São Paulo, domingo, 17 de agosto de 1997
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Sinal trocado no câmbio

CELSO PINTO

Nas discussões internas no governo sobre a política cambial, alguns personagens trocaram de papel.
Ao contrário do que muita gente imagina, o papel mais conservador ficou com o diretor de Política Monetária do Banco Central, Francisco Lopes. O diretor da Área Externa e futuro presidente do BC, Gustavo Franco, se alinhou com a ala mais ousada.
É bom que se diga que essas discussões sobre o câmbio aconteceram em janeiro e fevereiro deste ano. O secretário de Política Econômica da Fazenda, José Roberto Mendonça de Barros, preocupado com a valorização do dólar em relação ao iene e ao marco alemão ocorrida em dezembro, sugeriu que a política cambial passasse a usar como referência uma cesta de moedas.
Sua proposta não era a de atrelar formalmente o real ao comportamento da cesta de moedas, e, sim, de utilizá-la como parâmetro, sem explicitá-lo. Formalmente, a política continuaria flexível.
Exatamente o que foi feito desde março de 95 até o início deste ano. O parâmetro usado pelo governo para a desvalorização foi a variação dos preços por atacado na indústria (o IPA industrial). Ele não foi seguido milimetricamente a cada mês, mas serviu como um claro balizador. Se o governo tivesse usado a cesta como parâmetro, o câmbio teria sido desvalorizado mais fortemente nos últimos meses.
A idéia de uma maior aceleração no câmbio teve o apoio do ministro da Fazenda, Pedro Malan, e do diretor da Área Externa do BC, Gustavo Franco. Quem ficou firmemente contra foi Francisco Lopes.
Foi Lopes, recentemente, quem definiu a política cambial atual e desejada para os próximos anos como de desvalorizações de 1% a 2% ao ano acima da inflação medida pelo custo de vida. Ou seja, uma moderada aceleração do câmbio. Que, diga-se, já está acontecendo, especialmente em função da forte queda nos índices de inflação dos últimos meses.
Muita gente imaginou Lopes no papel de defensor de uma política cambial mais agressiva. A fórmula de manter mais ou menos intacto o ritmo de desvalorização, enquanto a inflação despenca, contudo, foi a mais conservadora.
Aliás, Lopes tem sido o mais conservador nas discussões sobre câmbio há algum tempo. Quando economistas fora do governo sugeriram mudanças no câmbio, em conversas reservadas com o presidente Fernando Henrique Cardoso, foi Lopes quem reagiu mais duro contra.
O argumento que Lopes tem usado internamente é que o importante é acelerar os ganhos inflacionários. Na medida em que a inflação caia ainda mais e persista em níveis baixos durante um longo período, isso ajudaria a criar um círculo virtuoso na economia. Permitiria às empresas se apropriarem de ganhos adicionais, melhorando sua competitividade, sem ter que cortar diretamente ganhos salariais.
A aceleração moderada no câmbio, de todo modo, serve como sinal de que o governo admite que há uma sobrevalorização do real e quer corrigi-la de forma gradual. A esta altura do campeonato, nas vésperas de um ano eleitoral, fica difícil imaginar mudanças voluntárias mais drásticas no câmbio.
Volcker e a felicidade
No jantar organizado pela Tishman Speyer Método, quinta-feira, o palestrante convidado, o ex-presidente do banco central americano, Paul Volcker, foi pródigo em advertências, mas também teve seus momentos de bom humor. Quando, por exemplo, lembrou a definição de quem trabalha num banco central: é aquele sujeito que fica preocupado quando ouve dizer que alguém, em algum lugar, está contente.
Na substância, Volcker disse que a crise monetária asiática é um sinal de alerta para o Brasil. Não é iminente um ataque especulativo contra o real, mas o Brasil tem que fazer a lição de casa. Precisa cuidar da poupança interna e saber que os investimentos externos que têm financiado seu déficit estão inflados pelas privatizações e podem ser menores no futuro. O Brasil, disse Volcker, deveria ter a humildade de reconhecer que não fez reformas econômicas tão profundas quanto o México e a Argentina.
Outros países que abriram sua economia e fizeram reformas tiveram um forte aumento nas importações, mas um salto ainda mais forte nas exportações. O que o preocupa é que isso não aconteceu no caso brasileiro. Outra preocupação é saber se, a esta altura, o governo terá apoio político para as reformas necessárias.

E-mail: CelPinto@uol.com.br

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