São Paulo, segunda-feira, 11 de agosto de 1997
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Leia trechos das conversas que foram gravadas

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Leia abaixo a transcrição das gravações obtidas pela Folha.
A verba de gabinete O deputado licenciado Chicão Brígido (PMDB-AC), a então deputada Adelaide Neri (PMDB-AC) e seu filho e assessor, Vicente Nery, falam sobre a verba de gabinete (R$ 20 mil):
*
Chicão - Hoje, o meu salário está todo retido, para pagar conta, o carro, tem mais o empréstimo pessoal do banco, tem o IPC. (...) Aqui do gabinete eu estou administrando o quê? (...) O que é repassado para mim é R$ 8.000.
Adelaide - É, e os R$ 20 mil do gabinete?
Chicão - Sim, dos R$ 20 mil do gabinete.
Adelaide - Só recebe R$ 8.000?
Chicão - É, R$ 8.000, é que aqui você está contando o que você recebe líquido. Por exemplo, a Neide é cadastrada com R$ 3.000 e me repassa R$ 1.600. Para você ter uma idéia. E o salário dela aqui só é R$ 600. O resto, o Imposto de Renda come quase tudo. O Mauri (Mauri Sérgio, prefeito de Rio Branco), por exemplo, não ajuda a gente a resolver porra nenhuma. Aquilo que eu tinha lhe dito, por exemplo, se ele me ajudasse a resolver algumas coisinhas, a gente dividia a convocação (..) Mas ele não ajuda. O cara parece que é o rei e quer ver você lá dentro do buraco.
Vicente - Chicão, a realidade é que a gente acha que tu quer voltar.
Chicão - Não, veja o seguinte: hoje, eu não sei o que é melhor para mim. Ficar lá em Rio Branco, sem nenhuma função, para mim é complicado. (...) A questão, por exemplo, entre eu e a senhora, com relação à nossa conversa, aos compromissos, tudo, isso aí a gente tem todo o interesse em honrar. Agora, só quero pedir, pelo amor de Deus, não me dê nenhum tipo de prejuízo, porque aí...
Adelaide - Mas, Chicão. Agora, eu não sei por que que aconteceu na primeira vez que eu cheguei aqui. Você disse: nós vamos acertar lá em Brasília. E cheguei aqui, você tira daqui, bota dali, mas não passou para mim. Você teve só a intenção. Foi por isso que eu não te repassei nada. Porque você talvez pensou: ela vai entender. Mas, tira daqui, bota dali, eu pensei que você queria arrumar o salário do Vicente.
Chicão - Eu levei ele lá para cima para ele fazer umas horas extras. Nas horas extras, ele iria ganhar mais uns R$ 300.
Adelaide - Então, como é que eu ia te devolver o dinheiro, se eu não sabia? Você perdoa, a sua intenção foi boa, você até me surpreendeu. Mas, Chicão (...), eu com o marido doente, que até morreu... Com o desconto do Imposto de Renda, sobra para ti o quê? E o que sobre para mim?
Será que nós vamos brigar por isso, por causa de dinheiro? (...) Você sabe quanto eu estou devendo de passagem? São R$ 3.700 para levar o corpo do meu marido. É o que eu devo à Varig hoje. (...)
Chicão - O nosso interesse é voltar só no prazo regimental. Aí eu lhe disse o seguinte: se o Mauri me ajudar, a gente divide as convocações. Se o Mauri não me ajudar, aí eu não posso lhe ajudar de jeito nenhum. Nem nas convocações do meio do ano, nem na do final. Então, eu só quero a sua ajuda nisso.
Adelaide - Mas Chicão, não faça isso comigo. Sabe quanto eu vou pagar de hospital?
Chicão - Mulher, tu é deputada.
Adelaide - No final do ano, você já está aqui. Eu não quero o final do ano. Eu quero ir embora, Chicão. Assuma logo, que eu fico despreocupada.
Chicão - Deixa eu te dizer uma coisa: vamos conversar com o Geddel (Geddel Vieira Lima, líder do PMDB).
Adelaide - Eu já fui lá, para ver se ele pagava as passagens. Contei a sua situação, contei a minha, com a morte do marido. 'Não, a gente vai ver o que fazer' (...) Eu disse para ele: "O partido não pode fazer isso?" "Não, não pode". Tudo bem. Eu fui até no IPC, para ver se tinha direito a alguma coisa.
Chicão - Mas, minha filha, eu só quero que você me ajude nisso.
Adelaide - Chicão, eu estou sem condição. Você não vai ficar chateado comigo. Você está ruim de vida, eu também estou.
(...) Você volta em agosto, aí você recebe os outros. (...)
Chicão - Não, a minha palavra é uma só.
Adelaide - Se você disse, foi até março. Posso trabalhar até março? (...) A gente resolve a questão toda.
Chicão - Não.
Adelaide - Mas olha aqui. Você me dá 10%. Olha, é 10%.
Chicão - Não.
Adelaide - Então, vamos ver, o salário do Vicente, eu te dou R$ 1.500, e nada mais.
Chicão - Vamos fazer o seguinte: você quer ficar até março, é isso?
Adelaide - Isso, o tempo que dá para fazer alguma coisa.
Chicão - Agora, aqui, vamos deixar bem...
Adelaide - Bem claro. Oh, meu Deus! Um gravador, se eu tivesse.
Chicão - Não, nada de gravador... A questão das convocações.
Adelaide - Metade, metade, homem de Deus.
Chicão - Não, aí não.
Adelaide - Com é que eu vou te pagar agora, se eu não tenho mais, se eu já paguei o hospital.
Chicão - Isso tu dá um jeito.
Adelaide - Não, não vou dar jeito. Como, se eu já fui atrás do Geddel e do presidente da Câmara (Michel Temer). Eu só faltei me ajoelhar.
Chicão - Vamos combinar o seguinte: essa convocação que está entrando agora a gente divide. Fica com R$ 3.000.
Adelaide - Não senhor, eu já gastei, como é que eu vou te dar?
Chicão - Não, tu paga de R$ 1.000 em R$ 1.000.
Adelaide - O que é isso, Chicão?
Chicão - Os outros R$ 3.000...
Adelaide - Não, não vou concordar. Não fico com raiva, mas não dá, não.
Chicão - Mas é como eu estou te explicando aqui, tu paga parcelado.
Adelaide - Não, não vou pagar parcelado. Vem outra convocação e você quer que eu pague parcelado.

Os salários dos assessores
Vicente Nery conversa com os assessores Marineide e Crispiniano Velami. Eles confirmam que têm salário oficial de R$ 3.000, mas recebem, líquidos, menos de R$ 600.
*
Vicente - A gente, que ganha um salário como a gente ganha, não dá para pensar em comprar um carro de luxo. Tu ganha R$ 550 com o Chicão, não é?
Marineide - É. Ele dava R$ 600. Depois, veio descontando o vale-transporte. Aí diminuiu.
Vicente - Ele desconta o vale transporte?
Marineide - É. (...) Era R$ 600, menos R$ 33, era igual a R$ 567, não é Crispiniano?
Crispiniano - Ele está descontando vale, que não tem nada a ver uma coisa com a outra.
Marineide - Era R$ 600 o meu e o teu. Ele descontou, não foi?
Vicente - Eu não aceitei ele fazer isso comigo. Ele pode baixar o meu, se ele quiser. Mas eu não vou aceitar ficar com um salário alto, para mim dar pra ele, porque eu posso me prejudicar no Imposto de Renda.
Marineide - Ele falou que, o Imposto de Renda, ele é que ia pagar.
Vicente - Olha. Agora tu tirou R$ 1.000 para mim. Vamos só fazer uma conta aqui rápida. Tu ficou em quanto, agora, em R$ 3.000?
Marineide - Em R$ 3.000.
Vicente - R$ 3.000 vezes um ano, dá R$ 36 mil. Já passou mais de R$ 10 mil do limite. Como é que tu vai pagar R$ 2,5 mil de Imposto de Renda.
Marineide - Vai ter que tirar do dele mesmo. Passar um mês sem dar pra ele, né?
Crispiniano - Eu passo um mês. Eu digo: olha, é para pagar o imposto. (...) Mas ele vai chiar para não pagar.

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