São Paulo, terça-feira, 29 de julho de 1997
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Tiro no pé

LUÍS PAULO ROSENBERG

Desenvolvimento econômico exige ganhos de produtividade contínuos. Só assim pode subir o poder aquisitivo da população empregada e preservar-se a competitividade internacional do país.
Em economias emergentes, o excedente que pode ser dirigido à pesquisa voltada ao desenvolvimento tecnológico é por definição limitado. A opção de incorporação de tecnologias fica por conta do licenciamento da indústria nacional de bens de capital para copiar os avanços das empresas do Primeiro Mundo. Ou a forma mais direta e imediata: a compra de máquinas modernas pela via da importação.
Ou seja, a importação de bens de capital pode até afetar negativamente a balança comercial brasileira no curto prazo, mas constitui-se na própria solução do problema: indústrias nacionais que passarão a operar com máquinas mais produtivas terão custos menores e exportarão mais, além de substituir parte da importação de bens finais por similares nacionais, saídos das fábricas novas a custos imbatíveis.
Esses simples conceitos foram deixados à margem pelo governo, quando decidiu elevar de zero para 17% a alíquota do Imposto de Importação incidente sobre cerca de 3.600 tipos de bens de capital, sob pretexto de estar inibindo o excesso de importação.
Trata-se de mais um ato de insanidade econômica, decorrente de uma mentalidade tacanha de lutar com o déficit da balança comercial no corpo-a-corpo, sem estratégia de longo prazo e submetendo-se a pressões de lobistas de produtores nacionais incompetentes.
De todos os itens que compõem a balança comercial, o último que deveria ser selecionado para diminuir o déficit é justamente o das benfazejas importações de máquinas.
O instrumento de política econômica mais nobre para evitar o problema teria sido a manutenção do superávit fiscal legado pelo governo Collor à República do Pão de Queijo, que se encarregou de desbaratá-lo em menos de dois anos.
Se todo presidente não tem vontade ou força política para garantir o equilíbrio orçamentário, lamentavelmente o instrumento correto para superar o desequilíbrio da balança comercial seria a desvalorização cambial adequada, que dilui o peso do ajuste entre a promoção de todas as exportações e algum encarecimento democrático de todas as importações. Na verdade, se o desajuste não for grave, algum estímulo transitório e seletivo às exportações também poderia fazer sentido.
Pois o nosso governo vai para o pior dos mundos. Encarece generalizadamente o custo de adquirir máquinas modernas, estupra planos de investimento privado em andamento e impede o produtor nacional de instrumentalizar-se para retomar seu mercado ocupado pelas importações. Pior: eleva o custo de produzir os bens exportáveis, sem dar ao exportador o ganho de receita compensatório, como ocorreria se o câmbio fosse desvalorizado.
Resumo da ópera: quando todos os impactos da medida se concretizarem, o efeito líquido poderá vir a ser um agravamento do déficit comercial e novas pressões de custos na economia brasileira. Exatamente o oposto do que buscava a medida adotada.
Mais uma tucanada a nos atormentar. Quando a tibieza substitui a determinação na condução do governo, um governador-banana inaugura um periclitante ciclo de contestação policial em todo o país, um ministro joga farofa no ventilador do presidente e a globalização consciente da economia brasileira degrada-se a abertura envergonhada, com desmunhecadas protecionistas.

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