São Paulo, sexta-feira, 15 de agosto de 1997
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JFK evitou guerra com a URSS

ALAIN ABELLARD
DO "LE MONDE"

JKF evitou guerra com a URSS
Dois documentos recém-revelados e analisados pelo pesquisador francês Vincent Touze trazem novas e surpreendentes informações sobre a crise cubana de outubro de 1962, após a instalação sigilosa de mísseis nucleares soviéticos na ilha.
O primeiro deles foi divulgado pela Casa Branca, onde o presidente John Kennedy gravou as conversas de seus colaboradores, sem que eles soubessem do fato. É uma versão ao vivo dos 13 dias de tensão entre os EUA e a União Soviética, sob o governo de Nikita Khruschov. Ela confirma que em nenhum momento da Guerra Fria a possibilidade de um conflito nuclear esteve tão próxima.
O segundo é o discurso pronunciado por Fidel Castro em janeiro de 1968 diante do Comitê Central do Partido Comunista cubano, no momento em que a redução no fornecimento de petróleo vindo da URSS pôs em risco a economia da ilha. Essa intervenção comprova que os cubanos estavam preparados para o pior. É também uma violenta crítica aos soviéticos e, de maneira mais ampla, ao socialismo na União Soviética.
No dia 15 de outubro de 1962, aviões de espionagem norte-americanos observaram rampas de mísseis nucleares soviéticos na ilha de Cuba, próxima à costa dos EUA. A crise resultante levaria as duas superpotências da época à beira de um conflito nuclear.
Para Touze, "o tom excessivamente anti-soviético do discurso de Fidel Castro explica a razão pela qual nunca antes veio a público. Fidel fala sem reservas. Ele explica até que ponto Cuba foi vítima da má gestão da crise feita por Khruschov, no qual ele próprio, na época pouco conhecedor dos soviéticos, confiara inteiramente".
Documentos obtidos recentemente, provenientes do fundo Kennedy, lançam nova luz sobre a forma como a crise foi administrada pelos americanos. Os documentos em questão, constituídos de gravações das reuniões do presidente com seus assessores, cobrem a duração inteira da crise, de 16 a 27 de outubro. Excetuando algumas que já haviam sido trazidas a público anteriormente, as fitas deixaram de ser consideradas sigilosas em outubro de 1996. Elas mostram um presidente Kennedy quase isolado diante de seu Estado-Maior, que era firme partidário da intervenção armada.
Evitando conflito
John Kennedy adotou uma posição que evitou qualquer confronto direto com a URSS. Ele optou por reagir promovendo o bloqueio à ilha, deixando em aberto todas as outras opções: negociações ou intervenção militar.
As gravações revelam que, em pleno bloqueio, o presidente americano se dispôs a deixar passar um navio soviético, para evitar um confronto. Mas foram os soviéticos que acabaram cedendo primeiro. Até o fim da crise, em 28 de outubro, quando Nikita Khruschov anunciou a retirada dos mísseis, Kennedy privilegiou essa posição, sem excluir a possibilidade do pior.
Pesquisador do Centro de Pesquisas e Estudos da América Latina e Caribe (Crealc) do Instituto de Estudos Políticos de Aix-en-Provence, Vincent Touze transcreveu os documentos quando foram abertos ao público. Realizou uma pesquisa em Cuba, onde obteve o texto do discurso de Fidel Castro pronunciado em janeiro de 1968 diante do comitê central do PC cubano. Fidel reclama que a URSS, que não incluiu Cuba nas negociações para resolver o conflito.
"A contribuição de Kennedy para a solução pacífica da crise foi decisiva", diz o pesquisador. Para Touze, foi importante também o papel de Robert McNamara, às vezes criticado por seu papel no Vietnã. "Seus conselhos sempre se caracterizaram por grande prudência, apesar de, na condição de secretário da Defesa, ser responsável pelas possibilidades de ataque."

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