São Paulo, quarta-feira, 13 de agosto de 1997
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

SOS indústria fonográfica

ROBERTO LIMA SOUTO

A pirataria vem colocando em risco a indústria fonográfica brasileira. Para combatê-la, uma coisa é fundamental: vontade de agir. É o que tem sobrado à indústria fonográfica e faltado ao poder público.
A Associação Brasileira dos Produtores de Discos (ABPD) lançou, no início deste ano, uma campanha nacional de combate à pirataria. A Associação Protetora dos Direitos Intelectuais Fonográficos (Apdif) vem desenvolvendo uma atividade de investigação com o objetivo de denunciar às autoridades policiais os casos constatados de pirataria.
Ou seja, a indústria fonográfica está cumprindo parte do papel que deveria caber ao poder público. Isso aconteceu porque ficou claro que não era mais possível permanecer de braços cruzados, à espera do pior. Alguns dados ajudam a compreender a dimensão e a gravidade do problema.
Para que se tenha uma idéia, 90% dos CDs piratas que chegam ao Brasil vêm do exterior, seja por importação subfaturada, seja por contrabando. Os aeroportos e os portos do Rio, Santos, Recife e Guarulhos são os principais focos de entrada.
Estima-se que o comércio ilícito de discos, cassetes e CDs gera um prejuízo anual de R$ 165 milhões aos cofres públicos, entre impostos não recolhidos e sonegação fiscal. A União deixa de arrecadar R$ 121 milhões em ICMS e IPI, além de R$ 44 milhões estimados de sonegação de Imposto de Renda dos empresários piratas.
É hora de reverter esse descalabro. Para isso, há que obter maior comprometimento da Receita Federal e da Polícia Federal no combate à pirataria, reforçando a vigilância sobre os principais portos e aeroportos e sobre as áreas de fronteira terrestre.
Outra importante ação diz respeito à apreensão de produtos piratas. O Código Penal não permite a destruição do produto ilegal até que se esgotem todos os mecanismos de apelação. É necessário que a Justiça passe a determinar a destruição imediata nos casos em que não se conteste a ilegitimidade do material apreendido. Basta, para tanto, introduzir uma pequena alteração no Código Penal.
Também há que agir com rigor em relação aos que participam, não importa como, do comércio ilegítimo de suportes fonográficos. O Código Penal, em seu artigo 184, prevê reclusão de um a quatro anos, além de multa, para os criminosos. É importante que as penas sejam rigorosas, que as autoridades policiais se dediquem efetivamente à fiscalização e que a Justiça processe os criminosos.
O Congresso Nacional pode colaborar nesse esforço de combate à pirataria. Há algum tempo se encontra entalado na Comissão de Constituição e Justiça substitutivo ao projeto de lei nº 5.430, de autoria do deputado Aloysio Nunes Ferreira, que dispõe sobre direitos autorais.
O substitutivo, que contribui inequivocamente para modernizar a legislação sobre o assunto, tem tudo para constituir um instrumento importante de repressão à pirataria. É fundamental que sua tramitação seja acelerada.
Não há alarmismo na afirmação de que a indústria fonográfica está ameaçada. Atualmente, os CDs participam com 98% do total das vendas do setor, contra 2% dos cassetes. Mas são os efeitos da pirataria sobre a produção de cassetes que melhor ilustram a dramaticidade da situação atual.
Só no ano passado foram vendidos mais de 60 milhões de cassetes piratas no Brasil, contra 7 milhões de unidades comercializadas pelo mercado legal. A indústria clandestina movimentou, no período, nada menos do que R$ 120 milhões. Ou seja, a indústria fonográfica se viu privada de mais de 10% de seu faturamento devido à pirataria de cassetes.
É possível afirmar que ela praticamente exterminou o mercado de cassetes. Como os discos de vinil fazem parte do passado, os CDs são os únicos suportes com que ainda pode contar a indústria fonográfica nacional.
Os dados mais recentes de apreensões realizadas pela Apdif reforçam o que se afirma. No primeiro trimestre deste ano, houve 22.422 apreensões de CDs piratas, contra 23.958 em todo o ano de 1996 e 12.764 em 1995.
É claro que ainda estamos distantes do quadro enfrentado pelo mercado de cassetes. Mas é também verdade que a pirataria se expande rapidamente. Fica evidente que, se nada for feito, enfrentaremos muito breve as mesmas dificuldades, com ameaça a uma indústria que emprega centenas de milhares de pessoas e que constitui um dos mais importantes veículos de transmissão e difusão da cultura nacional.
Apenas a título de informação, a indústria fonográfica brasileira passou a ocupar, no final do ano passado, o sexto lugar do ranking mundial, com participação de 3,2% no mercado global. O faturamento no atacado atingiu R$ 900 milhões, com a venda de mais de 90 milhões de unidades entre CDs, LPs e cassetes.
Esses dados revelam que a indústria vive um verdadeiro boom, alimentado pela estabilidade econômica e pelo consequente aumento do poder de compra da população. O quadro de prosperidade e crescimento não deve, contudo, camuflar o risco que se corre.
Nunca é demais repetir: ou se age agora, ou será tarde demais.

Texto Anterior: Além do pragmatismo
Próximo Texto: Argentina espera crescer 8% no ano
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.