São Paulo, domingo, 10 de agosto de 1997
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Gigante e palhaço

CARLOS HEITOR CONY

Desquitado há pouco tempo, com duas filhas menores, coração desocupado, muito tempo pela frente, o pior era o fim-de-semana. As meninas gostavam de circo, filme do Carequinha, pipoca e de histórias bonitas na hora de dormir.
Aturou filas abomináveis nas matinês do Metro-Copacabana, que levava festivais do Tom & Jerry. E uma tarde, num circo do subúrbio, elas quiseram que ele se candidatasse a uma brincadeira do palhaço Ventania, que exigia um parceiro para ajudá-lo a fazer a mágica mais complicada na história das mágicas: transformar um balde cheio d'água num vaso de flores. Alguma coisa não deu certo e, em vez de tomar um banho de flores, ele tomou um banho de verdade, voltou para casa pingando, as meninas adoraram, acharam que o pai era um heói de verdade, riram mais dele do que do palhaço.
À noite, na hora de dormir, foi um momento bom. Uma de cada lado, com os pijaminhas que ele comprara no "Paraíso das Crianças" e que cheirava a alfazema, elas quiseram mais uma vez a história do gigante mau que achou um menino abandonado na floresta dentro de um cesto de vime.
O gigante era muito mau e levou o cesto com o menino para a casa dele. O menino chorava, e o gigante mau ficou com uma baita dor de cabeça. Pediu que o menino parasse de chorar. Aí o menino pediu para que o gigante deixasse de ser mau. O gigante mau aí perguntou o que deveria fazer para deixar de ser mau. Aí o menino disse que ele devia contar uma história bem bonita todas as noites para que ele pudesse dormir e ter sonhos bonitos. E todas as noites o gigante mau contava uma história que ele achava bonita, mas o menino nem tanto. Dormia no meio. Mas segurava a mão do gigante e confiava nele como se fosse um pai.

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