São Paulo, sábado, 26 de julho de 1997
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Leon Gast conta como 'engano' virou Oscar

CRISTINA GRILLO
DA SUCURSAL DO RIO

O diretor de cinema norte-americano Leon Gast está reformando o apartamento onde mora em Nova York.
Desde março, o Oscar de melhor documentário que recebeu por "When We Were Kings" -filme sobre a luta de Muhammad Ali e George Foreman no Zaire em 1974- está colocado provisoriamente sobre uma estante.
"Agora estou reconstruindo o apartamento em torno do Oscar, criando um lugar especial para ele", disse Gast em entrevista na quinta-feira à tarde.
O diretor, que está no Rio para mostrar "When We Were Kings" na 13ª edição do Rio Cine Festival, levou 20 anos para conquistar o Oscar -e recebeu o prêmio por um filme totalmente diferente do que havia previsto fazer.
"Fui ao Zaire fazer um documentário sobre um festival de música negra e latina que iria acontecer alguns dias antes da luta. Ganhei o Oscar com um filme sobre a trajetória do mito Muhammad Ali", contou.
Leon Gast, já na época um experiente diretor de documentários, havia sido contratado para produzir o filme sobre o festival de música organizado para entreter as milhares de pessoas esperadas no Zaire para acompanhar a "luta do século": Foreman, então com 22 anos, defenderia o título de campeão dos pesos-pesados contra o desafiante Muhammad Ali, dez anos mais velho.
Poucos dias antes da luta, Foreman se feriu durante um treino e a data foi adiada em seis semanas.
O festival de música -que reunia nomes como B.B. King, James Brown e Miriam Makeba- foi um fracasso de público porque os turistas esperados para a luta não apareceram.
Com tempo sobrando, Gast e sua equipe começaram a fazer longas entrevistas com Ali. "Ele adorava falar, ficava três horas conversando comigo, até seu treinador brigar com ele", contou o diretor.
Foreman era o oposto. Não gostava de entrevistas, era agressivo e arredio -uma espécie de Mike Tyson dos anos 70, definiu Gast. "Ele não conseguia entender porque Ali era o ídolo e não ele", explicou o diretor.
No quarto-estúdio, Gast começou a perceber que, mais do que um documentário sobre um fracassado "Woodstock negro", tinha em mãos a história de um mito. A partir daí, "When We Were Kings" começou a tomar sua forma definitiva.
O documentário foi apresentado a vários distribuidores e recusado por todos.
Uma exibição no Festival de Sundance em 1996 mudou tudo. "Foi engraçado ver aqueles que tinham recusado o filme disputarem sua distribuição em Sundance", contou o diretor.
Depois de Sundance, os dois boxeadores pediram ao diretor cópias do filme. Os dois, de acordo com Gast, aprovaram o resultado. Segundo o diretor, Ali só se refere a "When We Were Kings" como "o meu filme" e, ao prêmio, como "o meu Oscar".
Foreman fez questão de reunir toda a família -a mulher e os cinco filhos, todos chamados George- para assistir o documentário.
Gast orgulha-se de, com o filme, ter reaproximado Foreman de Ali. Para o diretor, a melhor parte de tudo foi ver os dois juntos na noite da entrega do Oscar, com Foreman cuidando de Ali, que sofre do mal de Parkinson.
"As diferenças desapareceram. Depois do Oscar, Foreman me disse que havia percebido que, durante toda a sua vida, Ali havia sido seu ídolo e que agora iria cuidar dele", disse o diretor.

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