São Paulo, sexta-feira, 15 de agosto de 1997
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LEIA TRECHOS DAS GRAVAÇÕES

DA ENVIADA ESPECIAL A SANTA MARIA

Fazendo-se passar por um empresário do setor interessado em instalar redes telefônicas nas regiões norte, oeste e noroeste do Rio Grande do Sul, o engenheiro João Batista Veras gravou conversas telefônicas com três empreiteiros no dia 11 de novembro do ano passado.
Ele usou o codinome Carlos e conversou com os supostos coordenadores dos esquemas em Passo Fundo e Santo Ângelo e com um empreiteiro de Santa Maria.
Em todas as gravações, os empresários falam abertamente sobre os acordos para rateio de obras entre eles, mas dizem que a CRT não tem conhecimento do esquema. Cópias das fitas estão em poder do Ministério Público do Estado.
Segundo o engenheiro, os acordos impedem a competição e a queda dos preços. Ele sustenta que o custo de instalação das redes, de cerca de R$ 12,00 por homem/hora, poderia cair para a metade se não houvesse o acerto entre as empresas.
Para comprovar sua afirmação, gravou conversas com empresas em que se fazia passar por um autônomo interessado em fazer as obras como subcontratado.
Em seu depoimento perante o Ministério Público, Veras afirmou que uma obra que foi contratada pela CRT por R$ 12,00 homem/hora, lhe foi oferecida a R$ 2,00 o homem/hora.
O primeiro telefonema
O primeiro telefonema foi feito para o empresário Paulo Veiga, dono da Veiga Construções, da cidade de Santo Ângelo. O engenheiro João Batista Veras se apresentou como empreiteiro Carlos:
João Batista Veras - É da Veiga Construções?
Telefonista - Isso.
Veras - Quem está falando?
Telefonista - Katia.
Veras - Dona Marli (mulher do proprietário) se encontra?
Telefonista - Só um pouquinho, tá?
Marli - Quem fala?
Veras - É o Carlos, da Kitel, do município de Estrela. Nós estamos entrando para fazer umas licitações na região noroeste e eu gostaria de saber se tem algum inconveniente, se a gente teria que conversar a respeito de preços de obras, como funciona o esquema de vocês, pois de repente a gente vai chegar queimando preço e vai dar balão, né?
Marli - É, exatamente. Quem trata disso é o Paulo Veiga. Ele agora está numa reunião com pessoal de fora. Espera que eu vou te dar o número do celular dele e tu liga daqui a uns 20 minutos.
Veras - Existe a possibilidade de a gente fazer algum tipo de acordo para se conseguir preço bom nas licitações?
Marli - Aqui eles têm acordo fechado.
Veras - Boa tarde, seu Paulo.
Paulo Veiga - Boa tarde.
Veras Nós estamos trabalhando na região de Passo Fundo e acho que vamos pegar umas obras aí em Santo Ângelo (...) Eu falei com a dona Marli e ela me disse que não era interessante nós chegarmos rachando preço e parece que o senhor está coordenado.
Paulo Veiga - O senhor é daqui?
Veras - Da Kitel, de Estrela.
Veiga - Ah, exato, nós temos aqui...
Veras - O senhor poderia me explicar com detalhes? É que eu não quero perder dinheiro e parece que em Santa Maria tem um rapaz que está fazendo isso (acordo), o Santana.
Veiga - Sim, exato (...). O Santana cuida de lá.
Veras - E o senhor cuida daí.
Veiga - Exatamente.
Veras - Nós vamos trabalhar em Santa Maria (...). O senhor sabe como é que funciona?
Veiga - Viu, Carlos? Tu tens que falar com o Santana que tu queres participar lá e aí vai haver uma sequência.
Veras - Como assim, sequência?
Veiga - Nós temos uma primeira rodada que vai ter uma série de oito obras. São cinco numa bolada. Eu e mais duas empreiteiras ficamos de fora. E a segunda vai ficar com o Walter, de Santa Maria.
Veras - Qual é a empresa dele?
Veiga - Casa dos Telefones, de Santa Maria. Essa aí vai ficar com uma obra em Santa Rosa. Então é o seguinte: tu vai ficar para a segunda série, como nós. Na primeira série tem a Missões, a Teleserv, esse pessoal que está sem obra.
Veras - Como seria a parceria com o senhor? A licitação sairia em nome de uma empreiteira?
Veiga - Cada um pega a sua.
Veras - A questão da formulação de preço...
Veiga - O pessoal pega e me liga. (...) De quem vai ser essa? Eu normalmente estou ficando por último, para a segunda série. Eu sou o último que pega.
Veras - Me diga uma coisa, senhor Paulo Veiga, vocês conseguem superfaturar isso em quanto?
Veiga - Aqui eles só pagam o máximo.
Veras - E qual é o máximo?
Veiga - R$ 10,81 para classe A (custo do homem/hora para colocação de cabos nos postes), R$ 12,15 para classe C (homem/hora para emenda de cabos) e R$ 12,26 para a classe B (homem/hora para puxar os cabos dos postes até as casas)
Veras - Que empreiteiras estão fazendo esquema com o senhor aí?
Veiga - Centrel, Veiga, Casa dos Telefones, Missões, Cunha, Teleserv, Intel, Tele Andrade, Telerede e Santana. São dez.
Veras - O Santana, de Santa Maria, trabalha aí também?
Veiga - Não. Nós só negociamos. Eu não entro lá e ele não entra aqui.
Veras - E em Passo Fundo, quem está coordenando lá?
Veiga - Lá é o Cunha (empresário Wilmar Cunha, da Cunha Telecomunicações). Vou te dar o celular dele.
O segundo telefonema
A segunda conversa gravada foi com Valter de Ávila, proprietário da Casa dos Telefones, de Santa Maria. O empresário confirma que a divisão de obras na região é coordenada por Carlos Santana, da Santana Construções Elétricas. Veras novamente se faz passar por Carlos.
Veras - Nós estamos interessados em trabalhar na região aí (Santa Maria). Quem é que está coordenando a distribuição das obras?
Ávila - O Santana.
Veras - Eu falei com o Paulo Veiga (da Veiga Construções, de Santo Ângelo) e ele me deu teu telefone.
Ávila - Lá quem coordena é o Veiga (....). Aqui em Santa Maria é sempre o Santana que me liga. Eu quase não trabalho em Santa Maria, porque ele está estabelecido aqui. Sou de Santa Maria, mas não trabalho em Santa Maria.
Veras - E o Santana é bom de conversar?
Ávila - É bom, sim. A gente nunca teve problema. Ele é que coordena com a Eletra, com a Missões de Santo Ângelo, com o Veiga. (...). Tem duas empresas mais trabalhando em Santa Maria, mas com acerto dele.
Veras - Ele é o coordenador geral?
Ávila - Ele é que faz os acertos aqui para nós. Ele fala se tu tem interesse aqui ou acolá. A gente combina e depois cota o preço.
Veras - A CRT fica sabendo?
Ávila - Não. Se ficam sabendo, nos cortam e aí é coisa pesada, é barra pesada. Qualquer coisa que eles desconfiam, eles cancelam.
O terceiro telefonema
O engenheiro João Veras liga para o empresário Wilmar Cunha, da Cunha Telecomunicações, apontado como coordenador do esquema em Passo Fundo. Novamente, ele se apresenta com o nome de Carlos.
Veras - Eu estive conversando com o Walter e com o Paulo Veiga, e ele me falou que o senhor é que está coordenando a distribuição das obras aí em Passo Fundo.
Cunha - Sim.
Veras - Eu queria saber com o senhor se é economicamente viável para nós...

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