São Paulo, sexta-feira, 25 de julho de 1997
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Funk carioca conquista o Brasil

LUIZ ANTÔNIO RYFF
DA REPORTAGEM LOCAL

Confinado durante quase três décadas nos subúrbios e favelas do Rio de Janeiro, nos últimos anos o funk carioca começa a ganhar cara e, desde o início do ano, a conquistar o resto do Brasil.
É de uma dupla de funkeiros de São Gonçalo, Claudinho & Buchecha, o maior hit do momento, a música "Conquista", primeiro lugar há algumas semana em São Paulo e carro-chefe de "Claudinho & Buchecha", o disco de estréia da dupla, que já vendeu quase 700 mil cópias -600 mil nos últimos quatro meses.
O bordão que está na boca do povo, "Ah, eu tô maluco!", foi criado no início do ano por um camelô que subiu em um palco durante a apresentação do Movimento Funk Club, um grupo funk no Rio.
A frase foi sampleada e inserida no disco do grupo e começou a fazer sucesso nos bailes. Foi adotada pela torcida do Flamengo, que já havia feito o mesmo com o grito "Uh, tererê", versão para o refrão "Whopp! There It Is", do Tag Team.
E, em um piscar de olhos, o grito era repetido no resto do país, por visitantes de fora, como o mágico David Copperfield, e no exterior, durante a última Copa América, na Bolívia.
Hoje, só de royalties pela utilização comercial da frase, a editora Afegan, que administra a música, recebeu mais de R$ 200 mil. Isso de cinco empresas. Outras tantas estão usando a frase sem autorização e devem ser procuradas em breve. Ou pagam ou serão processadas.
E o tal camelô? Trocou de profissão e nome, abandonando o Jorge Silva da Rocha da carteira de identidade e virou MC Maluco.
Juntou-se ao DJ Pepe e está lançando um disco com variações do tema. Tem "Ah, eu tô maluco!", "Ah, eu sou tarado!" e já pensa em lançar um boneco. "Não sou nuvem passageira. Vou durar e muito", sonha MC Maluco.
Um milhão de funkeiros
No Rio, o fenômeno do funk é coisa antiga. Segundo participantes e estudiosos do movimento, como o DJ Marlboro ou a socióloga Fátima Cecchetto, atualmente ocorrem cerca de 400 a 500 bailes de funk no Rio de Janeiro, com uma frequência de 2.000 pessoas por baile. O que dá 1 milhão de participantes.
Obviamente trata-se de um bom negócio, já que o ingresso para esses bailes oscila entre R$ 5 e R$ 10. Ou seja, os bailes movimentam entre R$ 5 milhões e R$ 10 milhões apenas com a bilheteria. E boa parte desse dinheiro não paga imposto, como reconhecem alguns dos envolvidos.
Alguns conseguem viver do funk. É o caso do DJ Marlboro (leia texto ao lado), que criou uma revista, uma editora, uma gravadora e trabalha com 30 artistas.
"Aquilo foi uma grande armação. Fiz as letras, as músicas e criei os artistas. Mas eu sabia que ficaria bem melhor quando chegasse no morro e começasse a ser feito pelos filhos dos sambistas", reconhece Marlboro, que, no meio do caminho, foi responsável pelo lançamento do Latino.
Nova dupla
Nos últimos anos, o funk está conquistando certa popularidade na classe média. Esse potencial mercadológico foi registrado pela indústria do disco.
A Universal que lançou o CD de Claudinho & Buchecha foi a primeira grande gravadora a perceber o fenômeno funkeiro. Já está apostando em outra dupla, Márcio e Goró. Não é um tiro no escuro. A dupla já tem três sucessos em rádios do Rio.
"Aposto na durabilidade do movimento", afirma Paulo Rosa, presidente da Universal. Mas ele faz uma ressalva: "O próprio mercado vai fazer uma filtragem nos próximos meses. Tem muita gente de valor, e outros que vão ficar pelo caminho".
Ao menos o funk serviu para melhorar a vida de alguns. Claudinho & Buchecha largaram as bancas de camelôs e hoje cobram R$ 10 mil por um show de sete músicas em play-back. E chegam a fazer 12 desses nos finais de semana.
"O funk criou uma perspectiva de vida para as pessoas mais pobres. Antigamente, quem nascia em favela tinha duas possibilidades de subir na vida: ser jogador de futebol ou traficante", avalia Marlboro.

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