São Paulo, sábado, 26 de julho de 1997
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Filme faz do boxe mais que esporte

MARCELO REZENDE
DA REPORTAGEM LOCAL

Talvez a mais previsível ambição de um lutador de boxe seja tornar-se um ídolo. Muhammad Ali, em cada cena de "When We Were Kings", o documentário do diretor Leon Gast, parece ter ido um pouco mais longe: terminou como herói de um povo.
Ali, para um cidadão da classe média branca de seu país, em 1974, o ano em que aconteceu no Zaire sua luta contra George Foreman, era um verdadeiro pesadelo.
Depois da campanha pela igualdade racial nos anos 60, a luta havia se tornado mais violenta na ação de grupos radicais. Nesse contexto, Ali era belo, engajado, carismático, encantador e rebelde demais para que parte de seu país pudesse dormir em paz.
Gast e seu fascinante documentário recuperam um pouco do clima daqueles anos, em que uma luta de boxe não se resumia apenas a um espetáculo de TV.
Ali, a cada momento do filme, entre piadas e shows de James Brown, manda seus recados aos jovens negros da América.
Ele é o semideus de Gast (que concede também a Foreman dignidade), assim como o do escritor Norman Mailer, um dos narradores do filme. Ali, em "When We Were Kings", é um Malcolm X com a dádiva de um sorriso.
Mas em nenhum momento há sombra de ingenuidade. Leon Gast sabe -da mesma maneira que seus personagens intuem- que o sonho não dará certo, e o retorno à África significa se sujeitar às regras do ditador Mobutu, que teria assassinado todos os inimigos no mesmo terreno em que a luta se realizou.
"When We Were Kings" é, por fim, o filme para todos aqueles que imaginam ser o boxe um esporte bárbaro e não desconfiam que o mesmo jogo pode ser também uma metáfora. Uma forte metáfora dos sonhos de seus lutadores.

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