São Paulo, quarta-feira, 6 de agosto de 1997
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Pedir o mínimo é pedir demais aos cartolas

ALBERTO HELENA JR.
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Ontem, o ministro Pelé percorreu o Congresso, tentando sensibilizar os legisladores, sobretudo o presidente da Câmara, Michel Temer, para a aprovação de seu projeto de reforma do futebol. Entre outras coisas, Pelé propõe a transformação dos clubes em sociedades anônimas, a extinção definitiva da Lei do Passe, no prazo de dois anos a partir da nova legislação, e punição ao clube que atrasar o pagamento dos salários dos jogadores por mais de três meses.
Tenho sérias dúvidas de que o Congresso aprove tal projeto. Pelo menos, não sem antes desfigurá-lo, como fez com a Lei Zico, há tão pouco tempo.
Digo isso baseado em fatos: basta relembrar a atitude servil, repugnante, dos deputados que se dispuseram a bajular o presidente Ricardo Teixeira, da CBF, quando deveriam tê-lo interrogado sobre o escândalo do apito. Isso, sem falar nas pressões de governadores, parlamentares e até mesmo do ministro da Justiça, Iris Rezende, para que o Atlético-PR fosse mantido na primeira divisão do Brasileiro, e o escândalo se circunscrevesse à pífia punição a Ivens Mendes.
Além do mais, enquanto congressistas do porte de um deputado José Genoíno (genuíno corintiano) e o senador José Serra (palestrino da Mooca) não arregaçam as mangas para entrar fundo nessa área, gente como Eurico Miranda manda e desmanda (mais desmanda do que manda).
Claro que seria uma oportunidade de ouro para o Congresso marcar um gol de placa diante da opinião pública. Mas, tantas foram as chances desperdiçadas até agora, que, a não ser por milagre, esse jogo vai terminar mesmo no 0 a 0.
*
A propósito, enquanto assistimos impassíveis ao êxodo interminável dos nossos craques para o milionário futebol europeu, começa a murchar até mesmo a esperança de que o sistema de co-gestão ou patrocínio consiga manter nosso futebol doméstico num nível aceitável.
Veja-se os casos pioneiros da Parmalat-Palmeiras e Excel-Corinthians. Depois da era Brunoro, o Palmeiras refluiu ao lugar-comum. Pode ser até campeão do mundo, mas nunca por força de uma política agressiva e inteligente de contratações, e sim como consequência do trabalho obsessivo do técnico Luiz Felipe e de um grupo de jogadores de técnica mediana e muita disposição.
Quanto ao Corinthians, nessa toada, pode até chegar ao título nacional, mas sem autoridade, muito menos brilho.
Mais uma vez, no futebol, a máxima de que a oportunidade faz o homem é invertida.
*
Novas leis, reforma das estruturas dos clubes, das federações e da CBF, tudo isso viria a calhar, mas a reportagem de domingo da Folha revela o essencial: apesar de toda a bagunça reinante no futebol brasileiro, os patrocinadores ainda o consideram bom negócio.
Só reclamam do óbvio: a falta de um calendário racional e estimulante.
Isso é o mínimo e é quase tudo. Se um raiozinho de luz iluminasse as trevas onde habitam os cartolas, teríamos estádios cheios, grana da TV e nossos craques em campo.
Mas sei que é demais pedir o mínimo.

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