São Paulo, sexta-feira, 25 de julho de 1997
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Condenado foi o Senado

LUÍS NASSIF

No início dos anos 50, num arroubo gauchesco, o deputado Flores da Cunha tomou a palavra e lançou o slogan: "No Rio Grande do Sul só tem macho". O deputado mineiro Último de Carvalho, com seu jeito de mineirinho quieto, solicitou um aparte: "Senhor deputado, em Minas é metade macho, metade fêmea, e estamos muito satisfeitos com a situação".
As modificações no relatório da CPI dos Precatórios produziram o adultério de um só. Tem o adúltero, mas não tem a adúltera.
Não teve prefeito que criou a tecnologia dos precatórios, nem governador que a encomendou, nem instituição financeira que comprou o papel.
Lucros e prejuízos foram fabricados por uma única instituição, que emitiu precatórios sem pedir autorização para governadores e vendeu sem aguardar a proposta dos compradores.
Enfim, os senadores quiseram restaurar por decreto a virgindade do meio político, depois que toda a opinião pública já tinha assistido bolsinhas sendo rodadas na rua.
Tentou-se retornar à versão da meia pizza do início da CPI -que quase pegou graças ao amadorismo da cobertura inicial- depois que a opinião pública já tinha tomado conhecimento de uma realidade muito mais ampla e malcheirosa.
Objetivamente, qual o resultado prático de um relatório oficial da CPI? Apenas o político. Na parte penal, o Ministério Público pode agir em cima das provas levantadas, sem depender das conclusões assinadas por meia dúzia de pândegos, que não honram a casa para a qual foram eleitos.
O relatório teria de ser questionado em cima de seus aspectos técnicos. Se acusou sem provas, se fez ilações indevidas, se exorbitou nas conclusões -apenas por aí.
Os governadores acusados não se tornaram um milímetro mais inocentes com a armação planejada. O prefeito acusado não foi absolvido das suspeitas. Pelo contrário, apenas reforçou-se a suspeita de que, naquela casa augusta, tudo termina em pizza.
Ao tentar desautorizar o relatório Requião, o que esses senadores fizeram foi consagrá-lo. E condenar o Senado ao fogo do ceticismo que o consome há anos.

E-mail: lnassif@uol.com.br

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