São Paulo, quarta-feira, 20 de agosto de 1997
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À sombra das bananeiras

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - Num documentário da TV, vi como os peritos testam o poder das armas de fogo. Carros, portas e paredes resistem a determinados impactos. Para avaliar o efeito dos projéteis de diversos calibres no corpo humano, os técnicos usam caules de bananeiras. Explicação: eles têm a mesma textura da carne humana.
A menos que se choque com um osso, a bala segue o seu curso através da carne como se fosse numa bananeira: ela é macia, úmida, de fácil penetração.
Antigamente, quase não havia apartamentos, havia casas. Todas tinham quintais e todos os quintais tinham bananeiras. Era um dos mistérios de minha infância. Onde não se armava um galinheiro ou se abria espaço para a pelada de futebol, inexoravelmente, nascia uma bananeira. Se Pasteur vivesse no Brasil, acreditaria na geração espontânea.
Foi por meio delas que aprendi as primeiras noções da vida sexual. Os meninos daquele tempo descobriram a pólvora antes dos fabricantes de armas, bem verdade que com finalidades mais nobres.
Era comum ver garotos de 13, 14 anos agarrados nas bananeiras. Gemiam alto, outros gemiam altíssimo, numa emulação que eu não entendia e que parecia fazer parte da brincadeira.
Andava pelos oito anos e achava aquilo incompreensível, vagamente condenável. Quando me pegava sozinho me agarrava numa bananeira, gemia alto, mas não sentia nada de especial. Achava que não se devia fazer aquilo com as bananeiras, cuja função é dar bananas.
Mais tarde, fiquei sabendo que os meninos do interior se iniciavam com cabras, jumentas, vacas, até com galinhas. Valia tudo, não havia o sexo virtual da Internet. Na cidade, os meninos usavam bananeiras que davam em qualquer quintal.
Outro dia, falei dos testes nas fábricas de armas com um primo mais velho. Falei nas bananeiras. Confessei que não as apreciara. Ele me reprovou: "Não sabe o que perdeu!"

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