São Paulo, segunda-feira, 4 de agosto de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Nos EUA, TV é ampulheta estridente do cotidiano

ESTHER HAMBURGER
ESPECIAL PARA A FOLHA,

em Austin
Desligado, o aparelho de televisão parece exatamente o mesmo em qualquer parte. Quando em funcionamento no país que produz a maioria da programação mundial, esse eletrônico, híbrido de eletrodoméstico, rádio, cinema e jornal, revela maneiras de organizar o tempo, obsessões temáticas e padrões estéticos específicos.
Apesar da enorme fragmentação da audiência trazida pela proliferação de canais a cabo, referências às rotinas comuns no tempo e aos acontecimentos da vida local permanecem regras de representação que regem esse domínio banal da experiência cotidiana e produzem a imaginação contemporânea.
Nos EUA, a TV convencional pode ser vista como uma ampulheta estridente que vai marcando os diferentes momentos da rotina de acordo com os horários habituais no país.
A ABC, a CBS e a NBC transmitem seus primeiros telejornais de madrugada e encerram o dia normal de trabalho com a exibição dos principais telejornais às 17h30. É hora do jantar. Ainda é dia no verão americano. Seguem-se os seriados.
A cadência dessa programação genérica é fortemente calcada em noticiários locais produzidos pelas emissoras afiliadas em cada cidade de porte médio.
Os canais a cabo subvertem a unicidade dessa rotina. Seus assuntos preferidos revelam uma obsessão especial pelo conhecimento minucioso de detalhes da vida privada. As firulas no trato com os animais domésticos, o documentário realista das cirurgias médicas mais diversas.
Mas a fascinação com a rotina previsível no tempo e no espaço permanece. Não é à toa que o canal a cabo de maior sucesso é o canal do tempo, que anuncia a cada instante a previsão para os próximos dias, nos mais diversos locais do planeta.
Na terra de Malboro, do Monument Valley, de Hollywood e da TV, poderia se esperar uma programação televisiva afiada e provocante, como sugerem as cores gritantes dos desenhos animados e da publicidade.
Mas a palidez dos tons transmitidos pelos telejornais, talk shows e seriados norte-americanos lembra que esse também é o país da economia puritana. O dia-a-dia deve ser acima de tudo organizado, previsível e barato. Mesmo que a placidez desse ideal possa ser interrompida a qualquer momento pelo noticiário urgente de um assassinato escandaloso.

E-mail: ehamb@uol.com.br

Texto Anterior: Empresário diz não saber quanto pagou
Próximo Texto: O homem; Sem riscos; Pornô; A herdeira
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.