplicada em imóveis, gerou 1,8 milhão de empregos diretos e indiretos. Mais R$ 13,2 bilhões, direcionados para o mercado acionário, criaram 3,3 milhões de novos postos de trabalho.
Agora, 20 anos depois, os fundos delineiam uma nova tendência, investir na infra-estrutura do país, em áreas como a extração mineral, energia elétrica, produção de aço e no sofisticado ramo de informática e telecomunicações. Como é o caso da participação na Companhia Siderúrgica Nacional, a CSN, e também na compra de parte da Companhia Vale do Rio Doce.

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