São Paulo, quarta-feira, 23 de julho de 1997
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Pornografia infantil é pretexto para abuso

MARIA ERCILIA
DO UNIVERSO ONLINE

Pornografia infantil é negócio sério, feio e indefensável. Mas não é justificativa para abusos como o que foi cometido na semana passada contra um provedor de acesso à Internet na Bahia.
A CPUnet teve literalmente os cabos arrancados da parede, por ordem do Juizado de Menores de Salvador. A causa era uma página de usuário, que incluía fotos eróticas de crianças.
O provedor pagou o pato, mas não tinha nem responsabilidade nem conhecimento da página do usuário Sandro Nascimento, que já confessou a autoria.
Essa é uma daquelas zonas nebulosas da Internet -mas não devia ser. Se um fulano aluga espaço num provedor e coloca seja lá o que for, o provedor está só entrando com a parede para pichar, ou com o papel para escrever. O responsável é o autor do conteúdo, ponto.
Ou, como compara Sílvio Meira, representante dos usuários no Comitê Gestor da Internet, "é a mesma coisa que proibir tinta na época da ditadura".
Este foi apenas um primeiro episódio. Leitores me informam que em servidores de IRC (bate-papo) brasileiros é muito simples e rápido conseguir imagens bem pesadas de pornografia, em todas as idades e variações.
Atitudes como a do Juizado de Menores de Salvador têm um preço. Carlos Eduardo Costa, representante da CPUnet, empresa que já foi totalmente inocentada, afirma que o provedor perdeu mais de 50 usuários e sua imagem sofreu danos.
"Além disso, do jeito que a coisa foi feita, puxando cabo da parede, ficamos com uma série de problemas no equipamento", afirma ele.
A CPUnet colocou uma página de esclarecimento sobre o caso no endereço www.cpunet.com.br.
Será que a solução é criar mais leis? Sílvio Meira acha que não: "Já tem lei demais no Brasil. Elas precisam é ser cumpridas".
"Há uma pressão grande sobre o Comitê para legislar sobre a Internet, mas eu acho desnecessário. As leis estão aí. Pornografia infantil é crime, terrorismo é crime. Não precisamos de leis novas", assinala Meira.
As leis existem, mas a confusão na aplicação delas reina. Só não é maior porque ainda não ocorreram incidentes mais sérios.
Para complicar mais, sempre que se fala em legislar sobre a Internet, trata-se a rede como se fosse uma coisa só.
Minha impressão é que todo mundo sairia ganhando se fosse feita uma distinção entre comunicação privada e pública nos casos que beiram a censura.
A liberdade deveria ser bem maior no correio eletrônico, que é particular e só diz respeito aos envolvidos.
E muitos defensores da "liberdade" na Internet deviam parar de gritar "censura! censura" quando se fala em minimamente cumprir a lei na rede. A Internet não é um mundo à parte.
Dia desses, por exemplo, uma pessoa declarava que não se devia proibir pornografia infantil, porque "hoje é pornografia, amanhã podem proibir outras coisas". Ora...

E-mail: netvox@uol.com.br

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