São Paulo, segunda-feira, 18 de agosto de 1997
Próximo Texto | Índice

Correios resistem à perda de qualidade

FREDERICO VASCONCELOS
DA REPORTAGEM LOCAL

A EBCT (Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos), apontada como uma ilha de eficiência quando os militares administravam o país, chegou aos tempos de abertura tecnologicamente desatualizada e sem saber que perfil deverá ter na virada do século.
Enfrentando o acirramento da concorrência privada e a disseminação de sistemas eletrônicos de comunicação nas empresas, os Correios estão na berlinda, apesar de terem apresentado um lucro de R$ 132 milhões no ano passado (prejuízo de R$ 85 milhões em 1995). A atual diretoria dos Correios sofre uma cobrança cerrada dentro do governo, sob a alegação de incapacidade de gestão.
Mas a forte popularidade dos Correios parece resistir às deficiências internas e à falta de continuidade administrativa (em quatro anos, quatro diretorias). Os Correios conseguem um milagre: as cartas são entregues com atraso e, ainda assim, a população confia mais nos seus serviços do que em instituições como a igreja.
Há duas semanas, a Folha pediu entrevista com o presidente Amilcar Gazaniga. A assessoria não conseguiu agendar o encontro.
Sem destino
O relatório anual da diretoria da EBCT é um misto de desculpas com promessas de investimentos (R$ 585,7 milhões em 1997) e de reestudo para combinar formas de parcerias com o capital privado.
"Rotinas antigas, equipamentos defasados e uma queda, ainda que discreta, na satisfação dos usuários apontam a urgência da revitalização", admite a diretoria.
O Plano Real provocou expansão do tráfego postal, de 4,7 bilhões de objetos em 1994 para 6 bilhões em 1996. Os correios vêem crescer os serviços de modalidades simples, com preços reduzidos, e a concorrência nos serviços que proporcionam maior retorno.
Uma carta postada em São Paulo por R$ 0,22 tem de chegar em Manaus no dia seguinte, percorrendo uma distância equivalente a Bruxelas-Moscou, onde se cobra mais do que três vezes pelo mesmo serviço. De cada cem cartas postadas, 18 possivelmente não serão entregues no prazo previsto.
Essa redução de qualidade é atribuída pelos Correios à falta de investimentos em tecnologia e crescimento do quadro de pessoal abaixo da evolução do tráfego (nos últimos cinco anos, o volume cresceu 80% enquanto o quadro de pessoal aumentou apenas 8%).
Contas duvidosas
A estatal saiu do vermelho em 1996, mas é preciso muita fé para confiar cegamente nos seus números. Os auditores independentes fizeram tantas ressalvas no balanço que o seu parecer, segundo um especialista consultado pela Folha, "tem a aparência de um boletim de ocorrência policial".
Os auditores não opinaram sobre saldos que não conseguiram identificar, como serviços de vale postal a pagar (R$ 16,7 milhões), reembolso postal a pagar (R$ 9,3 milhões) e contas internacionais a receber (R$ 25,3 milhões).
A estatal carrega um grande volume de autos de infração relativos à incidência de ISS sobre prestação de serviços, e não fez provisão (ou seja, não constituiu reservas). Há dúvidas sobre contas de numerários em trânsito, pagamentos de benefícios e adiantamentos (Papa-Tudo e Tele Sena).
É difícil avaliar os eventuais efeitos sobre o resultado da empresa. Mas, embora não seja um consolo, em anos anteriores a qualidade do balanço dos Correios foi bem pior.

LEIA MAIS sobre os Correios na pág. 2-8

Próximo Texto: Empresa é "cota" do PPB no governo
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.