São Paulo, segunda-feira, 11 de agosto de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Brígido, que vendeu voto, 'aluga' mandato

LUCIO VAZ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Gravações em poder da Folha mostram que o deputado Chicão Brígido (PMDB-AC), envolvido no escândalo da venda de votos pró-reeleição, praticamente alugou seu mandato para a sua suplente, desviando para uso próprio parte do salário dos funcionários do seu gabinete.
A comissão sobre os salários dos funcionários é uma prática usual de Chicão Brígido. Mesmo licenciado, cobrava a "taxa".
Licenciado no período entre 6 de maio e 7 de agosto, Chicão, além de continuar recebendo dinheiro de seus funcionários, pressionava a suplente Adelaide Neri (PMDB-AC) a repassar para ele o dinheiro da convocação extraordinária de julho.
Com o fracasso da manobra -a suplente se negou a repassar o dinheiro da convocação-, Chicão decidiu reassumir o cargo.
O esquema de Chicão é simples: cada deputado recebe um salário de R$ 8.000 e dispõe de uma verba de R$ 20 mil para contratar funcionários. Só que alguns dos assessores de Chicão são obrigados a direcionar parte de seus vencimentos para a conta do patrão.
Uma funcionária de nome Marineide é a encarregada de desviar o dinheiro. Ela possui procurações e cartões magnéticos de outros funcionários lotados em Brasília e em Rio Branco (AC).
Enquanto era citado em conversas gravadas do deputado Ronivon Santiago (PMDB-AC) como um dos deputados que teriam recebido dinheiro para votar a favor da reeleição, Chicão estava licenciado da Câmara, recebendo um salário de secretário em Rio Branco.
Gravação
Em uma das gravações obtidas pela Folha, Chicão afirma, no início de julho, que fica com R$ 8.000 da verba de R$ 20 mil de que dispõe para contratar funcionários. "Aqui do gabinete eu estou administrando o quê? O que é repassado para mim é R$ 8.000", diz.
Participavam da conversa a então deputada Adelaide e o seu filho, Vicente Nery. Chicão dá um exemplo do desvio de verba: "Por exemplo, a Neide (Marineide) é cadastrada com R$ 3.000 e me repassa R$ 1.600".
Em outra conversa gravada, Marineide confirma que ela e o assessor Crispiniano Velame têm salário de R$ 3.000, mas recebem menos de R$ 600 líquidos.
As gravações foram feitas por um funcionário da Câmara no gabinete então ocupado por Adelaide. Foram repassadas para a Folha com o compromisso de que a fonte seria mantida em sigilo.
Convocação
Chicão pressionava para receber de Adelaide os R$ 12 mil da convocação extraordinária de julho. Argumentava que tinha feito esse acordo antes de sua suplente assumir a sua vaga, em 6 de maio.
Na conversa gravada, Adelaide propõe ficar com metade da verba: "Metade, metade, homem de Deus". Chicão faz uma contraproposta: "Vamos combinar o seguinte: essa convocação que está entrando agora, a gente divide. Fica com R$ 3.000". Adeleide rejeita.
A Folha também recebeu cópias de recibos de depósitos bancários feitos em Brasília pela assessora Marineide. O dinheiro era repassado para as contas de Chicão Brígido, da sua mulher, Gleide, e da distribuidora de remédios Takeda Rio Branco.
Farmácia
A empresa Takeda fornece medicamentos para uma farmácia de propriedade do deputado em Rio Branco. Um dos depósitos para a Takeda tem a anotação: "Transmitido por Neide".
Em outro recibo, um depósito de R$ 1.750 na conta de Gleide Brígido, Marineide anota: "Dep. convocação". No verso, ela especifica: "1.000 Neide, 730 Jarud e 270 Airton". O total equivale a R$ 2.000. Mas ela mostra que há um desconto de R$ 263.
A gravação e os depósitos obtidos pela Folha comprovam uma suspeita que surgiu no Congresso quando a verba de gabinete foi aumentada de R$ 10 mil para R$ 20 mil, em fevereiro: parte do dinheiro poderia ser desviada.

Texto Anterior: Luta pela cidadania recebe destaque
Próximo Texto: Mandato pode ser cassado
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.