São Paulo, domingo, 3 de agosto de 1997
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Cárdenas vê deterioração social no Brasil

CARLOS EDUARDO ALVES
ENVIADO ESPECIAL A PORTO ALEGRE

Recém-eleito prefeito da Cidade do México, Cuauhtémoc Cárdenas (PRD), apesar de estar distante do radicalismo esquerdista, tornou-se a atração do "Foro de São Paulo", em Porto Alegre, que reúne partidos de esquerda do continente. Em entrevista à Folha, Cárdenas faz críticas ao presidente Fernando Henrique Cardoso. A seguir, os principais trechos:
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Folha - Como o sr. avalia o desempenho do presidente Fernando Henrique Cardoso?
Cuauhtémoc Cárdenas - Quem pode dizer isso são vocês, brasileiros. O que vejo, por meio de indicadores, de números estatísticos, é que as condições sociais do país estão se deteriorando. Cresce o desemprego, por exemplo.
Folha - O sr. conhecia Fernando Henrique Cardoso antes de ele assumir o governo?
Cárdenas - Não o conhecia pessoalmente, só por meio de escritos.
Folha - Ele o está decepcionando?
Cárdenas - Não, já que não pus minhas esperanças nele. Compartilho aspirações é com Lula.
Tenho proximidade e coincidências, embora não sejamos idênticos, com o PT. Temos origens políticas e bases ideológicas diferentes. Mas compartilhamos muitas aspirações do PT e do Lula. Acompanho o esforço dele pelas causas populares.
Folha - Algumas pessoas do PT acham que o sr. pode ser um exemplo para Lula, que assim, como o sr., antes da recente vitória, passou por duas derrotas.
Cárdenas - O que se tem de entender é que a luta pelas grandes transformações às vezes tomam mais tempo do que se pensa. Não vejo o PT e Lula fora da luta para mudar o Brasil. Lula não busca a Presidência por nada. Quer mudar o Brasil. Não é uma luta pessoal.
Folha - Mas o exemplo do sr. mostra...
Cárdenas - Mostra que quem se considera um lutador por uma causa justa pode prosseguir sendo, em qualquer circunstância, com ou sem cargo eletivo.
Folha - Uma das questões mais polêmicas no Brasil é a luta pela terra. Como o sr. a vê?
Cárdenas - No México, a reforma agrária permitiu um longo período de estabilidade social e política. Hoje, infelizmente, o campo está desatendido por parte do governo e precisa de mais investimento e tecnologia.
Folha - O sr. acompanha a discussão no Brasil?
Cárdenas - Sei que existe um problema e esperaria que se se encontrasse uma fórmula para dar resposta a essa demanda. Se há uma demanda social, o Estado tem a obrigação de atendê-la.
Folha - Existe espaço para o nacionalismo na globalização?
Cárdenas - Apesar de a globalização ser um processo irreversível, não se pode deixar de levar em conta as peculiaridades e as necessidades de cada país. Isso vai permitir processos de globalização menos conflitantes.
Folha - Por que o sr. evita o rótulo de político de esquerda?
Cárdenas - Hoje é difícil definir-se só por geometria. É mais importante definir-se por conteúdos.
Folha - O sr. tem uma posição histórica contra o embargo norte-americano a Cuba. Há lugar hoje no mundo para uma ditadura?
Cárdenas - Os países têm a obrigação de não intervir na vida interna de outros países.
Folha - Para se chegar ao poder, os partidos de esquerda têm de se aliar com os de centro-esquerda?
Cárdenas - Depende. Há triunfos eleitorais que fazem pensar que um só partido pode ficar no governo. Em outros casos, para se chegar a uma vitória, requer fazer acordo entre forças distintas.

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