São Paulo, segunda-feira, 21 de julho de 1997
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PC subornou agentes da Interpol, diz argentino

LUCAS FIGUEIREDO
ENVIADO ESPECIAL À ARGENTINA E AO URUGUAI

Durante sua fuga em 93, Paulo César Farias ordenou a procuradores de suas contas bancárias que sacassem US$ 1 milhão para subornar agentes da Interpol (polícia internacional) do Brasil e do Uruguai para evitar que fosse preso.
A declaração consta do depoimento de um dos procuradores das contas bancárias de PC, o advogado argentino Luis Felipe Ricca, feito a autoridades italianas em outubro passado, em Buenos Aires, na Argentina.
O dinheiro, segundo ele, saiu de uma conta de PC Farias na Suíça operada pelo próprio Ricca e pelo empresário argentino Jorge Osvaldo La Salvia, apontados pela Polícia Federal do Brasil como testas-de-ferro do empresário alagoano.
A Folha teve acesso ao documento com as declarações de Ricca junto a autoridades da Argentina.
No depoimento, o advogado diz que PC mandou que fosse feito o saque para pagar "US$ 600 mil ao pessoal da Interpol no Brasil; outros US$ 400 mil a seus colegas do Uruguai".
Máfia
A Justiça italiana insistiu quase um ano junto ao Judiciário argentino para que autorizasse a realização do depoimento.
A suspeita é que o dinheiro tenha origem em negócios do tesoureiro do ex-presidente Fernando Collor de Mello com uma rede de mafiosos narcotraficantes, responsáveis pelo maior carregamento de cocaína apreendido até hoje na Europa (5,5 toneladas, em 94).
O dinheiro saiu de uma conta de PC aberta em Genebra, na Suíça, movimentada por uma complexa rede de testas-de-ferro.
O titular da conta era um banco, o Trade Link Bank, sediado nas Ilhas Cayman, paraíso fiscal do Caribe. Apesar de a conta estar em nome de um banco, a movimentação era feita pelos argentinos Ricca e La Salvia por meio de uma procuração.
O tesoureiro de Collor tinha contas em dois bancos na Suíça: o SCS Allience e o Suisse Bank Corporation.
Acordo
Ricca contou os episódios dos saques -de US$ 5 milhões para comprar votos de deputados para deter o impeachment de Collor em 92, revelado ontem pela Folha, e de US$ 1 milhão para subornar agentes da Interpol- depois de fazer acordo com a Justiça italiana.
Pelo trato, o argentino passou a ser uma testemunha informal no processo -livrando-se de ser indiciado como réu-, obtendo assim uma espécie de perdão.
O dinheiro para comprar o voto de deputados foi sacado, em "cash", de uma conta na agência do Hollandsh Bank Unie em Montevidéu, no dia 28 de setembro de 92, um dia antes da votação de abertura do processo de impeachment de Collor na Câmara.
A suspeita é que o dinheiro também tenha sido obtido por PC em negócios com a máfia.
"(A) finalidade (do saque), segundo me disse o doutor Farias, (era) pagar os votos de deputados que iriam votar o julgamento político e fazer com que a votação não fosse contrária a Collor de Mello", disse Ricca no depoimento dado à Justiça italiana.
Em Montevidéu, a Folha efetuou um depósito de US$ 50 nessa conta -registrada sob o código Monte Tiberino e o número 5020050- comprovando que ela ainda está sendo movimentada.
Aluguel de avião
O dinheiro sacado na Suíça tinha o objetivo de facilitar a saída do empresário alagoano de Montevidéu, no Uruguai, onde ele havia se escondido depois de percorrer o interior do país e passar pelo Paraguai e pela Argentina.
Segundo Ricca, o dinheiro foi utilizado para efetuar quatro pagamentos distintos relacionados à retirada do empresário alagoano de Montevidéu para Londres, na Inglaterra, e seu deslocamento até Bancoc, na Tailândia.
O dinheiro foi gasto da seguinte forma, de acordo com o argentino:
1) US$ 1 milhão para subornar agentes da Interpol do Brasil e do Uruguai;
2) "Outra soma que eu não conheço permitiu o aluguel de um avião privado com capacidade suficiente para efetuar um vôo transoceânico, o qual saiu dos Estados Unidos chegou a Montevidéu e transportou Farias a Londres";
3) "Pagamento de honorários de advogados";
4) "Transporte de Farias de Londres para Bancoc, na Tailândia, onde esse foi preso e extraditado para o Brasil".

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