São Paulo, terça-feira, 12 de agosto de 1997
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Perenizar a CPMF é golpe contra o Real

SYNÉSIO BATISTA DA COSTA

Parece inacreditável, mas está acontecendo no Brasil. A CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira) caminha para se converter em imposto permanente para financiar saúde, previdência e assistência social.
O primeiro passo nessa direção aconteceu em 23 de julho, quando a Comissão de Constituição e Justiça do Senado aprovou emenda do senador Roberto Freire (PPS-PE), com apenas um voto contrário e uma abstenção. Evidentemente, a aprovação se deu com o beneplácito do governo, que já falava em estender a vigência da contribuição por mais um ano.
A emenda foi incluída na reforma da previdência e dispõe que a totalidade dos recursos da CPMF seja utilizada na seguridade social. Agora, deverá passar por votações nos plenários do Senado e da Câmara dos Deputados.
Espera-se que o Congresso tenha um mínimo de bom senso e rejeite a emenda. Afinal, é ridículo perenizar um tributo instituído de forma provisória para tapar um rombo nas contas públicas. Coberto o buraco, o financiamento da saúde deveria passar a ser feito inteiramente com as verbas do Orçamento.
Para tanto, imaginava-se que o governo federal tivesse aprimorado a gestão da saúde, eliminando custos desnecessários, banindo ineficiências e otimizando a administração dos recursos. Ou seja, fazendo exatamente aquilo que o próprio governo prega para a iniciativa privada e agora mostra que não faz: viabilizar-se pela qualidade e não pela elevação de preços, tarifas e tributos.
Entretanto, a perenização da CPMF pune injustamente todo o setor produtivo. A indústria, por exemplo, vê seu custo artificialmente aumentado com o efeito em cascata que essa contribuição tem sobre o preço final dos produtos. Esse percentual a mais equivale várias vezes à variação da inflação do mês, o que constitui um contra-senso total em relação às metas do Plano Real.
No caso do setor de brinquedos, por exemplo, o custo da CPMF se soma ao "custo Brasil" e ajuda a minar a competitividade, conquistada a duras penas. Cria um obstáculo pesado para que o setor seja competitivo, tanto no mercado externo quanto no interno, onde concorre com os produtos importados.
O mesmo ocorre, em maior ou menor grau, nos demais setores da indústria. Assim, a CPMF acaba dificultando a venda dos produtos nacionais. Isso gera uma receita menor. Consequentemente, o recolhimento de tributos e da própria contribuição também diminui.
Assim, chega-se ao absurdo de perenizar um instrumento fiscal que desestimula a produção e tende a arrecadar cada vez menos. E, com a arrecadação diminuída, aumenta outra vez o rombo nas contas públicas. Portanto, quanto mais tempo a CPMF existir, menos eficaz ela será para resolver o problema de gestão dos recursos da saúde.
Agora, se o Congresso está disposto a avalizar tamanha barbaridade, que crie meia dúzia de contribuições. Será o jeito mais eficiente de liquidar o setor produtivo, desequilibrando de vez os balanços de pagamentos interno e externo -o que certamente provocará um desastre econômico de dimensões incalculáveis e sepultará rapidamente o Plano Real.

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