São Paulo, quarta-feira, 30 de julho de 1997
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Bertazzo faz 'excluído' dançar

DANIELA ROCHA
DA REPORTAGEM LOCAL

Abaixo os regionalismos musicais intocáveis, a dança clássica para poucos, a ginástica que só visa músculos, o isolamento das classes menos favorecidas.
O coreógrafo Ivaldo Bertazzo há muito tempo deixou de trabalhar apenas com a dança para bailarinos para transformá-la em um meio de expressão de cidadãos, integrada à música, à informação e ao preparo corporais e à educação.
Consagrado com o espetáculo "Cidadão Corpo" (apresentado em 96), ele repete a dose de fazer uma montagem de fôlego, desta vez de forma mais incisiva.
Em "Palco, Academia e Periferia", seu novo espetáculo, que estréia na próxima quinta-feira, no Sesc Pompéia, Bertazzo traz à cena, além dos bailarinos e dos "cidadãos-dançantes" (como chama os dançarinos não-profissionais), os excluídos das periferias das grandes cidades.
Estarão lá os meninos da grupo Bate Lata (de Campinas), da Favela Monte Azul (de São Paulo), da Lactomia (do Candeal, em Salvador), do grupo 16 Meninos da 13 de Maio (de São Paulo) e do Funk'n Lata (do Rio).
Para coordenar todos os sons, de orquestra, dos dançarinos e dos grupos, o maestro Nelson Ayres trabalha a direção musical. Mas um outro convidado dá o toque especial ao projeto: o músico Naná Vasconcelos.
"Eu sou uma presença além da música. Farei transições e criarei em cima da música que será tocada. Estou excitadíssimo com o espetáculo", disse Vasconcelos.
Os meninos convidados entram no espetáculo para cantar, tocar e dançar. "O bailarino, o cidadão e o periférico só têm a aprender uns com os outros. Da união dos diversos, todos saem ganhando. É essa a saída para o caos urbano em que vivemos. Chegamos a um limite em que não adianta mais redomas ou grades nas janelas."
O trabalho de Bertazzo relativo à dança e à expressão corporal faz uma analogia às cidades caóticas, já propondo a solução para elas.
Na coreografia, os dançarinos se entrelaçam, se misturam como se estivessem em uma grande confusão humana, para, na sequência, se ordenarem harmonicamente em novos movimentos.
"Um corpo é um volume no espaço. A partir da maneira como cada bailarino utiliza o espaço, indicamos um novo código de civilidade. Existe a proximidade entre os diversos que não precisa necessariamente ser conflitante. Pelo contrário, é totalmente conciliável", afirmou Bertazzo.
Ele se considera mais do que um coreógrafo. "Sou um educador do corpo, do gesto." Dessa forma, Bertazzo toma o corpo como um instrumento que deve deixar de ser alvo de somatizações e que se transforma em movimento, em dinâmica que também ajuda o homem a se adaptar às suas dificuldades e aos seus sofrimentos.
"Os movimentos em voga ainda estão fechando o homem porque fazem uma referência excessiva ao ego. A importância da esteira, da ginástica e do músculo faz com que o corpo limite-se e que perca a sua expressão. Vira terrorismo cultural", disse o diretor.
Bertazzo levou sete meses para desenvolver "Palco, Academia e Periferia". Ao todo, são 15 bailarinos, 40 "cidadãos-dançantes" e dez músicos, além das crianças convidadas (cerca de cem). O motivo para tanta mobilização é simples: "Isto tem que virar uma ópera", confessa Bertazzo.

Espetáculo: Palco, Academia e Periferia
Coreografia e direção: Ivaldo Bertazzo
Direção musical: Nelson Ayres
Participação especial: Naná Vasconcelos
Design de luz: Paulo Pederneiras
Quando: estréia dia 7 de agosto, às 21h; de qua. a sáb., às 21h; dom., às 19h. Até 17/08
Onde: Sesc Pompéia (r. Clélia, 93, Lapa, São Paulo, tel. 011/871-7700)
Quanto: R$ 20; R$ 15 (usuários) e R$ 10 (comerciários)

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