São Paulo, sexta-feira, 18 de julho de 1997
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O cadastro da terra

RAUL JUNGMANN

O governo Fernando Henrique Cardoso vem desencadeando uma verdadeira "revolução cultural" dentro da reforma agrária brasileira.
São vários os programas criados para agilizá-la, dar-lhe a necessária qualidade e também descentralizá-la, a exemplo do Lumiar (que leva assistência técnica aos assentamentos, o que significa mais qualidade), do Casulo (que envolve os governos estaduais e as prefeituras no processo, descentralizando-o) e do Cédula da Terra (que cria uma parceria com os próprios beneficiários da reforma).
Poderíamos citar, ainda, as mudanças na legislação agrária, como o novo ITR, a participação do Ministério Público nas ações de reintegração de posse, o rito sumário, a medida provisória nº 1.577/97 e o decreto nº 2.250/97. Tudo isso, certamente, significa uma mudança radical de cultura, cujo resultado é a agilização da reforma agrária, com enorme ganho de qualidade.
Agora, com o início do Recadastramento Nacional de Imóveis Rurais, estamos dando mais um passo -e passo importantíssimo- nesse sentido. A partir dele, Ministério Extraordinário de Política Fundiária e Incra terão condições de planejar suas ações baseados em estoques alternativos de terras, que a revisão geral dos cadastros permitirá sejam formados.
Nesse trabalho, iniciado ontem, estamos utilizando tecnologia de ponta: dois sistemas de satélites da Nasa.
Esses satélites -o Navstar/GPS, que facilita sobremaneira a demarcação topográfica dos imóveis e cuja margem de erro é de, no máximo, 40 centímetros, e o Landstar 5, que fornece, por meio de imagens, uma precisa avaliação do uso da terra- permitirão que, nos próximos cinco anos, tenhamos recadastradas 90 mil propriedades rurais classificadas como grandes (mais de 10 mil hectares) -um trabalho que, pelos métodos tradicionais, levaria, provavelmente, mais de 40 anos-, barateando os custos e dando precisão às ações de demarcação topográfica e avaliação de produtividade dos grandes imóveis rurais.
Só entre este ano e o próximo, deveremos atingir 9.100 propriedades, cobrindo 27,382 milhões de hectares. Ou seja, estamos dando uma velocidade muito maior à identificação de reservas de terras desapropriáveis.
Para dar uma idéia do significado do uso dessa tecnologia, basta dizer que, quando utilizada experimentalmente em cinco municípios do Pontal do Paranapanema, em São Paulo, ela permitiu que fossem feitas demarcações de imóveis com 9.000 hectares em apenas um dia. Com o método anterior, isso levava entre 15 e 20 dias.
Para a realização do recadastramento, o Incra investirá R$ 14 milhões e utilizará 810 técnicos, sendo 540 no trabalho de campo e 270 na sua administração.
É de ressaltar, ainda, que essa revisão traz no seu bojo uma inovação: será feita em zonas preferenciais, identificadas, com a colaboração de Estados e municípios, pelas superintendências regionais do Incra.
Dentro de um planejamento estratégico, que visa atingir todos os imóveis rurais de interesse da reforma agrária no país, a escolha dessas zonas preferenciais leva em conta as condições que cada grande propriedade apresenta para a viabilização de assentamentos auto-sustentáveis, os indicadores de concentração fundiária e os eixos intermodais de desenvolvimento local, sem esquecer as justas reivindicações dos movimentos sociais.
Assim sendo, o Recadastramento Nacional de Imóveis tem um significado excepcional para a reforma agrária brasileira. Com ele, o Estado recupera e potencializa sua capacidade de planejamento nessa questão, podendo, pois, antecipar-se àquelas reivindicações.
Se o associarmos à descentralização e aos demais programas criados no sentido da melhoria não só técnica, como humana dos assentamentos, teremos, sem sombra de dúvida, uma reforma agrária democrática, o que significa uma reforma agrária participativa, como a sociedade brasileira espera e quer.

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